Se o mundo não sente angústia por infortúnios passados não é porque aquilo passou, mas sim porque algo pode ainda vir a acontecer. O que passou definitivamente se não gerar arrependimento continua presente, e a culpa é uma possibilidade de ter que suportar eternamente o castigo. O relativismo moral do mundo atual fez o tempo das distinções e do discernimento passar, e a humanidade sofre mais por isso. Não há mais terra firme, a confusão anda a todo vapor.
Nenhuma habilidade no uso da opinião esconde a verdade sobre a barbaridade de uma guerra entre povos e nações. Mas diante do terror é um insulto procurar explicação. Este é um caso limite e fatal em que a inteligência não pode ser o oásis da autoestima. Não se compra a versão do terror no mercado da liberdade. Frente ao terror as contemporizações da sensibilidade, as ponderações elevadas sobre a origem e a culpa pelos seus atos, conduzem seus porta-vozes a mais desmoralização do que influência, pregam no deserto com uma eficácia limitada e normalmente uma extraordinária negligência de ação. Sem quebrar a insolência do terrorismo em se apropriar da causa dos palestinos – e querer desadmirar Israel pela resistência e combate que faz ao terror – enfraquece a causa da paz.
Quando o filósofo Jean-Paul Sartre criou o grupo Socialismo e Liberdade para organizar a resistência da França contra a ocupação nazista convidou o escritor André Malraux para se unir a eles. Mudou a forma de agir quando ouviu do grande humanista e futuro Ministro da Cultura de Charles De Gaulle: “O que precisamos para combater Hitler são tanques russos e aviões americanos, não um grupo de intelectuais bem intencionados”. Só quando as nações democráticas se uniram contra o terror os Aliados puseram fim a Segunda Guerra Mundial.
Mas será que o mal que habita a mente dos fanáticos acabou? Há, é certo, diferentes gradações do mal e o terror sabe que a legítima defesa produz suas próprias leis. Quando grupos políticos fanáticos se perdem nas trevas de suas certezas absolutas, tentando se colocar acima de tudo, revelam mesmo é que não estão à altura de nada que possa produzir beleza, alegria e dar a princípios e valores um sentido prático que sirva a maioria. Suas ações bem significam um esconderijo de suas intenções totalitárias. Nada do que fazem tem a ver com criatividade dos novos valores. São antes sanguinolenta publicidade comercial de interesses simplificados por ações paramilitares criminosas contra inocentes e slogans políticos que falam de obscuras noções de liberdade e autodeterminação.
Quem tem fé na possibilidade de algo de bom nas pessoas não passa a mão na cabeça do fanático. Falar do terror é falar de uma ferida da alma que despreza o corpo. Antes de decidir é melhor distinguir. Líder, movimento, grupo que se acha perfeito tem a obrigação de ultrapassar sua espécie particular de perfeição. O terrorismo não é grandioso, criativo, generoso, nem da estirpe do corajoso. É depreciativo e vil ao atacar inocentes, produzir seus estragos especialmente se valendo de uma comunidade internacional de países de rédeas frouxas, desacostumado ao respeito por acordos e tratados, que arrasta pelo chão noções de soberania territorial e viola a paz de todos como se as nações fossem sem donos. A enfermidade da alma de um autoritário ameaça a sanidade do corpo e busca triunfar sobre pessoas desarmadas, desvinculadas de lealdades políticas para abatê-las e deploravelmente usá-las para propaganda do terror.
Quando o mau desfralda a bandeira dos bons aguarde a ruína de nossa época. Qual o sistema político formulado por um fanático? Somente um, o do fanatismo. Quanto mais isolado internamente espalha pelo mundo a escaramuça que mais interessa ao terror que é aumentar seus aliados externos e envolver o interesse das nações em tirar proveito da dor dos outros. E vai além ao colocar dúvida sobre os alicerces da civilização, especialmente a razão, a liberdade, democracia e os direitos humanos. Expande sua descrença e seus preconceitos sobre a possibilidade da convivência harmoniosa entre os povos.
Lembra versos do primeiro ministro inglês George Canning: Dê-me um inimigo declarado, ereto, valoroso. Posso enfrentá-lo com bravura, talvez responder ao golpe. Mas, Deus meu, de todas as pragas que tua cólera pode enviar, Salva-me, salva-me, oh Deus, salva-me da deslealdade do amigo. A pior das doenças da política é abandonar princípios na hora das grandes decisões. É quando líderes vacilam e se lavam das convicções vestindo a roupa do interesse e da ambição bordada com implicações morais.