Além de peças locais, a agenda cultural do fim de semana em Belo Horizonte registra, também, a estreia do monólogo “Hannah Arendt – Uma aula magna”, do ator, diretor e autor carioca Eduardo Wotzik.
A montagem, que já passou por Curitiba, Niterói e Rio de Janeiro, se desenvolve a partir de pensamentos e experiências dessa que foi uma das mais importantes intelectuais do século 20. O espetáculo entra em cartaz nesta sexta-feira (24/11) e cumpre temporada até o dia 18 de dezembro, no Teatro II do CCBB-BH.
Wotzik conta que o monólogo começou a tomar forma em 2019, na esteira de outro monólogo, “Missa para Clarice”, no qual refletia sobre fé e as questões do sagrado, e com o qual tinha rodado o país, totalizando mais de 400 apresentações. Ele diz que a montagem o fez pensar em, com um novo espetáculo, seguir uma linha temática a partir de um determinado autor. O mote veio de imediato: a educação.
“Hannah Arendt (1906-1975) veio puxar meu pé. Ela falou: 'Agora não é mais Emily Dickinson, não é mais Nelson Rodrigues e não é mais Clarice Lispector; agora sou eu'. Ela me trouxe muitas questões, como a experiência da banalidade do mal e do homem comum. Principalmente, me abriu a ideia da construção do pensamento, da diferença entre educar e ensinar”, diz.
MEDIOCRIDADE E IGNORÂNCIAS
Nesse conjunto de ideias, ele conta que acabou tomando, por antítese, a mediocridade e “as ignorâncias” como questões centrais no texto que é dito em cena. “É uma forma de refletir sobre por que chegamos nesse estado de coisas, com a iminência do fascismo. Eu tinha pressa de fazer. Depois, o que aconteceu no mundo é que o fascismo ganhou rosto, a massa silenciosa ganhou rosto. Hoje, sinto que o perigo não é mais iminente, ele é permanente. Vivemos tempos em que tudo se resolve na base da ignorância”, comenta.
Ele observa que a dramaturgia é 100% autoral – não há transcrições literais de Hannah Arendt compondo o texto. “Ela nunca escreveu para teatro, então o que fiz foi me apropriar das ideias e pensamentos dela, desenvolvendo isso numa linguagem cênica”, afirma. Wotzik ressalta, ainda, que o texto de sua autoria não é acadêmico, nem metafórico e tampouco complicado.
“Pelo contrário, é um papo reto, para o entendimento de qualquer ser humano; não precisa consultar os universitários, é popular e objetivo, quase um stand up de Hannah Arendt. Ao mesmo tempo, é surpreendente e divertido, porque pensar é muito divertido, talvez seja a coisa mais barata e prazerosa que existe. Além de ter uma liberdade absoluta, o texto estimula mesmo a valorização do pensamento – algo que estamos nos esquecendo de usar”, salienta.
O artista carioca diz que a montagem ainda está começando sua trajetória e que, portanto, ainda tem muito o que aprender com o público que se dispõe a comparecer. Ele observa que o fato de começar a ter sido gestado pouco antes da pandemia lhe conferiu, depois de pronto, um caráter peculiar, mais intimista. Wotzik diz que o isolamento social imposto pela crise sanitária representou um período de imersão.
“O autor, o produtor, o figurinista e o cenógrafo mais próximos eram eu mesmo. No contexto da pandemia, me propus a não ser morto pelo fascismo, então acho que saí daquele período com minha arte mais viva e forte do que nunca. Como dizia o (cantor e compositor) Ednardo (na música “Pavão misterioso”), 'eles são muitos, mas não sabem voar'. Não ia deixar ninguém matar minha arte. 'Hannah Arendt – Uma aula magna' é uma resposta minha àquilo tudo que vinha acontecendo”, ressalta.
O artista afirma que, do alto de sua experiência de mais de 40 anos dedicados ao teatro, não é mais um romântico, no sentido de achar que a arte pode transformar a humanidade. “Mas a verdade é que acordo todo dia de manhã, dou uma entrevista, escrevo um texto e, de repente, já estou crendo nisso. A gente pode trabalhar uma fatia de público, abrir espaços, janelas para essas pessoas, justamente estimulando o pensamento e a reflexão. Essa é a nossa missão e não podemos perder a fé nela”, afirma.
>>> “HANNAH ARENDT – UMA AULA MAGNA”
Com Eduardo Wotzik, nesta sexta (24/11), sábado e domingo, às 20h, no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). A peça fica em cartaz até o dia 18/12, com apresentações de segunda a sexta, sempre às 20h (haverá bate-papo com o ator e diretor após as sessões dos dias 2 e 16 de dezembro). Ingressos a R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia), à venda no site do CCBB na bilheteria do teatro.