O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito com apoio dos partidos de centro que rejeitaram a reeleição de Bolsonaro, mas cuja densidade eleitoral foi e continua sendo muito pequena nas disputas majoritárias. Representados no governo pela ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), que recebeu apoio do MDB, da federação PSDB-Cidadania e do União Brasil, esse bloco não é suficiente para garantir a estabilidade do governo. Por necessidade, Lula é obrigado a administrar complexas relações com partidos de centro-direita que apoiaram Bolsonaro e agora são o fiel da balança no Congresso, principalmente na Câmara, como o PP e o PR.

Essa situação levou os dirigentes principais do PT, principalmente a presidente Gleisi Hoffmann, e o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Rui Falcão, a concluírem que o terceiro mandato de Lula é de “um governo em disputa”. A consequência prática desse entendimento, um erro de conceito em se tratando de partido que lidera um governo de ampla coalizão política, é o PT não dispensar uma bola dividida com os aliados, principalmente quando a disputa transborda dos bastidores para a opinião pública.

Historicamente, a cúpula petista defende uma política nacional-desenvolvimentista, enquanto a equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, opera uma estratégia de integração à economia mundial em bases democráticas. A primeira está em linha com a política externa defendida pelo embaixador Celso Amorim, assessor especial da Presidência para Relações Internacionais, cujo eixo é o Sul Austral, com um viés antiamericano, o que deixa em segundo plano a questão da democracia; a segunda, somente tem viabilidade mantendo o Brasil no campo do Ocidentais e da defesa da democracia, ainda que nossa diplomacia seja independente e movida por interesses nacionais objetivos.

Obviamente, ambas as estratégias são operadas com pragmatismo, mas a sutileza da diferença entre elas desaparece diante dos conflitos geopolíticos que envolvem os Estados Unidos e a União Europeia, de um lado, a China e a Rússia, de outro. Na medida em que as tensões internacionais aumentam, fica mais difícil manter um pé em cada canoa, porque elas se afastam. Entretanto, toda vez que Lula toma uma posição que estressa essas relações, o PT exulta, como se estivesse vencendo a disputa por um governo que já é seu.

 

Placas tectônicas

A tentativa de golpe de 8 de janeiro levou o ex-presidente Bolsonaro e seus aliados para o canto do ringue, em função das investigações que estão sendo realizadas pela Polícia Federal (PF), no âmbito do inquérito conduzido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O vice-presidente Geraldo Alckmin, em entrevista à jornalista Miriam leitão, na GloboNews, resumiu a narrativa do governo: “Eu tenho a convicção de que o presidente Lula salvou a democracia, quando eles tentaram dar um golpe de Estado. Quem defende a Constituição, defende eleição, defende o povo, é democrata. O inverso disso é golpista. Se perdendo a eleição eles tentaram um golpe, imagina se tivessem ganho. E isso é a pior coisa também para a economia. As ditaduras suprimem a liberdade em nome do pão, não dão o pão, nem devolvem a liberdade que tomaram.”

O ex-governador paulista, que deixou o PSDB para ser o vice de Lula pela legenda do PSB, ao lado de Simone Tebet, é um representante dos setores de centro-esquerda que apoiam Lula já no primeiro turno. Como ministro do Desenvolvimento, é o principal porta voz da política industrial do governo, que provoca muita polêmica. Entretanto, que ninguém se iluda, é um aliado de Fernando Haddad, como Simone Tebet: “Na política, você conquista. A questão econômica é central. O risco Brasil era 254 baixou para 130. A inflação estava em 6% e baixou para 4,5%, dentro do teto da meta. A bolsa subiu. O dólar baixou de R$ 5,40 para R$ 4,90. O desemprego caiu. É uma combinação de três coisas. Eficiência econômica, rede de proteção social e liberdade individual”, avalia.

Haddad, Alckmin, Simone, Marina Silva, todos foram candidatos a presidente da República e estão bem acomodados no governo. Isso fecha a porta para o surgimento imediato da terceira via defendida pelo ex-governador de Minas e deputado federal Aécio Neves, um ator decisivo nos bastidores do PSDB. O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, é o candidato natural dos tucanos, mas não quer pôr bloco na rua e ficar no sereno. Precisa cuidar do eu próprio quintal do ponto de vista administrativo e eleger o maior número possível de prefeitos e vereadores nas eleições municipais deste ano.

Entretanto, há um movimento de placas tectônicas na oposição, apesar da demonstração de força do ex-presidente Jair Bolsonaro no domingo passado, com o ato realizado na Avenida Paulista. Ontem, houve uma troca de guarda no União Brasil, patrocinada pelos velhos caciques do antigo DEM, que destituíram o deputado Luciano Bivar (União-PE). Com apoio do ex-prefeito de Salvador ACM Neto, o advogado Antônio Rueda, vice-presidente, assumiu o comando da legenda. Por trás da manobra está a candidatura à Presidência do governador de Goiás, Ronaldo Caiado.

 

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