Quem quiser que se iluda, a eleição de Donald Trump empurra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para uma maior aproximação com a China de Xi Jinping, que está de braços abertos para o colega brasileiro. Não é preciso dar um cavalo de pau na política externa brasileira para isso, quem dará são os Estados Unidos. E, também, não se trata de uma opção ideológica do governo brasileiro, mas de uma decorrência natural e pragmática das relações comerciais entre esses três países e do lugar que o Brasil ocupa na geopolítica mundial, em especial na América Latina, após as eleições norte-americanas.

 


Esse reposicionamento deve ficar evidente na reunião do G20, o grupo dos países mais ricos do mundo, do qual o Brasil faz parte. A eleição de Donald Trump frustra os avanços previstos para o encontro, como a assinatura dos acordos para o combate à fome no mundo e o debate sobre a taxação dos muito-ricos. Essas propostas foram pactuadas entre Lula e o presidente Joe Biden, que chega ao encontro como “pato manco”, enquanto Xi Jinping se torna a principal estrela da reunião do G20 no Rio de Janeiro, que começa amanhã.

 




Há, sim, um esvaziamento do encontro de cúpula. Reflete o enfraquecimento do grupo em razão da política de Trump, um adversário do multilateralismo. O presidente eleito dos Estados Unidos tem uma estratégia nacionalista e protecionista, não acredita na necessidade de uma governança global nem que a gestão dos problemas mundiais, entre os quais os da paz e da guerra e do aquecimento global, possa ser feita por fóruns e organismos internacionais, o que inclui a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e a Conferência do Clima de 2025, a COP 30, que se realizará em Belém do Pará.

 


Mesmo assim, a Cúpula de Líderes das 20 maiores economias do mundo, da qual o presidente russo Vladimir Putin não participará, não será um encontro trivial. Deve registrar a reação dos líderes das maiores economias do mundo ao novo governo em formação nos Estados Unidos. Continuará sendo um espaço privilegiado de intervenção diplomática do Brasil, que assumirá a presidência do grupo, no contexto da geopolítica global.

 

Giro à direita


Embora tenha aliados participando do encontro, como o presidente da Argentina, Javier Milei, e a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, lideranças que se identificam ideologicamente com Trump, a reunião será uma demonstração de que o mundo também se move em relação aos Estados Unidos. Trump é um duplo problema para as democracias do Ocidente: além de alterar a política externa norte-americana, sua eleição estimula a radicalização política e fortalece a extrema direita no mundo.

 

Veja lista de deputados que assinaram a favor da mudança na escala 6 x 1


O que aconteceu nos Estados Unidos pode se repetir com a democracia representativa em outros países desenvolvidos. Sempre visto como progressista, apoiado pela classe média alta, com diploma universitário, o Partido Democrata passou a ser percebido como da elite, desconectado dos reais problemas da população. Já o Partido Republicano, por influência de Donald Trump, deixou os valores conservadores de lado e passou a defender interesses concretos dos menos favorecidos, sem educação superior, moradores das áreas rurais, religiosos (pentecostais) e homens. A classe média trabalhadora dos Estados Unidos, que derivou à direita, desequilibrou a disputa.


Salários defasados diante dos preços da habitação, da energia e dos alimentos; e o número crescente de imigrantes, inclusive os ilegais, concorrendo no mercado de trabalho com o americano médio foram fatores que geraram a insatisfação com o governo Biden. Apesar do crescimento da economia e do controle da inflação, cuja percepção não chegou à maioria dos eleitores.

 

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Imigração, protecionismo e supremacismo branco não são uma agenda exclusiva dos norte-americanos, existe nos países desenvolvidos da Europa e coloca no canto da parede a maioria dos seus líderes. Além dos problemas internos, um grande desafio geopolítico os aguarda: Trump deve reduzir ou suspender o financiamento para a Ucrânia e fortalecer a posição de Putin, que quer congelar a ocupação territorial de Donbas e da Crimeia. Os líderes europeus estão divididos sobre manter o apoio incondicional ao esforço de defesa ucraniano.

 

Rota da Seda


Biden pretende visitar a Amazônia nesta viagem ao Brasil, mas ignorou a América Latina a maior parte do seu mandato, ao contrário do presidente chines Xi Jinping, que acaba de inaugurar um grande porto nas proximidades de Lima, no Peru. O terminal gigante é capaz de alterar a logística de transporte da América do Sul, porque será uma nova opção para as exportações brasileiras chegarem ao Pacífico sem passar pelo Canal do Panamá.


Brasil e China ampliarão a parceria bilateral existente durante a visita de Estado do presidente Xi Jinping a Brasília, na quinta-feira, após a reunião do G20. O líder chinês será recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio da Alvorada. Diversos acordos bilaterais serão assinados, envolvendo todos os setores do governo. Dos 93 projetos industriais chineses no Brasil, destacam-se os das indústrias automotiva, eletroeletrônica e de máquinas e equipamentos.


Em 2023, o Brasil teve um recorde de exportações para a China, com US$ 104,3 bilhões, superando a soma das vendas para Estados Unidos e União Europeia. Enquanto Trump pretende estreitar as relações econômicas dos Estados Unidos com a Argentina, Xi Jinping vê no Brasil a sua grande oportunidade de integrar a América do Sul à Rota da Seda, com grandes investimentos em infraestrutura.

 

 
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