Em recente entrevista, o ministro Fernando Haddad defendeu a retomada dos investimentos no país -  (crédito: Nelson ALMEIDA/AFP)

Em recente entrevista, o ministro Fernando Haddad defendeu a retomada dos investimentos no país

crédito: Nelson ALMEIDA/AFP


Na sessão desta última sexta do fórum que presido há alguns anos (https://www.youtube.com/watchv?=oZpxv4AdS6A), o ponto central foi que a restrição macroeconômica fundamental do momento tem a ver com a disparada dos gastos das previdências públicas, por motivos vários que não cabem neste espaço, e que os governos de todos os entes públicos não têm querido (ou podido) enfrentar do jeito certo. Diante das restrições políticas existentes, na essência o que se tem feito é contrair ao máximo os investimentos públicos em infraestrutura, um dos itens mais flexíveis nos orçamentos, para abrir espaço financeiro e poder acomodar a disparada dos gastos previdenciários. Dessa forma, tal item teria caído de 3,9 para 0,6% do PIB entre 1980 e 2022.


Nessas condições, o peso da parcela pública no investimento total em infraestrutura desabara de 78% do total investido em 1980 para apenas 33% em 2022, na presença de uma parcela privada que ficou basicamente constante em torno de 1% do PIB em 1980-2022. Ou seja, em última instância a escolha que se fez foi a de minimizar desgaste político, ainda que à custa das perdas resultantes na oferta de empregos em decorrência da queda sistemática no crescimento do PIB que se seguiu à contenção dos investimentos em um dos segmentos mais importantes para esse fim em que o setor público costuma se envolver.


Com efeito, há muito os governos não conseguem aumentar seu endividamento para gastar, e o item infraestrutura é, possivelmente – entre os que têm ainda algum peso relevante no total –, o mais flexível dos orçamentos públicos. Daí, então, só restarem duas rotas principais: uma, a que está sendo seguida, ou seja, contrair mais e mais tais investimentos. E a outra, bem mais complicada, porém a mais correta, fazer o equacionamento previdenciário (ou zeragem dos passivos atuariais), algo que, curiosamente, tem previsão legal para ser obrigado a acontecer, pela EC-103/19, mas que, na prática, ainda não teve lugar. (Nesse sentido, deve-se destacar o esforço gigantesco que vem sendo feito pela Confederação Nacional dos Municípios, juntamente com o Sebrae, para arrumar a casa do jeito certo no bloco dos entes públicos onde a disparada dos gastos previdenciários tem sido a mais incisiva).


O grande drama da primeira rota, como não deveria nos surpreender, é que a derrocada dos investimentos públicos em infraestrutura nos últimos tempos acima relatada vem causando o grande estrago que ora ocorre em nossa economia, por serem determinantes básicos do crescimento do PIB de qualquer país.
Se compararmos os dados atuais (digamos, os de 2022) com os de 1980, veremos algo que poucos até hoje devem ter percebido com clareza, ou seja, como o comportamento da razão investimento público/PIB passou a ser replicado de perto pelo da taxa de crescimento do PIB: uma queda de 6,5 vezes na primeira, a determinar a desabada de 8,9 vezes na segunda... (Se pudessem aparecer aqui, tais gráficos estariam literalmente colados um no outro).


O destacado peso do investimento público em infraestrutura na discussão da evolução recente das variáveis-chave acima indicadas ganha força ainda maior se considerarmos, primeiro, que o investimento privado total observado nessa mesma área, medido também em % do PIB, tem oscilado muito pouco em relação à muito baixa média observada no período 1980-2022, algo ao redor de 1% do PIB. Ou seja, não se vê aparecer o resultado de um possível e relevante engajamento em uma evolução compensatória pelo lado privado, pois este, por definição, só se move por sua motivação típica e natural, ou seja, a maximização dos lucros. Dessa forma, os valores investidos pelo conjunto dos principais componentes do segmento de infraestrutura: telecomunicações, energia, saneamento e transportes, não se tem diferenciado de forma relevante do padrão observado para os gastos públicos totais em favor desse segmento. Se não, vejamos.


Com exceção de telecomunicações (onde a queda dos investimentos foi a menor de todos os principais segmentos, por força, provavelmente, de maior retorno privado) e de energia (onde se deu a maior queda), nos demais segmentos (especialmente em saneamento e transportes) a queda real foi praticamente a mesma do gasto total em infraestrutura.


Como sair dessa encrenca de uma vez por todas? Pelo ataque direto ao problema previdenciário, conforme passo-a-passo cada vez mais conhecido pelos especialistas na matéria, que uma hora terá de ser feito. Em face de resultados de ajuste já obtidos, e considerando o caso isolado do Estado do Piauí, onde um grupo que coordenei cuidou do que chamo de fase 1 de tal difícil empreitada, com a ajuda do maior especialista do país no assunto, o Consultor da Câmara Leonardo Rolim, entre outros, o estado, em vez de zerar suas inversões, logrou investir algo ao redor de R$ 1 bilhão a mais em 2022. Isso é o que precisa ser feito: transformar tendências de queda caminhando para investimentos públicos zerados, em sua retomada.
Na última sexta-feira ouvi entrevista do próprio Ministro da Fazenda na TV em que, sem ser muito específico, pedia a retomada dos investimentos em nosso país. O próprio presidente Lula às vezes solta um desabafo do mesmo tipo. Beleza. Só falta arregaçar as mangas e cumprir a lei...