Sempre gostei de observar o comportamento humano. Quando preciso esperar uma consulta médica ou embarque em avião, por exemplo, dedico parte do tempo olhando as pessoas passando, conversando, se alimentando. Eu me divirto criando histórias a partir da forma como se comportam em público, histórias que, na maioria das vezes, não farão jus à realidade. Mas isso pouco importa quando o que se deseja é tornar menos entediosa a espera.


Passei a observar outras culturas fora do Brasil e a pesquisar sobre elas, desde que comecei a me enveredar por locais bem diferentes dos que eu estava habituada. Quando vou ao continente africano acabo dormindo na capital da Etiópia, Addis Abeba, entre um e outro voo. Mineira que sou, não perco o trem e me dirijo ao aeroporto com muita antecedência. É um dos locais mais ricos em termos de diversidade no que se refere a vestimenta e hábitos. Quanto mais buscamos conhecer e estudar, mais tendemos a respeitar e a admirar.


Entre as várias viagens que fiz ao Malawi, passei a me sentir em casa entre as ruelas e casebres do campo de refugiados de Dzaleka, onde desenvolvo um projeto, junto a ONG Fraternidade Sem Fronteiras, que forma costureiros. A maior parte das 55 mil pessoas que vivem lá fugiram de guerras sangrentas motivadas por conflitos étnicos, disputa por terra, intrigas familiares ou perseguição devido a orientação sexual.


Desde o início percebi o quanto é preciso estar preparada para ouvir a resposta a seguinte pergunta: o que te fez fugir de sua pátria, a largar seu lar, sua família? As histórias são difíceis de digerir porque são reais, chegam a ser palpáveis principalmente porque se vê o resultado de tanto ódio.


Por outro lado, uma coisa sempre me intrigou. Como estas pessoas conseguem acordar com um sorriso nos lábios depois de passar por tantas dificuldades, de ver sua aldeia ser aniquilada, seus pertences usurpados, sua família destroçada? Estão sempre com muita fome, pois não têm ocupação e renda que lhes garanta o mínimo, raramente vão ao médico e enviam seus filhos à escola.


Meu lado inquieto de jornalista transformou em um livro vários dos depoimentos que colhi. São histórias marcantes de refugiados oriundos principalmente de Ruanda, Burundi e República Democrática do Congo.


“Há um lugar para mim na casa do meu pai” está sendo lançado esse mês pela Autêntica Editora. O título responde parte de minha indagação. O que os mantém lutando por suas vidas, procurando criar novos laços familiares é a fé fervorosa que têm em Deus, a esperança de que um dia alcançarão o que até agora lhes foi privado. Boa leitura!

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