Paulo Nazareth é um artista valadarense de 47 anos radicado no Palmital, conjunto habitacional em Santa Luzia, na Grande Belo Horizonte. Esta seria uma definição stricto sensu de um dos mais prolíficos e reconhecidos artistas mineiros contemporâneos. Em sentido mais amplo, Nazareth é um autor que atua em diferentes suportes que vive e trabalha pelo mundo.
É esse caminhar constante – do artista e de sua própria obra – que Inhotim procura apresentar em sua primeira exposição dedicada a Nazareth. Inaugurada neste fim de semana, a mostra “Esconjuro” extrapola, em muito, os limites da Galeria Praça.
Exposição realizada totalmente na base da “negociação”, como explicou a curadora Beatriz Lemos, mostra o “lugar consonante entre teoria e prática de ser artista. É viva e dinâmica, assim como o gesto de caminhar”, ela disse.
“Esconjuro” ficará em cartaz por 18 meses. Mas a exposição que vem a público agora não será a mesma ao longo deste período. A montagem atual ficará em cartaz até meados de setembro. Com o fim do outono e o início da primavera, ela será outra, com novos trabalhos. Outras montagens estão previstas com a chegada do verão e do inverno de 2025.
“É uma exposição que traz um estudo requintado de cor, de forma, de materialidade, a partir da ideia de que fazemos parte do mesmo ciclo, de uma conversa com o sagrado, os saberes da terra. E que isso é, de fato, político”, afirmou Beatriz.
Casa de Exu
Nazareth, que 11 anos atrás criou sua própria Bienal de Veneza (no bairro Veneza, em Ribeirão das Neves, onde apresentou versão menor do trabalho que exibia, à época, na 55ª edição do tradicional evento italiano), levou para Inhotim cachaça, banana e pedalinho.
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Bem próximo à Galeria Praça foi instalada a “Casa de Exu”, construção de alvenaria que exala o odor da aguardente de cana. “É ela que abre o caminho para essa encruzilhada, esse quadrilátero ferrífero, as Minas Gerais”, diz Nazareth.
Em um dos lagos do parque está o pedalinho em formato de pato amarelo (o nome da obra é “Pato”). A bem-vinda novidade já levou Inhotim a explicar, via redes sociais, que não é permitido acesso do público a ele.
Por fim, mais distante da visão dos visitantes, em uma das fronteiras do parque, foi plantado um bananal.
“A banana, que acaba atravessando várias obras do Paulo, é espécie exótica que vem da colonização europeia no Brasil e tem diversas maneiras de ser vista. Ao mesmo tempo, ela é a fruta que alimenta o ano inteiro, remete (à expressão) República das Bananas, os países mambembes do ponto de vista do Norte que se formaram no final do século 19. E numa escala mais próxima, trata da experiência do Paulo com a mãe dele, que fala que nos bananais é onde os espíritos se escondem”, explicou Lucas Menezes, outro curador da mostra.
Obras inéditas
Já na Galeria Praça estão trabalhos inéditos do artista e obras de períodos anteriores. Na parte externa do espaço está “Sambaki II” (2024), trabalho comissionado para a exposição, monte que reúne bananas-prata produzidas de concreto. Alto-falantes reproduzem a conversa em crioulo que o artista gravou em São Paulo, uma década atrás, com imigrantes de Guiné-Bissau.
Na parte interna da galeria há outro grande conjunto de bananas, o chamado “Sambaki I”, confeccionadas com madeiras, emulando bananas de dinamite.
“A banana não é só a banana. Ela trata da questão linguística. É um fruto, mas também uma palavra de Ásia que chega em África e incorpora esse nome africano na região do Senegal e depois vem para a América. E como ela, muitos outros, né?”, disse Nazareth.
Muitas mães
Para o artista, “Esconjuro” é exposição que “trata de muitos tempos: de um tempo muito passado e de uma possibilidade de um futuro que ainda não alcançamos”. Dentro da galeria, pinturas, lambes, vídeos. Uma das paredes é dedicada a Ana Gonçalves da Silva, mãe do artista. São desenhos, fotografias, pinturas com a imagem da senhora que transformou a própria casa, no Palmital, no Centro de Cultura, Memória e Lembramento.
“As imagens da minha mãe falam também de muitas mães. E a minha se conecta com a mãe dela, que é Nazareth. E eu levo Nazareth no meu nome”, acrescentou o artista, propondo que este diálogo espiralar da exposição siga com o público.
“O Nazareth fala da mãe da minha mãe, que foi desaparecida na Colônia de Barbacena em 1944. Uma história muitas vezes contada, mas muitas vezes esquecida. Então, a exposição trata desses muitos corpos, de muitas pessoas, espíritos e vidas que passaram. E muitas vidas que ainda estão por vir”, concluiu o artista.
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'Ensaios sobre paisagem'
Também aberta neste fim de semana em Inhotim, a exposição “Ensaios sobre paisagem” está em cartaz na Galeria Lago. A coletiva reúne trabalhos de quatro autores – Aislan Pankararu, artista indígena nascido em Pernambuco e radicado em São Paulo; Ana Cláudia Almeida, carioca; Castiel Vitorino Brasileiro, capixaba; e Zé Carlos Garcia, sergipano que vive no Rio de Janeiro. Cada qual, a seu modo, produz obras que amplificam discussões sobre a natureza.
Inhotim
Em Brumadinho, a 60km de Belo Horizonte. Aberto de quarta a sexta, das 9h30 às 16h30, e aos fins de semana e feriados, das 9h30 às 17h30. Ingressos: R$ 50 e R$ 25. Entrada franca às quartas-feiras e no último domingo de cada mês. Informações: wwwinhotimorgbr