Em nossas sociedades modernas, há uma crença amplamente difundida de que a felicidade é uma meta a ser alcançada individualmente. Essa visão, ao contrário de promover o bem-estar coletivo, frequentemente pode se tornar uma obsessão pessoal, compartilhada apenas na medida em que a felicidade do outro não coloque em risco a nossa própria. Apesar da busca intensa pela felicidade, os meios para alcançá-la parecem cada vez mais inalcançáveis. Isso resulta muitas vezes em efeitos adversos, como a depressão e os transtornos de ansiedade.

 

 

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil destaca-se como o país com a maior prevalência de depressão na América Latina, sendo também o segundo das Américas, logo atrás dos Estados Unidos. Estima-se que cerca de 9,3% da população brasileira sofra de transtornos de ansiedade, enquanto 5,3% enfrentam depressão. Os números são alarmantes e indicam uma crise social de saúde mental que não pode ser ignorada.

 



 

Pela primeira vez publicada em 1955, a obra do filósofo social e psicanalista Erich Fromm, Psicanálise da Sociedade Contemporânea, parece mais atual do que nunca. Fromm investigou o que realmente constituiu a saúde mental em sociedades marcadas pela alienação e pelas pressões do capitalismo moderno. Ele argumenta que a verdadeira sanidade mental não se limita à ausência de doenças mentais, mas envolve, acima de tudo, a capacidade que temos de viver de forma autêntica, equilibrando as nossas próprias necessidades com a harmonia social.

 

 

Para Fromm, a saúde mental é alcançada quando cada um de nós pode realizar plenamente seu potencial humano. Isso inclui a capacidade de amarmos, de sermos criativos, de desenvolvermos relações saudáveis e de atuarmos de maneira produtiva na sociedade. Ele defende que uma sociedade sã é aquela que promove o desenvolvimento individual, em consonância com as necessidades coletivas, permitindo que as pessoas realizem seu potencial criativo e vivam em comunidades baseadas no amor e na solidariedade, de modo que, para o autor, a realização pessoal estaria diretamente conectada à vida em comunidade.


 

Embora o modelo de sociedade proposto por Fromm tenha certo caráter utópico, ele deve servir como um ideal para avaliarmos o quão distante estamos desse conceito de sanidade coletiva. Segundo Fromm, vivemos imersos em sociedades que promovem valores que, em vez de nos libertarem, nos alienam de nossa verdadeira essência. O individualismo exacerbado da sociedade moderna nos conduz ao isolamento e à alienação. Para Fromm, a felicidade genuína não pode ser alcançada em uma busca egoísta por prazer, mas sim através da conexão verdadeira com os outros.

Ele critica o foco de nossas sociedades contemporâneas no consumo, na competitividade e na conformidade passiva. Esses valores, segundo Fromm, levam a uma patologia social em que a saúde mental é frequentemente sacrificada em nome da adaptação a normas desumanizadoras. Sob essa perspectiva, nos tornamos meros instrumentos de produção, perdendo o contato com as nossas necessidades mais profundas e deixando para segundo plano a possibilidade de viver uma vida realmente dotada de significado profundo.

A realidade é que, quanto mais buscamos a felicidade nos lugares errados, guiados por ideais de consumo e competitividade, mais nos tornamos vulneráveis à tristeza e à ansiedade. Fromm esboça as causas dessa crise, que é indiscutivelmente mais profunda do que aparenta. Contudo, é crucial que, diante desse diagnóstico, reflitamos sobre as ações necessárias para reverter essa tendência que nos conduz para um sentimento de frustração diante da vida.

Creio que o texto de Fromm nos coloca para questionar as bases da busca moderna por felicidade, nos desafiando a reconsiderar as normas de consumo, a competitividade e o individualismo que atualmente norteiam nossas vidas comunitárias. Para ele, o verdadeiro caminho para a saúde mental e para a felicidade reside na construção de laços genuínos e no equilíbrio entre o “eu” e o “nosso”, uma vez que ninguém é feliz sozinho.

compartilhe