“Abram alas pro rei/ Ô/ Abram alas pro rei/ Ô/ Me considero assim, pois só ando entre reis e rainhas”. Os versos de “Hat-trick”, sucesso do álbum “Ladrão” (2019), dão bem a ideia da abertura do show de Djonga, na sexta-feira (19/1). Empolgadas, quase 5 mil pessoas presentes no Arena Hall, na Savassi, sentiram o chão tremer.
Uma hora antes, o espaço começou a lotar, com abertura do portão às 21h e show à meia-noite, marcando a estreia da turnê nacional do disco “Inocente ‘demotape”, lançado em outubro de 2023.
Com ingressos a R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia), esgotados esta semana – “preço popular”, como o artista fez questão de ressaltar –, Djonga, de 29 anos, mostrou ali por que é um dos artistas mais brilhantes do rap nacional. E da música brasileira.
O “menino do São Lucas”, cria do Aglomerado da Serra, subiu ao palco 15 minutos atrasado. Com as cortinas tampando o palco, a multidão não poderia imaginar o que a aguardava: balé completo e cenografia caprichada, algo muito diferente das turnês anteriores do rapper.
A primeira canção da noite foi “5 da manhã”, faixa de abertura de “Inocente ‘demotape”. Ali, já dava para sentir o clima. Em cima da cama, no centro do palco, Djonga deu início ao show com uma canção romântica.
Logo, os artistas de sua lista expressiva de convidados passaram a acompanhá-lo. Lisboa, cantor d'AQuadrilha, produtora de Djonga, emprestou sua voz ao maior sucesso do novo álbum até agora: “Da lua”, parceria com Veigh.
Companheiro desde sempre de Djonga, Coyote Beatz emprestou seu talento ao show, embora, desta vez, não tenha assinado os beats do novo disco do amigo.
Rap pagodeiro
Para surpresa geral, a versão pagodeira de "da lua" canção soou bem aos ouvidos da multidão, que cantou ainda mais alto em resposta. Na sequência, mais artistas apadrinhados por Djonga subiram ao palco.
DougNow e Zulu, jovens promessas da produtora A Quadrilha, o acompanharam em “Coração gelado”, parceria com Tz da Coronel. O público viu surgirem no cenário o sorvete derretido – presente na capa do disco, inspirada no álbum “Perfect angel”, de Minnie Riperton – e o coração de gelo.
Laura Sette e Iza Sabino, que abriram a noite no Arena Hall acompanhadas de DJ Kingdom, voltaram, agora no cenário que remetia a uma praça. Cantaram “Fumaça” com Djonga.
Em “Camarote”, uma dezena de amigos subiu ao palco para comemorar o sucesso do rapper, como diz a letra. Jorge, de 6 anos, primogênito de Djonga, entrou na garupa de uma moto. Cantou e pulou ao lado do pai e dos “tios”.
Com a presença do herdeiro, Djonga voltou ao passado e cantou “O menino que queria ser Deus”, faixa de seu álbum homônimo de 2018, responsável por colocá-lo no mapa dos artistas mais relevantes do país.
Vieram, então, os hits, o que agitou ainda mais o mar de gente que se preparava para o “bate cabeça” tradicional dos shows de Djonga. Cantou “Junho de 94” e se mostrou romântico em “Penumbra”, com participação especial de Sarah Guedes.
Seguiram-se “Leal”, maior sucesso de “Ladrão” (álbum de 2019), e “Solto”, com participação da dupla Hot e Oreia. Nova surpresa: esta dupla havia se separado em 2021, mas ressurgiu agora.
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Sidoka, Hot e Oreia (juntos!)
“Geminiano” veio com solo de guitarra. Ele também lembrou os discos “Histórias da minha área” (álbum de 2020), com “Hoje não”, e “Heresia” (de 2017), com “Santa ceia”. Outra surpresa aguardava os fãs de rap: a dupla mineira Hot e Oreia, que se desfez em 2021, se apresentou com Djonga em "Solto".
“Conversa com uma menina branca”, letra forte sobre o racismo, chegou sob luzes que se alternavam de azul para vermelho, como nas viaturas de polícia.
Sidoka entrou no palco emocionado, abraçando Djonga. “Muito barulho para o cara que ajudou a realizar meu sonho”, disse o astro mineiro do trap.
Djonga mostrou que não domina apenas o rap. Cantou funk com MC Saci. Emendou com trechos de sua autoria no medley “Poesia acústica”.
Depois, fez com que o Arena Hall se emocionasse com “Procuro alguém”, faixa em homenagem ao nascimento da caçula Iolanda, de 4 anos. Usando camiseta maior do que ela, a garotinha curtiu o espaço do palco, correu atrás do pai e gritou para a plateia: “Eu amo vocês”.
Na arquibancada, o universitário Rafael Souza, de 24 anos, se emocionou com a cena. Natural de Arujá, em São Paulo, ele nunca havia visto Djonga de perto. “Depois que me mudei para BH, infelizmente não tive condições financeiras de ir aos festivais com o Djonga. 'Ladrão' (disco) foi o meu melhor amigo em um momento muito difícil da minha vida. Tive a oportunidade de vir de última hora e não consigo descrever a emoção de estar aqui, em um show só dele”, contou.
“Vocês são foda!”
Emocionado, o rapper agradeceu à plateia. Afirmou que a nova turnê é um projeto pessoal construído com o apoio dos fãs. “Vocês são foda! Fizemos o show do nosso próprio bolso para vocês. Nenhuma marca quis fechar com nós, agora tá mais caro também, o preço aumentou”, avisou.
E cantou seu rap icônico, “Olho de tigre”. Desceu para a pista e se juntou aos fãs no grito de guerra do refrão: “Fogo nos racistas”.
Djonga terminou a noite ao lado de outro grande do rap nacional, o carioca BK, que veio a Belo Horizonte prestigiar o amigo. Em coro, os dois gritaram: “O mundo é nosso”.
Tudo ali foi pura emoção. Bailarinos dançaram, luzes piscaram e as crianças corriam pelo palco. Quando elas saíram, Djonga voltou com “Bença”, homenagem à avó, dona Maria Eni, de 87 anos. Depois de 130 minutos de apresentação, o “neto coruja” fechou a noite com a oração da matriarca.
Ouviu-se, então, a voz de dona Maria: “Que são todos filhos de Jesus, gemendo e chorando tem uma cruz. Que é o Pai, é o Filho e o Espírito Santo. Que Deus dê saúde a Gustavo pra poder continuar nesse lindo serviço maravilhoso que tá prestando pra todos nós. Em nome de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo. Que Deus ilumine o caminho de todos”.
* Estagiária sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria