O plano para matar o presidente Luiz Inácio lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, revelado nesta terça-feira pela Polícia Federal, roubou a cena do último dia de reunião do G20 e se tornou o principal assunto político de Brasília. As investigações mostram que havia, sim, um plano golpista, que seria iniciado no dia 15 de dezembro de 2022, com o sequestro e/ou assassinato de Moraes, mas foi abortado em razão de um imprevisto: a suspensão da sessão do Supremo marcada para aquele dia.
O plano para envenenar ou executar o presidente Lula e assassinar Alckmin com o objetivo de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder, foi descoberto com recuperação de mensagens do celular do tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens do presidente da República. A localização dos contatos incrimina também o ex-ministro da Casa Civil Braga Netto, general de quatro estrelas, que foi escolhido como candidato a vice na chapa de Bolsonaro e era um dos líderes do grupo que pretendia impedir a posse de Lula. Uma das reuniões para traçar o plano, segundo a Polícia Federal, teria sido realizada na casa do militar.
A descoberta dos arquivos, que haviam sido deletados, complica ainda mais a situação de Mauro Cid, que não havia fornecido essas informações na sua delação premiada. Todo réu tem direito a não fornecer provas contra si próprio, porém, no caso de delação premiada, isso pode resultar na anulação desse benefício, porque o acordo exige que o delator fale tudo o que sabe. Ontem, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro prestou um longo depoimento à Polícia federal e disse que não sabia da existência do plano.
Moraes intima Mauro Cid para esclarecer contradições em depoimento
Até agora, o principal militar comprovadamente envolvido na conspiração é o general Mário Fernandes, ex-assessor da Presidência, que aparece com a camisa da seleção brasileira em atos pró Bolsonaro em Copacabana. Ex-secretário-executivo da Secretaria-Geral do governo de Jair Bolsonaro, também exerceu a função de assessor do deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), mas foi afastado do posto por determinação do STF.
Mais três militares do Exército ligados às Forças Especiais da corporação, os chamados “kids pretos”, participaram do grupo: o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, que já havia sido preso pela PF em fevereiro, com outros 16 militares, e participou da reunião de “preparação” do golpe, em 2022, na casa de Braga Netto; o major Rodrigo Bezerra Azevedo, que servia no comando de operações especiais em Goiânia em 2022; e o major Rafael Martins de Oliveira, com quem a PF apreendeu, em fevereiro deste ano, os materiais que mostram que o ministro Alexandre de Moraes era monitorado.
Plano de matar Lula incluía 'gabinete de crise' com Heleno e Braga Netto
Um policial federal, que participou da segurança de Lula, também foi preso: Wladimir Matos Soares passava informações sobre a segurança de Lula e está envolvido no caso da falsificação do atestado de vacina de Bolsonaro. Rafael Martins de Oliveira e Hélio Ferreira Lima teriam participado de uma reunião em 12 de novembro na casa de Braga Netto, na companhia de Mauro Cid.
Após este encontro, Oliveira teria enviado a Cid um documento em formato word intitulado “Copa 2022”, que detalhava as necessidades iniciais de logística, armas e recursos financeiros para realizar uma operação planejada para 15 de dezembro.
Punhal verde e amarelo
Ao recuperar o material, a Polícia Federal descobriu que o grupo “Copa 2022”, com codinomes de países que estavam disputando a Copa do Mundo naquele ano, planejava o sequestro de Moraes, que foi abortado. A PF cruzou dados de chips de celular, aluguel de carros e outras fontes. Concluiu que o grupo monitorava o ministro. Os celulares estavam cadastrados em nomes de terceiros, em outras regiões do país.
Plano para matar Moraes foi abortado na última hora: ‘Cancelar o jogo’
“Às 20h33, a pessoa associada ao codinome ‘Brasil’ informa um dos locais em que estavam atuando. Diz: ‘Estacionamento em frente ao Gibão Carne de Sol [restaurante]. Estacionamento da troca da primeira vez’. Em seguida, a pessoa associada ao codinome ‘Gana’ informa que já estava no local combinado: Tô na posição’. O interlocutor ‘Brasil’ responde ‘Ok’”. A troca de mensagens continua até que, às 20h57min, a pessoa de codinome Áustria diz: “Tô perto da posição. Vai cancelar o jogo?”. Cerca de dois minutos Japão, o suposto líder do grupo, respondeu: “Abortar... ‘Áustria’... volta para local de desembarque... estamos aqui ainda...”
As evidências colhidas pelo Supremo Tribunal Federal e pela Polícia Federal apontam que segundo documento-chave da investigação, denominado “Punhal Verde e Amarelo”, foi elaborado pelo general Mário Fernandes. Esse arquivo revela um “planejamento operacional” que “tinha como objetivo executar o ministro Alexandre de Moraes e os candidatos eleitos Luíz Inácio Lula da Silva e Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho”.
A PF aponta que o documento foi impresso por Fernandes no Palácio do Planalto no dia 9 de novembro de 2022. Nessa mesma ocasião, os aparelhos telefônicos de outros investigados — Rafael Martins de Oliveira e Mauro Cid — também estavam conectados à rede que cobre o Palácio do Planalto. Depois, esses papeis foram levados ao Palácio da Alvorada, residência oficial do então presidente Bolsonaro.