O Brasil está acostumado a uma vida de dificuldades e de tumulto, mas o que nos espera no ano que vem deve passar bastante das medidas. Para tornar tudo mais difícil, não temos o recurso de um governo com a vontade e o poder de agir à altura dos problemas, nem lideranças políticas com a lucidez e a integridade que seriam necessários.

 

 

O primeiro choque a que estaremos expostos vem do exterior. O novo governo americano vem disposto, e tem o poder para isto, a demolir a ordem internacional liberal e descartar as instituições do multilateralismo, o que tem o potencial para transformar o mundo numa selva, onde só a força e o poder prevalecem.

 


Apesar de todas as suas imperfeições e suas assimetrias, o sistema internacional constituído após a Segunda Guerra impediu grandes conflitos generalizados e criou um ambiente de segurança jurídica que permitiu o livre comércio e a globalização. Sua desconstrução sem que haja uma ordem alternativa para o seu lugar vai criar um vazio institucional que tornará o mundo um lugar mais perigoso, mais vulnerável e mais pobre.

 

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A cooperação, indispensável para se lidar com as mudanças climáticas, as pandemias e os direitos humanos, vai dar lugar à competição, como ideia força a determinar a convivência entre povos e nações. Num mundo como este, o Brasil não tem como projetar seus interesses e vai ter que se adaptar a uma nova geoeconomia, mesmo a contragosto.


O governo americano vai impor unilateralmente tarifas a todas as suas importações, violando as regras do comércio internacional penosamente construídas em décadas de negociações, com a intenção de barganhar vantagens caso a caso de cada país. Promete taxar em 60% todas as importações provenientes da China, cujo valor em 2024 excedeu a casa dos US$ 400 bilhões, causando um terremoto às economias da China e dos Estados Unidos, que se tornaram altamente interdependentes.

 

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Mesmo situado à margem das turbulências econômicas que se anunciam, a desorganização dos mercados e das regras do comércio internacional vão nos expor a grandes desafios. O desvio de comércio da China pode resultar numa invasão de produtos industriais em nosso mercado interno, capaz de abalar nosso parque industrial já tão fragilizado. Como nos defender da China quando ela é responsável por 40% das nossas exportações e é o principal destino das vendas do agronegócio. Seremos capazes de enfrentar toda estas novas realidades com um ambiente interno tão dividido politicamente?


Por falar no plano interno, temos ainda os problemas que nós próprios criamos. O governo Lula está encaminhando o país para uma crise semelhante a que nos foi legada pelo governo Dilma em termos de endividamento. O populismo fiscal do governo nos seus dois primeiros anos já causou um aumento de 8 pontos percentuais na relação Dívida/PIB, de 71,8% em janeiro de 2023 para 80% em dezembro de 2024. As projeções indicam que esta relação estará em torno de 86% no final de 2026, uma elevação de 14 pontos em um mandato de 4 anos. A busca da popularidade e a ambição de um novo mandato parecem ser os únicos objetivos do governo, mesmo diante dos grandes problemas que estão à nossa frente.

 

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O programa de ajuste fiscal proposto neste final de semana é quase insignificante diante do tamanho do problema fiscal e da sua percepção pelos mercados. Apesar disto o Ministro da Fazenda só pode apresentá-lo com a condição de prometer a isenção do Imposto de Renda até o limite de R$ 5 mil por mês, o que em si mesmo custará mais que os cortes anunciados, ou seja, não há ajuste nenhum.


Diante dos ventos contrários que vem de fora, da grande desorganização da economia internacional que certamente ocorrerá, o Brasil precisaria de um governo que tivesse menos apego ao poder e que buscasse a todo o custo uma pacificação política verdadeira, que nos habilitasse a resistir unidos aos riscos que nos ameaçam e que preservasse nossa economia para um crescimento que se sustente. Apenas vencer eleições é um pobre legado. 

 
 
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