Kirsten Dunst protagoniza o longa de Alex Garland (

Kirsten Dunst protagoniza o longa de Alex Garland ("Aniquilação"), no papel de uma fotojornalista que tenta ir ao encontro do presidente dos Estados Unidos, em meio à conflagração

crédito: Diamond Films/Divulgação

 


A brutalidade que transborda da tela em “Guerra civil”, longa estrelado por Kirsten Dunst e Wagner Moura, não é muito diferente daquela que marcou outros filmes sobre conflitos armados, de “Nascido para matar” (1987) a “Dunkirk” (2017), passando por “O resgate do soldado Ryan” (1998). A diferença é que, nesta coprodução entre EUA e Reino Unido dirigida por Alex Garland, que estreia nesta quinta (18/4), a violência e o desespero são palpáveis.


Fora do leque de filmes de guerra comumente produzidos por Hollywood, que retratam ou se inspiram em fatos passados, sempre em torno de um inimigo externo ou de uma disputa entre nações, “Guerra civil” trata, como o título indica, de uma sublevação interna, causada por uma polarização extrema, que envolve um governo autoritário e uma oposição fortemente armada, disposta a tomar o poder. Essa distopia ambientada em um futuro próximo não soa, afinal, tão distante da realidade atual.


Ao final da projeção, a sensação que se tem é a de que pode acontecer, não só nos Estados Unidos, mas também no Brasil ou em qualquer outro país do mundo que vive um momento de cisão político-ideológica. Não é só o mote do roteiro que põe o espectador dentro do que se passa na tela, mas também aspectos técnicos, como a opção de Garland por posicionar suas câmeras em meio à desordem, colocando o espectador como sujeito às bordoadas, aos tiros e às explosões.


Trata-se de um filme de guerra, claro, mas também tem muito de road movie. A trama acompanha quatro personagens centrais. Kirsten Dunst é a fotojornalista Lee Smith; Wagner Moura vive Joel, experiente e impetuoso repórter da agência Reuters; Cailee Spaeny faz a jovem aspirante a fotojornalista Jessie Cullen; e Stephen McKinley Henderson interpreta o veterano repórter Sammy, do “New York Times”.


Eles partem em uma viagem de carro, de Nova York a Washington D.C., na esperança de conseguir entrevistar o presidente, antes que as chamadas Forças Ocidentais de Secessão, que incluem os estados da Califórnia e do Texas, cheguem à sede do governo. No percurso, o quarteto registra a dimensão da violência do conflito.


Lee, Joel, Jessie e Sammy atravessam paisagens devastadas, abandonadas e também regiões mergulhadas em pleno combate, com projéteis cruzando o ar e mísseis iluminando o céu, além de territórios ocupados por extremistas que parecem não estar de lado nenhum – ou o lado que defendem pouco importa; o que fazem, basicamente, é empilhar corpos. O saldo é uma matança generalizada, o que amplifica a tensão e o medo do grupo em missão jornalística, afinal, não existe trincheira segura para se esconder.

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O recado que “Guerra civil” passa é que a polarização extrema leva à barbárie alimentada pelo ódio. Para os combatentes, não basta matar o oponente – é preciso trucidá-lo, como várias passagens do filme mostram de forma crua e repulsiva. Num dado momento, os personagens centrais são avisados de que em Washington D.C. jornalistas são alvo preferencial dos agentes do governo. A postura e os trejeitos faciais do ator Nick Offerman, que interpreta o presidente dos EUA, evocam claramente Donald Trump.


Tais alusões, contudo, não implicam o delineamento de um lado bom e um lado mau – a selvageria se espraia de maneira indistinta. Escrita em 2020, a produção se abstém detomar partido de forma óbvia. Como Wagner Moura tem dito nas entrevistas para divulgação do filme, é uma obra política que o diretor e roteirista conduz sem ideologizar a trama.


Nos EUA, em cartaz desde a semana passada, “Guerra civil” tem despertado sentimentos mistos. O filme chegou a ser acusado de querer dividir o país. É um pensamento enviesado, porque é, nitidamente, uma obra feita para espelhar, não para incitar.

 


Em entrevista à Sky News, Kirsten Dunst afirmou: “Acho que essas histórias são sobre quando a polarização se torna muito extrema e paramos de nos ouvir. Com toda a internet, mídias, todas essas coisas, tem-se um contexto que realmente contribui para isso, então acho que esse cenário distópico, de certa forma, parece uma possibilidade”.


“Guerra civil” arrecadou US$ 25,7 milhões (R$ 142,6 milhões, na cotação atual) em seu primeiro fim de semana em cartaz nos Estados Unidos. O longa custou US$ 50 milhões. Quem o produz é a A24, sediada em Nova York e também responsável por “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”, que levou o Oscar.


A trama dirigida por Garland tem força e os ingredientes necessários para estar no páreo das principais competições do mundo do cinema. É uma produção tão bem pensada e engendrada que um ou outro problema podem ser facilmente relevados frente ao conjunto da obra – por exemplo, o desenho algo caricatural de jornalistas que cobrem conflitos, visto nos personagens de Moura e, sobretudo, no de Kirsten, como seres desumanizados, ao mesmo tempo meio suicidas e meio sedentos de sangue.


“GUERRA CIVIL”
(EUA/Reino Unido, 2024, 149 min.) Direção: Alex Garland. Com Kirsten Dunst, Cailee Spaeny, Wagner Moura e Stephen McKinley Henderson. Estreia nesta quinta-feira (18/4), em salas das redes Cineart, Cinemark, Cinesercla e Cinépolis, no Centro Cultural Unimed-BH Minas e no UNA Cine Belas Artes.

 

DIRETOR EM ALTA

O britânico Alex Garland, de 53 anos, foi indicado ao Oscar de melhor roteiro original, em 2016, por “Ex Machina – Instinto artificial”. Ele também dirigiu “Aniquilação” (2018) e “Men: Faces do medo” (2022). Garland começou a carreira como escritor e já com um sucesso: lançado em 1996, o romance "A praia" ganhou fama com o boca-a-boca e, em 2000, virou um filme dirigido por Danny Boyle e estrelado por Leonardo Di Caprio.