Muito de vez em quando, surge uma boa notícia, no caudal de agressões à cidadania. Dias atrás (05 de março) o Conselho de Segurança Alimentar (Consea) acolheu o Decreto da Presidência da República definindo um novo conceito de “cesta básica” de alimentos. A boa novidade – ainda no papel, a ser implantada um dia – é a recomendação oficial de uma dieta que represente “Saudável Alimentação, Nutricionalmente Adequada” (Sana). O evento no Planalto ficou na badalação, mas é preciso reconhecer quando o espaço de mídia é preenchido pelo governo para afirmar algo sensato e exercer, efetivamente, seu dever de orientar a população; em bom português, o dever de governar direito.
O Brasil convive hoje, como tantas outras nações, com o que os especialistas em nutrição chamam de “duplo encargo”, que é o convívio, num mesmo país, da chaga das carências alimentares e, lado a lado com a fome, a exponencial epidemia da obesidade, que vai do mero sobrepeso até os casos mórbidos, exigindo cirurgias no sistema público de saúde. Reflitamos: todos somos, estritamente, o que nossos pais nos legaram, geneticamente, mais o que ingerimos todos os dias.
Hábitos alimentares equivocados (gorduras em excesso, muito doce, álcool demais - que depois vira mais gorduras – e dietas pesadas em enlatados e massas) vão acumulando contribuições negativas ao nosso organismo, que responderá com perdas. Perdas de dias de trabalho, perdas de atenção na escola, perdas de produtividade, até chegar às perdas de vida. Infelizmente, uma parcela relevante das chamadas DCNT, Doenças Crônicas Não Transmissíveis, que vão dos entupimentos de vasos sanguíneos aos vários tipos de câncer, das fraturas de ossos ao terrível diabetes, é estatística diária de sofrimento de milhões de brasileiros em decorrência, quase exclusivamente, da má alimentação. As salas de consulta do SUS estariam bem menos lotadas se a população comesse melhor.
Ocorre que uma dieta Sana é o que ficou determinado também no artigo oitavo da Emenda Constitucional que promulgou a reforma tributária do consumo, em dezembro passado. O legislador, num rasgo de luz, inseriu essa nova definição de “cesta básica nacional” como sendo uma Cesta Sana. Saudável e nutritiva. Com essas exatas palavras. Portanto, no decreto desta semana, o governo federal não fez mais do que seguir a nova redação da Constituição, onde se definiu uma cesta que não é só um prato com calorias para repor a força de um trabalhador – definição lá de 1938 – mas, agora, se tornou algo até revolucionário: um leque universal de “bons alimentos”; não só para o homem adulto, mas para a mulher, a criança e o adolescente, o idoso, o doente. Para todos. Com uma condição realmente nova: redução a zero de TODOS os tributos de consumo incidentes sobre a cesta Sana. Realmente, o legislador, liderado pelo relator Aguinaldo Ribeiro, deu um passo gigante na direção de reduzir os preços relativos da “boa dieta”, pela exclusão de qualquer imposto, da produção do campo às gôndolas do supermercado.
Quando implantada a nova regra de não incidência de impostos, a cesta Sana – que ainda pode demorar, como quase tudo por aqui – o Brasil poderá se apresentar como um país que terá simplificado o acesso de todos à boa alimentação, sem necessidade de tortuosos mecanismos de cashback (cheques de devolução de imposto), estes caros e ineficazes.
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A novidade dentro da boa notícia é a amplitude da liberação de impostos. O decreto desta semana aponta 10 categorias (ou seja, grupos de produtos) como parte da nova cesta Sana. Mas o decreto não se aplica ao aspecto tributário, que dependerá de lei complementar. A Abras, associação brasileira dos supermercados, fez seu dever de casa e propôs, também esta semana, uma lista completa de cerca de 700 itens alimentares que considera aptos a estar na lei que o Congresso deverá votar este ano para compor uma Cesta Sana. A lista de Cesta Básica Nacional de Alimentos da Abras é um passo bem mais amplo do que os 10 grupos de produtos definidos no decreto do governo. O setor produtivo deu uma contribuição relevante para fazer essa lei andar rápido no Congresso, o que permitirá a liberação total de tributos, ajudando assim o brasileiro a se alimentar mais e melhor.
Desde os romanos, quando um poeta chamado Juvenal inseriu em seu poema uma estrofe em que dizia “...mens sana in corpore sano, mente sã num corpo sadio” sabemos que a humanidade é produto dessa maravilhosa interação entre o homem e a natureza, que nos permite a evolução da espécie pela produção daquilo que consumimos. O Brasil tem se destacado nos últimos anos por ser o “celeiro do mundo”, talvez com algum exagero de expressão. Mas a segurança alimentar mundial, hoje, depende de nós. Não se concebe, portanto, que o celeiro do mundo fique marcando passo como país de alto custo nos alimentos, de impostos elevados na comida e de insegurança alimentar. Os congressistas deram um grande passo para harmonizar o Brasil que produz com o Brasil onde todos, sem exceção, poderão também consumir uma dieta Sana. Sem qualquer imposto.