Para quem acredita que a história está sujeita a qualquer tipo de determinismo, tal como foi a moda entre as elites intelectuais durante o século 20, ou que o futuro é apenas uma extensão do presente, há razões para pessimismo em relação ao nosso país. Da virada do século até agora quase nada melhorou no Brasil. Nossa renda por habitante está praticamente estagnada, há um visível encolhimento da classe média, aumentou na população a percepção de corrupção e de insegurança e a confiança do povo nas instituições está em seu momento mais crítico. Se o presente durasse para sempre estaríamos perdidos.
Como cidadão e como político nunca deixei de pensar no meu país com paixão e com esperança, sentimentos comuns a muitos de nós que remanescemos da geração dos anos JK. Nós nos tornamos homens e mulheres num momento em que era razoável acreditar que para o Brasil o céu era o limite. O país era pobre, certamente mais pobre do que hoje, mas tinha uma riqueza única: muita gente sonhando. Há quem diga que os sonhos são a maior riqueza do homem. Minha impressão é que os sonhos estão em falta na vida do país, e esta é hoje nossa maior fraqueza.
É uma tarefa complexa compreender completamente por que o Brasil se encontra no presente estado. No entanto, nem todos pensam assim. Os dois grandes polos políticos do país são liderados por gente com uma visão muito simplificada do mundo moderno, mais empenhados em aumentar e fortalecer suas militâncias do que em propriamente articular um projeto para o Brasil do século 21. Ambos os grupos dominantes da política brasileira, comandados por Bolsonaro e Lula, travam uma luta por ideias que já estão mortas há muito tempo.
Eles tem propostas impossíveis de volta a um mundo que já não existe. Um quer reconstituir o Brasil do regime militar, nascido pela força há 60 anos e encerrado melancolicamente há 40 anos. O outro quer reconstruir o Brasil com o manual de instruções da esquerda latino-americana dos anos 1950 e 1960. Como duas ideologias reacionárias e extemporâneas podem dominar o debate político na era da inteligência artificial em nosso país, já tão modernizado em muitos aspectos, é algo que intriga e nos desafia.
Na política, quando o centro não se sustenta e esmorece, está aberto o caminho para a crise e o fracasso. As teorias dos cientistas políticos mundo afora atribuem à qualidade das instituições o destino das nações. Em grande parte, estão próximos da realidade, mas será sempre um erro subestimar o papel que as lideranças políticas desempenham. Hoje, mais do que nunca, quando o caos informacional produz sociedades muito desintegradas, um líder capaz de oferecer um rumo e de facilitar a coesão social, pairando acima dos conflitos morais e culturais, pode mudar o destino de uma nação.
O despreparo, a mediocridade e a falta de grandeza dos três últimos presidentes eleitos no Brasil são parte da resposta pelo estado em que se encontra nosso grande país e para a falta de perspectivas em que nos encontramos. Todos foram escolhidos livremente pelo povo, aos quais nosso sistema político não foi capaz de oferecer outras opções viáveis. Dilma Roussef, Jair Bolsonaro e Lula 3 (o Lula de 2003-2006 é certamente uma outra história, um outro momento) são personagens menores do que o país e principalmente menores do que seus problemas.
Um grande pensador de nosso tempo, Karl Popper, escreveu algo que sempre me acompanhou: o futuro encontra-se em aberto. Tudo pode acontecer. Ele disse ainda: Temos o dever moral de enfrentar o futuro de um modo diferente daquele que seria se o futuro fosse apenas uma continuação do passado e do presente. Outra pensadora, que viu e viveu muitas coisas, Hannah Arendt disse que na política temos o direito de ter a expectativa de milagres, porque os homens são aptos para realizar o improvável.
Diante do presente sombrio não podemos permitir que os sonhos morram para sempre. Temos que parar de apenas lamentar e começar a imaginar o que podemos e devemos fazer, pois o caminho do futuro está aberto.