"Menino branco", do artista Amazônia, O Abstrato, será exibido hoje, na abertura do festival

crédito: Bin Zhang/Divulgação

Não havia "imagem inocente" para o cineasta e artista Harun Farocki (1944-2014). Em suas videoinstalações, o alemão abordava a representação do trabalho humano, procurando fazer uma espécie de etnografia do cotidiano econômico de diversos países.

Um dos principais exemplos talvez seja “Capital de risco” (2004), destaque da edição deste ano do Festival de Arte Eletrônica de Belo Horizonte (TIMELINE BH), em cartaz a partir desta quarta-feira (13/12) até sexta, no Centro Cultural Unimed-BH Minas.

Na obra de Farocki, que será exibida em sessão especial no último dia do evento, um engenheiro precisa de dinheiro para desenvolver e lançar sua nova invenção, um sensor de movimento giratório indicado para os carros de corrida e gruas.

Ele recorre a um empresário que trabalha com capital de risco (investimento em ações de empresas que não estão listadas na bolsa de valores), mas que exige juros altos e participação nos lucros do negócio. É a negociação entre as duas partes o que interessa a Farocki. “Capital de risco” se concentra nessa busca por um acordo entre os dois homens.

“Farocki é um cara que tem uma produção muito curiosa, muito interessante. E, por mais que tenha passado o tempo - estamos em 2023, afinal -, ainda é difícil ver os filmes dele”, comenta Sávio Leite, um dos idealizadores e curadores do festival. Também assinam a curadoria Joacélio Batista, Ana Moravi, Sara Não Tem Nome, Cláudio Santos, Francesca Leoni e Alê Amazônia.

Cena do filme "Sunset fever"

Cena do filme "Sunset fever", de Randolpho Lamonier e Victor Galvão

Randolpho Lamonier/Divulgação 

PRODUÇÃO NÃO HEGEMÔNICA

O TIMELINE BH, no entanto, não vai se limitar à técnica e estética do artista alemão. Firmando-se na ideia de ser um festival que concentre uma produção cinematográfica não hegemônica, a programação deste ano conta com exibições de obras chinesas na mostra “China tropical”; italianas em “IBRIDA - Festival Delle Arti Intermediale”; e do Brasil, Portugal, Grécia, Alemanha e Japão na mostra “Olhares plurais”.

São filmes singulares e com pouquíssimas semelhanças entre si, como é o caso do chinês “Menino branco”, de Jie Cheung; e do grego “Womanifesto I”, de Efi Spyrou.

Enquanto o primeiro é o videoclipe do single de estreia do primeiro álbum de estúdio do artista brasileiro Amazônia, O Abstrato; o segundo é um filme-manifesto em mosaico, que une as vozes de 15 mulheres artistas gregas de diferentes culturas, gerações e disciplinas criativas no intuito de debater o papel da mulher na sociedade.

Há espaço ainda para obras de caráter mais experimental, como “Sunset fever”, dos brasileiros Randolpho Lamonier e Victor Galvão. Onírico, o curta defende que a “febre do pôr-do-sol” é chegar ao final de dias difíceis com a certeza e a esperança de que um novo amanhecer virá.

“(Essa diversidade na estética dos filmes) É uma forma diferente de contar histórias através de imagens, além de ser uma tendência da videoarte”, diz Leite. “Nem todo mundo compreende, gosta, mas a gente acha importante fazer um festival desse tipo em uma cidade específica como Belo Horizonte, porque aqui tem público e até mesmo uma escola não formal de videoarte”, observa.

A capital mineira, de fato, tem uma tendência para a videoarte, sendo, inclusive, berço de importantes artistas da chamada segunda geração da videoarte no Brasil, entre as décadas de 1980 e 1990.

Foi em Belo Horizonte, por exemplo, que Eder Santos, Lucas Bambozzi, Rodrigo Minelli, Vannessa Tamietti, entre outros, passaram a lançar mão da tecnologia do vídeo no intuito de fazer experimentações estéticas.

Foi também em Belo Horizonte que foram organizados os primeiros festivais do gênero, como o Fórum BHZ Vídeo, que, na década de 1990, se transformou em ótima vitrine para videoartistas brasileiros e estrangeiros, que vinham participar do evento.

“Na época, esse festival contribuiu muito para a nossa formação. Foi por causa dele que tivemos a oportunidade de ver filmes de muitos artistas que sequer conhecíamos. A ideia do TIMELINE, portanto, é dar uma continuidade na movimentação dessa cena”, afirma o curador.

Programação

. Quarta-feira (13/12), às 19h:
Abertura (Mostra China Tropical) com exibições de “Menino Branco”, de Jie Cheung; e “China Tropical - Ponta a pé”, de Alê Amazônia
Quinta-feira (14/12), às 17h:
Mostra “IBRIDA - Festival Delle Arti Intermediale”, com exibições dos curtas "Gente comune", de Filippo Berta; "The divine way", de Ilaria di Carlo; "Recitative", de Shir Handelsman; "Ymor", de Junien Lahmi; "Black summer", de Felix Dierich; e "Rage", de Katherina Sadovsky
Quinta-feira (14/12), às 19h:
Mostra Olhares Plurais, com exibições de "16x09", de Leoni Pokuta; "The stream XII-II”, de Hiroya Sakurai; "Quando chorei e quase fiz nascer nascente", de Maria Mendes; "Vade ultra", de Carlos Magno Rodrigues; "Invasion", de Margarida Paiva; "Sunset fever", de Randolpho Lamonier e Victor Galvão; “Womanifesto I”, de Efi Spyrou; e "Lumens", de Muriel Paraboni
Sexta-feira (15/12), às 19h:
Sessão especial com exibição de “Capital de risco”, de Harun Farocki

FESTIVAL DE ARTE ELETRÔNICA DE BELO HORIZONTE
Desta quarta-feira (13/12) a sexta-feira (15/12), a partir das 19h; na quinta (14/12), a partir das 17h. No Centro Cultural Unimed-BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Entrada franca. Informações e programação completa no site da mostra.