O mundo caminha para a era do perigo, diz o Instituto Internacional para a Paz de Estocolmo ao informar, em seu relatório atual, que aumentou como nunca a venda de armas para grupos clandestinos e segurança privada. Acrescenta que a existência de 33 conflitos regionais em forma de guerra civil ou guerra de ocupação estrangeira revela uma destrutividade sem precedentes dentro e entre as nações.
O Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) feito pela OCDE, que compara e avalia habilidades nos estudos dos jovens, declara que houve uma queda histórica nos índices de aproveitamento dos estudantes dos países ricos e uma estagnação dos indicadores dos pobres. Em
praticamente todo o mundo, despencou o desempenho escolar.
Alguma coisa está errada, e o uso selvagem da tecnologia faz dela a principal culpada. A moda é ser calado e melancólico, com um celular na mão fazendo a pessoa emergir do seu sonho de ser alguém para o vexame de ser mais um dentro de um mundo de ninguém. Não aceite a vida pronta feita pelos outros. Um mundo celular-orientado é um mundo de paixão insensível que, com sua força infernal cotidiana, já está destruindo quem dela está possuído.
Sei que desfraldo a bandeira dos anjos, mas se é para abandonar valores tradicionais, que seja com alguma nobreza. Acomodados a dias quebrados, notícias vulgares e vontade mole, o certo é que dentro do aparelho telefônico móvel, chamado celular, as pessoas aniquilaram a família, o poder, a religião, o estudo, o trabalho e a saúde mental.
Em todas as avaliações sobre o estado de espírito que ronda a vida humana, a conclusão é uma só: as gerações atuais são fracas, seres livres com ódio da liberdade, isto é, influenciáveis facilmente, e não têm o mesmo calibre das que construíram os séculos passados. O mundo está deprimente, depressivo e deprimido como nunca esteve e a raiva interna na vida das nações pode ser a principal causa do aumento do sofrimento individual.
A inspiração compulsiva de inventores de novas tecnologias, às raias da insolência, conferiu uma honra desmedida a aparelhos e aplicativos, e ao mito da mudança vista como atualização diária das novidades. A escola não cria mais idiotas, os recebe prontos. Amaldiçoados, gênios doentes, se divertem com a ingenuidade e a maldade do mundo.
Não há mais necessidade de coação ou contenção das pessoas excessivas e antissociais. A transgressão está livre, o crime virou emprego e meio de vida. Contra as boas regras de convivência não se usa mais a honra, bastam apenas as defesas antivírus e os atalhos técnicos para que os crimes não sejam mais responsabilidade individual, mas simples falha nos mecanismos de proteção de dados.
Solte suas feras pois tudo agora é normal e permitido, não há mais necessidade de valores e princípios para viver. Entregue sua alma aos algoritmos, “sistemas precisos, sem ambiguidade, eficientes e corretos”, que eles cuidam de deter seu ímpeto para errar. Basta se submeter ao aparato tecnológico para que fique inútil ter caráter, sentimento ou princípios.
A transparência que propaga a devassidão da vida dos outros, o segredo que não escondem, é o reino do mal tolerado que levou o mundo dos usuários à exaustão absoluta. Aceite passivamente o QRCode em qualquer lugar e se transforme em um catálogo de peças, prateleira de dados, um completo imbecil. Seu papel é destruir nas pessoas o raciocínio, os sentimentos e a personalidade, liquidar todos os complexos de pobre, de desinformado, antiquado, analógico. O mundo e as pessoas se revelam melhor pelas suas fraquezas e deslumbramentos.
Não há nenhum governo capaz de deter a tecnologia na sua liberdade total para fazer o tolo se entregar ao seu domínio. O declínio da pátria, o amor anterior à lógica, não importam aos governos. Mas se alguém, cheio de razão, reclamar da falta de sinal para a rede 5G, ou entrar em um lugar que não tenha WiFi, é um escândalo o que revela. Como sem sinal .? É um lugar que não serve bem ao obsequioso escravo da ordem técnico-produtiva-distributiva moderna que avançou até onde está, pela falta exuberante da ética.
Os governantes foram expulsos da sociedade dos grandes. Não é nem mais por falta de coragem para mandar às favas deslumbrados boçais da tecnologia convictos de sua impunidade. É que governantes usam também, mais deslumbrados ainda, a tecnologia que os fez inúteis, e os tornou incapazes de chamar gato de gato, rato de rato.De quem é a culpa por tão desafortunado tormento que leva a pessoa a dores além do seu destino, ter que suportar seres difíceis, supor deuses desfavoráveis no comando? (Continua na Coluna de 31 de Dezembro).