Na cerimônia de abertura do novo ano Judiciário, presentes o Presidente da República e o Presidente do Congresso Nacional, o Presidente do Supremo Ministro Luís Roberto Barroso declarou que “hoje as instituições funcionam na mais plena normalidade”. Dias depois, em editorial, o jornal “Estado de São Paulo”, comentando a fala do ministro, fez a pergunta: funcionam para quem? Eis uma pergunta que cada brasileiro não pode deixar de fazer, mesmo que a resposta possa vir a ser inconveniente para os que participam de alguma forma do comando do país.

Todos os países têm seus problemas. Há os que ainda são muito pobres e aos quais falta tudo. Outros estão se enriquecendo, mas suas populações vivem sem liberdade, submetidas a governos opressivos. Outros são ricos e também livres, mas as desigualdades internas fomentam um ambiente de discórdia e intolerância. Outros há, enfim, que sofrem com guerras injustas e desiguais.

O mundo é um lugar problemático, mas o Brasil é um caso à parte. Ao contrário da maioria dos países, temos uma imensidade de recursos econômicos, não sofremos de restrições geopolíticas, temos uma relativa unidade cultural e, no entanto, quase toda nossa população vive em estado de pobreza ou pouco mais que isto. Ainda assim, está dito que nossas instituições estão funcionando normalmente.



Não há uma explicação única para o fato de que alguns países conseguiram progredir a ao mesmo tempo distribuir a riqueza para a maior parte de sua população, enquanto outros não se desenvolveram, ou quando o fizeram, concentraram a riqueza em uma minoria, o que acabou por limitar o próprio crescimento.

Dois autores americanos, Daron Acemoglu e James Robinson, propõem que a explicação está na natureza das instituições do país. Há instituições que são do tipo inclusivas, e como tais eles classificam as que protegem a propriedade privada, a economia de mercado e a liberdade econômica. O seu oposto são as instituições chamadas de extrativas, que são as que concedem o domínio contínuo do Estado e da economia a pequenas elites, que usam os instrumentos de poder em seu proveito.

É difícil encontrar a classificação correta para as nossas instituições. Temos uma experiência de sucesso em vários setores, como é o caso do agronegócio, do setor de energias renováveis, de algumas empresas de ponta na área industrial, além de um setor financeiro sofisticado e seguro.

De outro lado, a maioria da população é pobre e vive muito mal. A educação pública, a via mais curta para o progresso desta população, fracassou em todos os testes internacionais. Não temos segurança pública, nem na cidade nem no campo. O Estado brasileiro parece que desapareceu, deixando conosco só os cobradores de impostos. A conclusão mais razoável é que o que não está funcionando no país é o Estado e suas instituições, pelo menos não para o conjunto da população.

O enigma da falta de crescimento e da pobreza se decifra na resposta à indagação de para quem funcionam as instituições. Elas funcionam prioritariamente para as elites políticas e burocráticas que dominam e controlam o Estado. As leis do país estabeleceram um estado de coisas em que a alternância do poder é puramente nominal. Qualquer que seja o resultado das eleições, que muitas vezes vem carregado com o desejo de mudança, as elites do poder continuam praticamente as mesmas.

A maioria parlamentar não tem conexão com a maioria apurada na eleição majoritária e os termos da governação do país são estabelecidos depois das eleições, sem a audiência da população. A única coisa que muda de um governante a outro é o colorido da retórica, o resto é sempre igual. O poder é compartilhado pelos mesmos grupos, num grande condomínio, no qual o interesse público participa com pouca voz e nenhum voto.

Instituições democráticas perduram pela força, pelo medo ou pelo livre consentimento da população. No Brasil hoje, a percepção popular é que as instituições funcionam para proteger os poderosos. Os fatos demonstram que a realidade não está muito longe disto.

 

 

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