Daniela Mercury, uma das cantoras mais respeitadas da música brasileira, chega às quatro décadas de carreira. Voz importante do carnaval, a baiana, de 58 anos, leva sua arte para além dos palcos. Defensora de bandeiras da comunidade LGBTQIAP+ (é casada com a jornalista Malu Verçosa desde 2013) e atenta a questões sociais que desafiam o país, ela diz, nesta entrevista ao repórter Pedro Ibarra, que neste “momento histórico” artistas se unem “para afirmar a força e a importância da cultura para o Brasil e o mundo”. No início do mês, Daniela Mercury participou da 4ª Conferência Nacional de Cultura, que, segundo ela, resgatou o “respeito aviltado” aos artistas, após o “desmonte intencional” do setor por parte dos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
No início deste mês, você fechou o festival de música da 4ª Conferência Nacional de Cultura, realizada em Brasília. Qual é a importância de fazer parte desta celebração?
É um momento histórico. Nos reunimos para a retomada do setor cultural, que ressuscita do desmonte intencional promovido nos últimos dois governos. Esse é um espaço crucial para afirmar a força e a importância da cultura para o Brasil e o mundo. A 4ª Conferência Nacional de Cultura resgata o respeito aviltado. Nos oferece a oportunidade de repudiar a agressão antidemocrática ao movimento cultural, para que a gente nunca esqueça e o mal não se repita. Num momento como este, é muito importante ter um parceiro forte como o Banco do Brasil apoiando a cultura, no momento histórico em que temos uma mulher, Tarciana Medeiros (presidente do BB), gestora e apoiadora da cultura brasileira.
O país voltou a discutir cultura com mais afinco recentemente. Como percebe esse movimento?
A conferência é o fórum para reconstruir os pilares fundamentais de nossa cultura e avançar. Nela, reafirmamos a liberdade de expressão, de criação e de reunião. Clamamos por segurança jurídica para criar e empreender. Também reivindicamos garantias de que o setor terá o financiamento adequado e o apoio estatal que a Constituição lhe assegura – e todo setor produtivo brasileiro deve receber. Estamos juntos para exigir respeito da sociedade e apoio do povo brasileiro, pois o governo do presidente Lula compreende a importância da cultura em todos seus aspectos. E temos uma excelente ministra da Cultura. Margareth Menezes está empenhada em revolucionar o setor. Ela está unindo o Brasil e, por meio da contribuição de todo o país, está criando mecanismos fundamentais para ampliarmos a formação de público e o apoio à cultura.
Você está alinhada com pautas da comunidade LGBTQIAP+ e também com discussões cruciais sobre questões sociais brasileiras. Qual a importância de usar a sua voz e o seu palco?
Cada mulher que se impõe nos liberta!. Para conquistar direitos, precisamos de todos que têm coragem. Temos de somar inteligências, ter organização, nos manifestarmos sobre temas que nos dizem respeito e por causas coletivas. Lutar por avanços e para evitar os retrocessos. Como artista, uso a minha credibilidade e proximidade com o público para falar de temas importantíssimos e gerar reflexão e ação. Somo minha voz à de muitas brasileiras e brasileiros para transformar o Brasil em um lugar mais democrático e justo na prática. Em toda a história da humanidade, só conquistamos avanços com muito barulho e protesto. E há muito o que conquistar para as mulheres e minorias políticas.
Você tem agenda cheia, seus shows vêm recebendo elogios. Como manter o padrão de qualidade por tantos anos?
O palco e o estúdio são meus lugares preferidos. Eu me reinvento constantemente, criar é necessidade pessoal. Sinto necessidade de cantar o que dialoga com o tempo presente. Minhas ideias escritas e cultivadas todos os dias movem a minha existência. Tento colocá-las em prática. Os meus 24 álbuns expressam meu compromisso com a arte, a inovação e os direitos humanos. Componho continuamente músicas, arranjos, coreografias e roteiros. Faço um roteiro diferente para cada show. Faço intervenções artísticas no trio elétrico em cada carnaval. Quando estou no palco, eu faço cada show como se fosse o último e o primeiro.
Há algum lançamento para breve?
Recentemente, lancei o projeto audiovisual “Eu sou o carnaval”, sobre o trio elétrico nos carnavais da Bahia e de São Paulo. Estou com duas turnês na estrada: “Oxente acústico”, em que divido o palco com meu filho, Gabriel Mercury, cantor, compositor, músico e produtor cultural, e o show “Baiana”, em que celebro meus 40 anos de carreira. O próximo projeto é a gravação ao vivo do “Oxente”. Também estou pesquisando para meu próximo álbum.