Tudo o que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não precisava era uma denúncia de corrupção no governo da Bahia durante a gestão do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. A empresária Cristiana Prestes Tadeo, da empresa Hempcare, citou o ministro em delação premiada, na investigação da Polícia Federal (PF) que apura fraude na compra de respiradores em meio à crise provocada pela pandemia de COVID-19, em 2020. O ministro nega, mas o assunto é nitroglicerina para o Palácio do Planalto.

 

O caso foi revelado pelo repórter Hugo Marques, da revista Veja. A empresária devolveu R$ 10 milhões aos cofres públicos, como contrapartida para ter benefícios processuais, além de dar detalhes e entregar documentos que comprovariam as irregularidades, como extratos bancários. A Hempcare recebeu R$ 48 milhões do governo da Bahia, mas não entregou nenhum respirador pulmonar. A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que foi o braço direito do ex-procurador-geral da República Augusto Aras, que é baiano, negociou a delação.

 

Segundo a “Veja”, Cristiana Prestes Taddeo admitiu que o contrato com a empresa Hempcare era desfavorável ao governo da Bahia. Uma das cláusulas previa pagamento adiantado. Além disso, a empresa não possuía as documentações necessárias para importar equipamentos hospitalares e que nenhum agente público solicitou o certificado e registro da Anvisa.

 



 

Taddeo teria recebido informações privilegiadas e, por causa disso, apresentou proposta de preço de US$ 28.900 por respirador. O contrato para venda de 300 aparelhos respiradores totalizou R$ 48 milhões, conforme cotação do dólar à época. Rui Costa, então governador da Bahia, era presidente do Consórcio Nordeste, que reunia por oito anos, entre 2015 e 2022. Os respiradores iriam abastecer os estados do Consórcio Nordeste, presidido por ele à época. A empresária disse que a contração da empresa foi intermediada por um empresário que se apresentou como “amigo” do então governador Rui Costa e da esposa dele, Aline Peixoto.

 

A situação de Rui Costa se complicou porque o ex-secretário da Casa Civil do governo da Bahia Bruno Dauster disse em depoimento à PF que recebeu sinal positivo de Rui para avançar nas tratativas com a Hempcare. O então governador, segundo disse aos investigadores, foi o responsável por passar o contato de Dauster à empresa. A Hempcare distribuía medicamentos à base de canabidiol e o capital social dela era de R$ 100 mil. Conforme os registros, a empresa só contava com dois funcionários. Como o contrato foi assinado e o valor de R$ 48 milhões adiantado, a empresa não conseguiu fazer a compra dos equipamentos na China e nem no mercado nacional.

 

Diante do atraso, Rui Costa determinou a abertura de inquérito na Polícia Civil, mas a Polícia Federal (PF) entrou no caso quando ele chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), porque desvio de recursos do SUS são casos da esfera federal. Parênteses: à época, havia uma grande polêmica entre o presidente Jair Bolsonaro, que denunciava irregularidades na compra de respiradores, e os governadores, que conseguiram na Justiça que o SUS comprasse as vacinas contra a COVID-19. Bolsonaro é negacionista e se recusou a tomar a vacina, embora tenha obtido um atestado falso de vacinação.

 

Danos de imagem

 

Por causa do inquérito, cresce o estresse entre Rui Costa e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, mantido no cargo pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. O vazamento da informação aumentou a tensão, que já havia ocorrido pelo mesmo motivo. Os esqueletos nos armários do governo da Bahia vieram bater à porta do Palácio do Planalto num momento de queda de popularidade do presidente Lula, desempenho insatisfatório do governo. Também há muitas reclamações contra o ministro da Casa Civil de parte de seus colegas da Esplanada. Por sorte, o Congresso está desmobilização, com as sessões suspensas na Câmara e baixíssima frequência no Senado. Entretanto, a oposição ainda fará muito barulho na próxima semana, enquanto os aliados “mui amigos” de Lula se aproveitarão para aumentar o poder de barganha junto ao governo.

 

Lula é muito grato a Rui Costa pelo apoio eleitoral que teve na Bahia, decisivo para sua volta ao poder nas eleições de 2022. Também não é de jogar ao mar os seus companheiros leais, sobretudo os que permaneceram ao seu lado durante o período em que esteve preso em Curitiba. Mas tem que realizar um governo sem escândalos, para exercer não só o poder político, mas a liderança da sociedade. Sua eleição foi um crédito de confiança que precisa ser honrado. Por isso, Rui Costa não depende apenas da gratidão de Lula para permanecer na Casa Civil; precisa sobreviver ao desgaste de imagem.

 

 

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