Após o golpe militar de 1964, que destituiu o presidente João Goulart, a esquerda brasileira se dividiu: Uma cobrava mais radicalidade do governo Jango, outra recomendava moderação. A primeira avaliava que o golpe poderia ser evitado se houvesse uma reação armada; a outra, que isso seria inútil e provocaria um banho de sangue. Na mesma linha de raciocínio, a primeira partiu para a luta armada, acreditava que derrubaria a ditadura com uma revolução.

A segunda, considerava essa opção uma aventura fadada ao fracasso. A melhor alternativa seria unir as forças democráticas contra o regime, em defesa das eleições diretas e da convocação de uma Constituinte. Havia liberais que se opuseram o golpe, entre eles Tancredo Neves (MG) e Amaral Peixoto (RJ).

Foi um longo caminho, que somente se concretizaria em 15 de janeiro de 1985, por uma via que ninguém havia previsto: a eleição indireta de Tancredo Neves, no colégio eleitoral criado pelo próprio regime para institucionalizar a ditadura.

 

 

O velho político mineiro, liberal e conciliador, surfou a onda da campanha das Diretas Já, que mobilizou a opinião pública e promoveu grandes manifestações de protesto. O ponto de partida foi a apresentação de um projeto de emenda constitucional restabelecendo as eleições diretas para presidente da República, em fins de 1983, pelo deputado Dante de Oliveira (MDB-MT).

 




A emenda mobilizou a opinião pública e as lideranças de oposição, produzindo também grande impacto no Partido Democrático Social (PDS), governista, porque havia uma ala que não concordava com a candidatura de Paulo Maluf e desejava o fim do regime.

No Congresso, ganhava corpo uma proposta de pacto entre a oposição e os descontentes do PDS com vistas a lançar um candidato único à presidência, em pleito direto a ser realizado em novembro de 1984. Tancredo Neves seria esse candidato, mas não tinha apoio do MDB.

 

 

De janeiro a abril de 1984, os comícios em favor das eleições diretas reuniram multidões nas capitais e principais cidades do país, sob a liderança de Ulysses Guimarães (MDB), que pretendia disputar a Presidência da República. Todos os líderes da oposição se engajaram na campanha, entre os quais os governadores Franco Montoro (SP), de São Paulo, e Leonel Brizola (PDT), do Rio de Janeiro.

O movimento sindical, cuja estrela maior era o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e a UNE foram responsáveis pela mobilização popular. Tancredo participou com destaque de todas as manifestações, porém, não afastava a possibilidade de disputar o pleito presidencial indireto, caso a emenda Dante de Oliveira não fosse aprovada por maioria absoluta, como aconteceu, na sessão da Câmara dos Deputados de 25 de abril de 1984.

 


Eleição de Tancredo

 

No final de junho, o PDMB lançou o nome de Tancredo Neves, que renunciaria ao governo de Minas, para disputar o pleito no Colégio Eleitoral com apoio de Ulysses Guimarães. Quatro dias depois, a Frente Liberal, dissidência do PDS, rompeu com o governo, dando início às negociações com a oposição para apoiar Tancredo, indicando o senador José Sarney para vice. Em 15 de janeiro, ou seja, há 40 anos, o Colégio Eleitoral deu 480 votos a Tancredo Neves e 180 a Paulo Maluf, candidato governista. A eleição no terreno escolhido pelo próprio regime pôs um ponto final na sua existência.

 

 

Entretanto, ontem, essa data histórica foi solenemente ignorada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O motivo é político: o PT não votou em Tancredo Neves no colégio eleitoral. Três deputados do partido discordaram dessa orientação: Bete Mendes (SP), José Eudes (RJ) e Aírton Soares (SP), que deixaram a legenda para não serem expulsos.

“Decidi votar no Tancredo porque o seu adversário, o deputado Paulo Maluf, representava a linha dura do regime militar. Sua vitória significaria o recrudescimento do regime, a argentinização do processo brasileiro”. Os demais membros da bancada não compareceram à votação: Eduardo Suplicy (SP), Luiz Dulci (MG), Irma Passoni (SP), José Genoino (SP) e Djalma Bom (SP). Ecos da velha divisão da esquerda na crise de 1964.

Entre fins de janeiro e princípios de fevereiro de 1985, Tancredo visitou os Estados Unidos e vários países da Europa. Com o seu regresso ao Brasil, articulou a formação de seu ministério. Um dia antes da posse, marcada para 15 de março de 1985, porém, Tancredo Neves foi submetido à uma cirurgia de emergência. José Sarney tomou posse como presidente em seu lugar, em meio à comoção e à perplexidade.

 

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Tancredo Neves viria a falecer na noite de 21 de abril, depois de ter sido submetido a sete cirurgias. Na manhã de 22, Sarney foi confirmado na presidência. No dia 23, o corpo de Tancredo Neves chegou ao aeroporto de Belo Horizonte, para receber as homenagens de cerca de 1,8 milhão de pessoas. No dia 24, na presença de 50 mil pessoas, foi enterrado no cemitério de São João del-Rei, sua terra natal.

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