Ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, discursa durante a conferência ao lado do ministro de Senegal, Yassine Fall (à esquerda), e do Congo, Jean-Claude Gakosso (à direita) -  (crédito: Greg Baker/AFP)

Ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, discursa durante a conferência ao lado do ministro de Senegal, Yassine Fall (à esquerda), e do Congo, Jean-Claude Gakosso (à direita)

crédito: Greg Baker/AFP

“Juntos por um futuro melhor”, dizem as faixas espalhadas ao longo das principais avenidas de Pequim. Por elas, trafegam desde os primeiros dias de setembro quase todas as principais figuras à frente dos governos dos 54 países da África.


Talvez fosse esperado que um encontro de tal envergadura fora do continente africano ocorresse mais comumente em Nova York, sede das Nações Unidas, ou mesmo em Washington, capital da potência que liderou a economia mundial após a Segunda Guerra. Ou, então, em alguma capital europeia, continente que por muitos anos manteve colônias na África. Mas, não. Quem realmente decidiu investir no continente africano num patamar elevado de fluxos de capital foi a China.

 

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O encontro em Pequim é a cimeira trienal do organismo criado para estruturar as relações políticas e econômicas entre a China e o continente africano. O evento ganhou o nome de Fórum de Cooperação China-África (Focac), cuja criação se deu no mesmo ano em que países da União Europeia (UE) participaram do primeiro encontro entre chefes de estado e de governo da África e da UE. A cimeira UE-África, que aconteceu no Cairo, foi, assim, a primeira do seu tipo. Todavia, não foi à frente com o mesmo ânimo do Focac.

 

 

É também verdade que encontro semelhante foi inaugurado por Barack Obama em agosto de 2014 em Washington. A Cúpula de Líderes EUA-África foi, no entanto, uma resposta aos encontros de cúpula do Focac inaugurados em Pequim. Ainda que bem-intencionada, a tardia resposta ao exemplo chinês também não anda bem.

 


Por exemplo, enquanto os encontros EUA-África ficaram a ver navios durante os anos da gestão de Donald Trump – que não visitou a África uma única vez sequer durante seu mandato –, aqueles entre a China e os países africanos seguiram de vento em popa.


No final de 2022, Joe Biden reeditou a Cúpula de Líderes EUA-África com grande comparecimento dos mandatários africanos em Washington. Todavia, é notável como os EUA gastam mais tempo criticando os investimentos chineses na África do que fazendo frente com um cheque maior e mais permanente.

 


Ou seja, ainda que tenham base as críticas de que os investimentos chineses na África tenham um punhado de fragilidades, os EUA não têm mostrado vontade de formular uma alternativa aceitável. Criticam muito, entregam pouco.


Apesar das críticas aos investimentos chineses, muitas vezes amarrados em acordos opacos atrelados aos desígnios de Pequim, o fato é que são esses repasses que possibilitam um crescimento econômico bastante positivo no continente africano. Nesse processo, diversos países estão se desenvolvendo mais rapidamente do que se dependessem apenas das benesses de órgãos das Nações Unidas, do Banco Mundial ou da colaboração padrão praticada por EUA e UE.

 


A cimeira do Focac em Pequim, em 2006, foi a primeira de seu tipo fora do continente africano. Em seguida, tentando se posicionar um pouco melhor, os europeus lançaram a Estratégia Conjunta África-UE em 2007, em Lisboa. Enquanto o Focac acelera, o evento articulado pelos europeus caminha sem animação ou recursos.


Em 2024, Xi Jinping prometeu à cúpula do Focac intensificar o apoio da China à África com um financiamento de cerca de US$ 51 bilhões (cerca de R$ 280 milhões na cotação atual) ao longo de três anos: valor 10 vezes maior do que o volume de empréstimos acertado na cúpula do Focac em 2006. São novos projetos que devem criar pelo menos 1 milhão de empregos na África.


Observando a onda sendo surfada por outros países, o Brasil também tentou liderar uma aproximação com a África. Fez isso de forma inovadora ao incentivar a criação da Cúpula América do Sul-África (ASA), envolvendo assim todos os países de nosso continente sul-americano. Todavia, a última cimeira do grupo ocorreu em 2013, em Malabo, na Guiné Equatorial. Faz, então, uma década de pouco engajamento e projetos conjuntos, o que demonstra a dificuldade brasileira e sul-americana em operar políticas de Estado para além dos ciclos políticos.


É importante notar, ainda, que a aproximação da China com a África não surgiu do nada em 2000. Os asiáticos colaboraram de forma decidida com os esforços de independência de vários países africanos na segunda metade do século XX. São laços importantes que o Partido Comunista Chinês mantém com diversos partidos de origem revolucionária que ainda estão à frente de países africanos, sobretudo no sul do continente.


A ideia de que estariam “juntos por um futuro melhor” não é, portanto, mera propaganda vazia de história. Por isso, será cada vez mais comum ver a África, com seus recursos naturais e demandas mil, aceitar a sedução das parcerias ofertadas pela China.