Israel é um Estado como outro qualquer, estabelecido e reconhecido internacionalmente. Por isso mesmo, o mau comportamento de Benjamin Netanyahu, seu primeiro-ministro acusado de genocídio, não deslegitima sua existência, como também o comportamento de governantes deste naipe deslegitimaria a existência de seus países, como a Coreia do Norte, por exemplo. Entretanto, quando Netanyahu viola o direito internacional, Israel deve ser cobrado por isso. Um dia, seus governantes acabarão punidos, internacionalmente e pelos próprios israelenses. Vamos ser claros: o que está acontecendo em Gaza, com a desmedida retaliação aos ataques do Hamas de 8 de janeiro, são crime de guerra, desrespeito aos direitos humanos e limpeza étnica.



Essa constatação não tem nada de antissionista nem de antissemitismo, não é fruto de ódio aos judeus. A maioria das críticas às ações de Israel são fundamentadas nos fatos brutais que estão ocorrendo em Gaza. Tão incorreto quanto comparar o Estado de Israel ao Hamas, é justificar a escala brutal dos ataques indiscriminados aos palestinos com a covarde ação terrorista de 8 de janeiro. As diferenças se tornaram abissais. As críticas a Netanyahu partem dos governos que se opõem à barbárie em Gaza, não são motivadas pelo antissemitismo nem contrárias à existência de Israel. O direito dos judeus ao um “Estado normal” não justificará, jamais, uma “política anormal” em relação aos palestinos.

 





O Holocausto não pode ser uma desculpa para o comportamento lastimável do governo israelense. Até que ponto o que está acontecendo em Gaza é muito diferente do que aconteceu no Gueto de Varsóvia durante a ocupação nazista? Não creio que essa questão não passe pela cabeça da oposição a Netanyahu. São oito meses de sofrimento, fome e catástrofe humanitária. O recente ataque a um campo de refugiados criado pelo próprio exército israelense, que matou 45 civis inocentes, a maioria mulheres e crianças, não foi um erro trágico, foi uma ação militar planejada, cujo objetivo era matar líderes do Hamas sem que se levasse em conta efeitos colaterais. Isso tem se repetido com frequência. Os fins justificam os meios, essa é a regra do jogo.



Netanyahu trabalha deliberadamente para impedir um cessar fogo, as exigências do Hamas não justificam esse procedimento. Há um amplo conjunto de decisões de organismos internacionais, inclusive do Conselho de Segurança da ONU, que propõem um cessar-fogo. “Aqueles que dizem que não estão preparados para enfrentar a pressão levantam a bandeira da derrota. Não levantarei tal bandeira, continuarei lutando até que a bandeira da vitória seja hasteada”, disse Netanyahu.



Mas de que adiantará uma vitória de Pirro? A maioria dos países do Ocidente já reconhece o Estado palestino. Os Estados Unidos e a Inglaterra ainda não, porque Israel é uma peça-chave da aliança militar anglo-saxônica, mas tudo tem um limite. Israel é o Ocidente no coração do Oriente Médio não por causa do seu poder militar, mas porque é uma democracia e defende seus valores, ou melhor, é porque deveria fazer. A ironia de tudo isso é que Israel não está se tornando um Estado mais forte, outros países como o Egito, a Arábia Saudita e a Jordânia, hoje, são mais importantes para a estabilidade política no mundo árabe, mesmo levando em conta a política de “quanto pior, melhor” do Irã.


Pária internacional



Na prática, Netanyahu transformou Israel num fator de instabilidade. Mas não deveria subestimar o mandado de prisão do promotor do Tribunal Penal Internacional, Karin Khan. A morte de dois importantes líderes do Hamas, Khaled Nagar e Yassin Rabia, como justificativa para morte de mulheres e crianças, não vai garantir um habeas corpusnorte-american nas duas cortes internacionais. Quando deixar o poder, Netanyahu corre o risco de acabar seus dias na cadeia. Ao ignorar a decisão da corte que mandou suspender as ações em Rafah, tomadas exatamente para impedir esse tipo de “erro trágico”, prevaricou de formas imperdoável para os integrantes da corte.



Netanyahu transformou Israel num pária internacional, será longo o caminho para reconstruir a sua imagem. O país se tornou prisioneiro da extrema direita e do seu complexo militar industrial. Joe Biden, Emmanuel Macron, Rishi Sunak e Olaf Scholz, os líderes dos Estados Unidos, França, Reino Unido e Alemanha, estão cada vez mais distantes de Israel. Eram aliados de primeira hora.



A guerra civil na Irlanda do Norte chegou ao fim quando um presidente norte-americano pressionou os emigrantes irlandeses nos Estados Unidos a deixarem de mandar armas e dinheiro para o Ira. A economia da África do Sul entrou em colapso quando a Doutrina Sullivan obrigou as empresas norte-americana a saírem de lá por causa do apartheid. Sem eleições, por causa da guerra, a oposição a Netanyahu em Israel não tem como barrar sua insanidade e chegar a um acordo de paz. Mas Biden tem esse poder, se deixar de fornecer armas e recursos para Israel, até que se chegue a um acordo de paz. Isso significa entregar os judeus de bandeja para os seus inimigos, como o Hamas e o Irã? Claro que não! O caminho não é a limpeza étnica em Gaza e o apartheid na Cisjordânia, continua sendo a solução de dois estados: a Palestina e Israel.

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