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Juraciara Vieira Cardoso
Juraciara Vieira Cardoso
Professora da Universidade Federal de Lavras, graduada em Direito, mestre em Direito Constitucional e doutora em Filosofia do Direito
COLUNA VITALidade

A Tecnologia nos desumaniza?

'A tecnologia prometeu facilitar nossas vidas, mas o que se observa é o contrário. Estamos sempre correndo, sempre conectados, incapazes de nos desconectar'

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Para muitos de nós que nascemos em décadas passadas, a percepção é a de que o mundo está sendo dominado pela tecnologia. São computadores, smartphones e uma infinidade de dispositivos conectados, que buscam moldar nossa rotina e nos dizer o que devemos ou não devemos fazer. Não sou uma pessoa contrária à tecnologia, pois é inegável que ela nos trouxe inúmeros benefícios, no entanto, o que às vezes percebemos é que ela está influenciando um pouco a noção daquilo que significa ser um humano.


Há muito pouco tempo atrás, nossas conversas eram reais e nossos encontros genuínos. Aconteciam na praça, no bar ou em casa. O telefone, à época, era um luxo, usado apenas para conversar, e não estava à disposição de todos. Os smartphones, projetados para nos manter cada vez mais conectados, nos oferecem hoje uma quantidade imensa de “amigos” nas redes sociais, mas não nos aproximam deles verdadeiramente. Uma relação profunda não pode se alicerçar apenas em mensagens de texto. Ela precisa do encontro, do toque, da conversa fiada, do papo sério e das fofocas.

 


Quando precisávamos de emprego, eram pessoas reais que nos avaliavam, mas hoje não é mais assim. Há softwares especializados em fazer análise de currículos, que tem por finalidade decidir se seguimos ou ficamos no processo seletivo. A capacidade perceptiva do avaliador, que deveria fazer uma análise na qual considera também nossa humanidade, foi substituída por um algoritmo que define os que têm valor daqueles que não tem, segundo propósitos definidos por seus criadores no momento de sua alimentação.

 


E no momento em que somos finalmente contratados, a vigilância se torna constante, por meio de softwares que monitoram o quanto estamos produzindo, se nosso desempenho é suficiente se comparado ao de outros colegas ou medindo o tempo que gastamos para executar as tarefas. A métrica pela qual nosso desempenho é avaliado desconsidera o impacto de um dia ruim ou a importância das trocas que acontecem nas pausas para o café, inclusive em termos de produtividade. O trabalho, que para muitos pensadores é um dos pilares para construção da nossa identidade, vai se tornando um sistema que às vezes desumaniza as pessoas


E não é apenas no trabalho que isso acontece. A tecnologia tem redefinido o valor humano em todos os âmbitos. Agora somos classificados por números: quantos seguidores temos, quantos amigos acumulamos, quantas curtidas recebemos. Essas estatísticas, que deveriam ser irrelevantes, passaram a ditar nossa importância no mundo. O resultado é uma pressão insuportável para corresponder a padrões virtuais que pouco dizem sobre quem realmente somos ou sobre quem aquelas pessoas são.

 


O impacto também é evidente na forma como nos relacionamos com o tempo. A tecnologia prometeu facilitar nossas vidas, mas o que se observa é o contrário. Estamos sempre correndo, sempre conectados, incapazes de nos desconectar. As notificações não param, os prazos se acumulam, e a sensação de nunca fazer o suficiente se tornou constante. E tudo isso em nome do quê mesmo?


Quando olhamos para essa realidade fica em nós uma sensação de estranheza e o questionamento sobre como será nosso futuro em um mundo no qual a tecnologia prevalece, muitas vezes em detrimento ao humano. Não tenho a pretensão de encontrar uma resposta definitiva, mas penso que talvez, parte dela esteja em buscarmos nos conectar de modo intencional àquilo que nos conecta a nossa humanidade: as conexões verdadeiras, a empatia, a criatividade e a capacidade de nos reinventarmos. Talvez seja o momento de avaliarmos os impactos da tecnologia nas nossas realidades, nos lembrando de que antes de qualquer dispositivo, somos histórias, somos encontros e somos sonhos. E isso, nenhuma tecnologia pode replicar...

 

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