Refletindo sobre o passado e sua influência em minha percepção atual, às vezes me ocorre rever fotografias de quando tinha uma ou duas décadas a menos e encontrar ali uma mulher maravilhosa e deslumbrante em cada detalhe: na roupa, no gesto, na delicadeza e na sensualidade. Mas o que mais me espanta é que quando eu vivia naquela época, naquele momento em que a foto foi tirada, não me sentia como me vejo na foto agora.


É comum a ideia de que, à medida que envelhecemos, começamos a nutrir uma admiração mais profunda por quem éramos em momentos anteriores de nossas vidas. Isso talvez explique, em parte, a razão pela qual vejo-me bonita nas fotos antigas. Contudo, acredito que há algo mais nessa beleza que vejo hoje: sinto que gostaria de abraçar aquela moça insegura, que tinha muito mais como objetivo satisfazer as expectativas alheias do que buscar sua própria satisfação.

 



 


A influência das expectativas alheias moldava profundamente minha autopercepção, de modo que a insegurança da juventude e a incapacidade de me enxergar em toda a minha potencialidade eram fruto do alto valor que dava ao “olhar do outro”. Quanto mais jovens, mais susceptíveis estamos às influências desse “olhar do outro” que, por meio da sociedade e da mídia, impõem padrões de beleza e sucesso inatingíveis para a maioria de nós, pessoas comuns.


Neste contexto, esse "olhar do outro" foi muito bem explorado por Jean-Paul Sartre. Segundo o autor, o “olhar do outro” pode moldar como formamos nossa autoimagem, muitas vezes nos fazendo adotar uma identidade mais alinhada às expectativas sociais “dos outros” do que à expressão de nossa autenticidade.


Quando vivemos pelo “olhar do outro”, nossa existência não é validada por meio de uma introspecção verdadeira sobre quem somos, mas sim fruto do julgamento externo, ou seja, daquilo que os outros esperam de nós. E não pode haver uma vida mais inautêntica do que esta, pois tentando alcançar padrões inalcançáveis estamos sempre insatisfeitos conosco mesmos, e isso faz com que nossas conquistas e beleza, evidente nas fotos, sejam obscurecidas.


À medida que amadurecemos, tendemos a questionar esses padrões e a nos libertar, permitindo aflorar em nós aquilo que Sartre chamou de “ser para si” – que é um estado em que deixamos de nos preocupar de modo excessivo com o que os outros esperam ou pensam de nós e nos voltamos para nossa essência, em busca daquilo que verdadeiramente nos faz bem.


É muito bom perceber que hoje, ao revisitar minhas fotografias, consigo reconhecer a beleza que antes me escapava. Compreendo também que há um processo laborioso para nos tornarmos mais autênticos e nos livrarmos, tanto quanto possível, do peso do “olhar do outro”. Aquela jovem que vivia para ser reconhecida, cuidada e amada a qualquer preço, cuja existência era moldada pelo “olhar do outro”, precisa aprender diariamente a ir cedendo espaço para a mulher que tenta olhar com coragem para dentro de si para compreender os próprios anseios, faltas e alegrias.

 

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