Tempos bons foram os de faculdade. No final dos anos 1980 os corredores do segundo e do terceiro andar do prédio 9 da PUC Minas eram as melhores “salas” de aula. Viviam cheios de gente, umas em pé, outras sentadas ou até deitadas enquanto proseavam. Estudar a noite tem disso; muita gente cansada, inclusive eu que trabalhava o dia todo. Ainda assim, naqueles corredores discutia-se de tudo, até sobre o sexo das formigas. Isso mesmo, esse tema teria virado meme em minha turma, de dezembro de 1987, caso existisse internet na época.


Mas a vida pulsava, inclusive na sexta a noite, coisa que hoje não se vê nos cursos noturnos. A frequência de sexta era como a dos outros dias de feira. Normal e disputada, afinal as ideias não escolhem data, mas circunstâncias, para florescer. Pra melhorar, de lá íamos pra farra, a maioria das vezes botecos despretensiosos na região do Dom Cabral ou festinhas na casa de algum colega.
As salas eram abertas a quem quisesse entrar, sendo que às vezes meu marido, então no papel de namorado, se aventurava a ir dar opinião mesmo sendo ele da área de exatas. Enfim, poucos foram os colegas que persistiram no jornalismo e a vida acabou me separando da maioria deles.

 




No final do ano passado, quando terminei a redação do meu livro com histórias de refugiados de guerras africanas, procurei, por mensagem, um contemporâneo de PUC que desde os tempos de escola dedica a vida à literatura. Infelizmente, hoje ninguém liga pra ninguém e muito menos aparece de surpresa pra tomar café e colocar a conversa em dia. Cumprimentos e uma mensagem curta. “Preciso de sua ajuda, não conheço ninguém na área editorial”. Saudações e uma resposta precisa. “Vou fazer uma ligação, me aguarde”.


Expectativas foram criadas e deu no que deu. Em duas semanas, numa manhã de domingo, fim de dezembro, me sentei na calçada da Livraria Quixote, na Savassi, com Rejane Dias, editora-executiva do Grupo Editorial Autêntica. Ela correndo e eu torcendo. “Me diz o que você está fazendo pra chamar nossa atenção”.

 


Confesso que escrevo melhor que falo, mas consegui resumir minha vivência em locais de miséria extrema. “Vou ler e tendo a arriscar”, disse. Explicou que histórias de sofrimento não estão entre as preferidas dos brasileiros, mas não há como fingir que não existem e não nos dizem respeito. Semanas depois, a Autêntica assumiu não apenas sua razão comercial, mas principalmente sua missão social e humanitária.


O livro “Há um lugar para mim na casa do meu pai”, contendo histórias de refugiados de Burundi, Ruanda, República Democrática do Congo e Camarões, foi lançado há duas semanas e suas vendas tem nos surpreendido, o que nos valeu o convite para participar da primeira edição do Festival Literário Internacional de Petrópolis. O Flipetropolis começa na quarta dia 1º e vai até domingo dia 5 de maio, sob o comando de seis curadores que nos garantem uma programação de excelência com grandes nomes da literatura contemporânea nacional e internacional. A eles e à Rejane Dias meus agradecimentos por essa grande parceria e minha reverência pelo trabalho que fazem como ninguém.

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