Recentemente, o Senado aprovou, por unanimidade, a PEC nº 66/2023, que equiparou as regras de aposentadorias e pensões dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) dos servidores estaduais e municipais às da União, além de criar um parcelamento especial das dívidas dos municípios para com o INSS, limitar o pagamento de precatórios a um percentual da receita corrente líquida e desvincular receitas municipais.
Na verdade, entre 1988, ano de promulgação da atual Constituição Federal, e 2019, as regras de aposentadorias e pensões dos servidores públicos tinham sido sempre iguais para os servidores de todos os entes, ou seja, da União, Estados e Municípios. Foi apenas a partir de 2019, com a aprovação da Emenda Constitucional nº 103, que cada ente federativo passou a ter autonomia para definir suas próprias regras. Foi uma estratégia de deputados federais que visava a dividir o ônus político da aprovação dessa reforma com governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores.
Só que, na prática, essa medida se mostrou, além de injusta, desastrosa do ponto de vista fiscal. Passados cinco anos daquela última reforma, até agora seis estados e o Distrito federal ainda não aprovaram as suas. Mas o pior cenário está nos municípios, pois, de um total de 2.092 municípios com regimes próprios, apenas 755 fizeram a reforma. Ou seja, apenas 36% aprovaram as respectivas reformas. Uma consequência importante disso foi a geração de um déficit atuarial de R$ 1,1 trilhão nos municípios e R$ 3,1 trilhões dos estados. Para cobrir tais déficits, os estados e municípios retiraram uma parcela importante do dinheiro que deveria ser destinado às políticas públicas mais diretamente voltadas a atender à população.
A título de exemplo da injustiça previdenciária criada por essa medida, cabe citar o Distrito Federal e Novo Gama, esta uma cidade do entorno de Brasília. Como o Distrito Federal não fez reforma, o professor do ensino fundamental do DF se aposenta 5 anos antes do professor do Novo Gama, que fez a sua. O mesmo ocorre com o professor de ensino médio do DF, em relação ao professor da rede estadual de Goiás que ensina a mesma disciplina em uma determinada escola do que em qualquer município do entorno de Brasília. Qual a justificativa dessa desigualdade, quando o servidor do DF provavelmente ganha mais e tem melhores condições de trabalho?
Pois bem, agora a PEC 66 está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, para a análise de constitucionalidade. Posteriormente será criada uma Comissão Especial para discutir o mérito da PEC. Para a surpresa de muitos que acompanham o tema, o relator na CCJ, Deputado Darci de Matos, do PSD-SC, apresentou parecer considerando inconstitucional as regras de aposentadoria voltarem a ser iguais para todos servidores públicos, como sempre tinham sido. Já vimos muita criatividade indevida no Congresso Nacional, mas essa passa de qualquer limite aceitável, beirando algo provavelmente próximo do ridículo. Em outras palavras, o parecer seria pela inconstitucionalidade, pois o texto original não fazia qualquer distinção entre as regras de aposentadoria dos servidores federais, estaduais e municipais, e não dava nenhuma prerrogativa de os entes legislarem sobre esse assunto.