Se o mais alto valor dominante da sociedade é o lucro e não o humano, o que acontece é a inversão que tem como consequência uma série de desastres a curto e longo prazo. É concreto subindo, asfalto cobrindo o chão, desmatamento, barragens de lama tóxica e inversão das montanhas pela mineração. O resultado é desequilíbrio ecológico, desertificação e pobreza radical.
O esgotamento do planeta que estamos sofrendo não é pela sobrevivência. A impiedade e a crueldade, acompanhadas pela indiferença, são o efeito do discurso capitalista, que promove a ruptura de laços priorizando o gozo com os objetos. Preferem-se carros de luxo, celulares, tablets e relações digitais a pessoas. Por isso a miséria nas calçadas em contraste com a hiperacumulação.
Esta inversão de valores é muito grave. A perversão polimorfa infantil permanece inalterada, não educada. Não se corrigiu o egocentrismo e nem se ensinou o ideal de civilização, ou seja, a proteção e defesa da espécie humana. Porém, de fato, nunca foi para todos, favorecem-se alguns enquanto outros jazem à margem.
Sendo o Brasil o último dos países a abolir a escravidão, a gente já fica avisado: não somos bons. O tal “não desistimos nunca” dos brasileiros pode ter duplo sentido, um para o bem e outro para um lado não tão bom. Vejamos o que a caça por dinheiro provoca de efeitos para a coletividade, usando amostra bem reduzida, mas não insignificante.
Acredito que seja uma foto 3x4 da realidade: não se fala outra coisa nestes dias senão do que aconteceu no show de Taylor Swift no Rio. Calor escaldante, não se podia entrar com garrafinhas de água no estádio, grama coberta por tapetes de ferro, tapumes, lotação esgotada, sem distribuição de água. Fizeram um forno humano. O público clamava: “Water, water, water”... A onda de calor anunciada não foi administrada.
Ninguém sabe se a morte da jovem de Mato Grosso se deu por calor ou desidratação, mas o ambiente era insalubre. Onde estava a produtora que lotou o espetáculo sem infraestrutura para receber decentemente as pessoas?
Estive no Mineirão, no show do Roger Waters, e no mínimo 50 mil pessoas estavam lá. Em nenhum banheiro havia lenço de papel ou qualquer tipo de sabão. Mas o que era vendável estava OK! – camisas, Redbull, cerveja, outras bebidas. Os caixas circulavam em todos os lugares, mas o que era gratuito incluído nas instalações foi ZERO.
Um absurdo, seria responsabilidade do Mineirão ou da produtora? Quem passasse mal lá estaria em maus lençóis. Daí podemos deduzir que quem produziu o evento passou longe de pensar nas pessoas e na qualidade do atendimento a idosos, adultos e adolescentes que foram lá prestigiar o ídolo e encontraram situação precária. Vida de gado...
Acredito que alguém faturou alto, mas dinheiro e falta de cuidado com as pessoas, tratadas como manada, é insano e desumano. Prova de que é preciso cuidado com esses megashows. Ganhar dinheiro com um serviço degradante, com cara de jeitinho esperto brasileiro. O melhor é quem ganha mais... não importam as condições.
São exemplos da total falta de empatia e da priorização da lucratividade. O gozo do lucro ultrapassa qualquer valor solidário e passa longe disso. Quem pagou, não pagou pouco. Esta é a crítica que a psicanálise faz ao famigerado capitalismo. É o puro gozo do lucro, uma cara medonha, bufando e babando por mais, mais e mais, mostrando a pior face do ser humano.