Gráfico -  (crédito: Arte)

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O governo brasileiro é um caso raro de suicídio da boa gestão financeira. Neste momento, a área econômica promove um calote na confiança. Maus pagadores, por definição, dão calote em dívidas. No caso do governo atual, o calote não é dado nos títulos, mas na confiança do mercado nestes papéis.
O Brasil está longe de ser mau pagador. Mas insiste em se fazer representar, no mais alto nível de sua administração, por pessoas e grupos que conseguem transformar pequenos problemas em grandes imbróglios.

 


Esse é o caso da atual gestão do orçamento público federal. Existe uma regra – chamada de “arcabouço fiscal” – criada pelo próprio presidente Lula e seu ministro Haddad em 2019, pois não admitiam a regra do “teto de gastos” do governo Temer, então de saída. O Congresso aprovou a regra à la Lula, bem menos rigorosa do que a de Temer/Meirelles, não antes sem presentear o novo presidente com uma folga extra de gastos da ordem de R$ 200 bilhões, com a qual Lula fez bonito com uma vasta distribuição de verbas “sociais”.

 


Deveria ter sido suficiente para aplacar um guloso administrador de bondades públicas com recursos do contribuinte. Mas não. Insaciável, Lula foi à cata de atender a mais gastos. Seu exemplo cativante foi seguido pelo Congresso, com um festival de emendas parlamentares que, hoje, chegam a quase R$ 60 bilhões anuais. Todos de olho nas eleições municipais por que acabamos de passar, cujo resultado, pelo contrário, demonstrou que, nem sempre, é gastando mais que se amealham mais votos e eleitores.

 

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O resultado dessa festa de gastos federais está espelhada no quadro, que mostra a linha da despesa (sem encargos de juros!) se deslocando como um foguete em direção à Lua. Nos últimos 12 meses até set./24, o ritmo da despesa federal é de 18% de expansão, em face de receitas crescendo 10,4% e o ritmo das atividades gerais (leia-se, o PIB) se expandindo, segundo o Banco Central, na velocidade de 7%.


Vamos compreender esses números. A base sobre a qual o governo recolhe seus tributos tem crescido bem, a 7% em 12 meses. Nada a reclamar. Mas o governo Lula é favorecido por um ritmo de arrecadação até maior do que o da expansão do PIB: 10,4%. Ocorre que esse mesmo “governo” gasta de modo enfurecido – sempre ajudado pelo Congresso – numa espantosa expansão do gasto de 18% anuais. Mais do que a receita fiscal. Muito mais do que o PIB.


Com que moral esse governo vem apresentar, agora, um programa de “corte” de gastos que, no âmago, só corta o vento? Meticuloso com o jogo de palavras, o ministro Haddad fala de R$ 70 bilhões de “economias” em dois anos. Por que falar em dois anos, se o orçamento em votação é o de 2025? A sociedade quer saber o que ocorrerá no próximo ano. É isso que influi na confiança e define as expectativas para o futuro. Nada mais distante interessa, se o barco ameaça afundar logo nas próximas horas.

 

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Fato é que o Brasil é maior e mais forte do que seu anunciado naufrágio. Com enormes sacrifícios, o país conseguiu juntar uma reserva confortável de dólares, que impede o governo atual de nos converter numa canoa furada. Os setores produtivos – não só o agronegócio – contam com gente preparada e séria. É nossa salvação. Brasília, contudo, parece conspirar, diariamente, para subverter tal confiança dos brasileiros em si mesmos. De Brasília, os recados sempre passam por um discurso assistencialista tosco, que minimiza a capacidade das pessoas de lutar por si mesmas e nos transforma num bando de desamparados à espera do próximo cheque de assistência. Em suma, Brasília é uma fábrica de moer a autoconfiança dos brasileiros. Como esperar, num ambiente de tanta autopiedade, que os “mercados” sejam os últimos a sair vendendo suas posições em ativos?


Soluções? Sempre há solução. Uma delas é aguardar por 2026. Outra é esperar que o Banco Central venha com seu conhecido chicote financeiro, batendo duro em quem trabalha e paga impostos, com os juros mais altos do planeta, até que a inflação e a cotação do dólar voltem a um comportamento dito normal. Enquanto isso, NADA acontecerá na área pública que, minimamente, signifique uma quota de participação dos graúdos do governo no sacrifício das pessoas comuns.

 

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Não exagero nada. Vamos pegar a sequência de gastos federais ao longo das últimas décadas e tentar achar um único período em que o gasto público tenha recuado em relação ao anterior (exceto, óbvio, o ano seguinte à COVID de 2020). Não existe tal período de recuo, nem há tal corte. Não há qualquer sinal de redução de gastos desde 1997, quando a relação da despesa federal primária com o PIB era de apenas 14%. Hoje, quase 30 anos depois, a mesma despesa federal ascende a 20% do PIB. Quem, no governo, teria cortado algum gasto em todo esse longo período?


Concluo: o que mais me espanta é não encontrar qualquer sinal de redução do Ritmo de aumento dos gastos. Em palavras simples: no governo, gasta-se cada vez mais, num ritmo cada vez mais frenético, em que ninguém corta nada, embora todos reclamando, o tempo todo, de enormes cortes e grandes sacrifícios.


Há uma última possibilidade de remédio, embora remota: o Congresso poderia resolver não tripudiar tanto sobre a população, que todos os dias paga impostos sobre cada item que consome, sobre cada rendimento de salário e que ainda sustenta a previdência social mais cara do mundo. Se o Congresso resolvesse representar o povo, ao menos desta vez, uma silenciosa revolução social e financeira passaria a acontecer: o Legislativo estabeleceria uma regra de contenção de gastos confiável, a população seria beneficiada por não ser tão sacrificada e os mercados retomariam a confiança com quedas rápidas dos juros e do câmbio. Isso já aconteceu em vários episódios do passado. Pode acontecer de novo. É possível, sim, derrotar a desconfiança.