Com uma trajetória que registra participações importantes em produções internacionais de destaque, como o filme “Elysium” (2013), de Neill Blomkamp, e a série “Narcos” (2015-2017), da Netflix, Wagner Moura não se deslumbra mais com os holofotes da meca do cinema. Ele, contudo, não esconde o entusiasmo com a repercussão do filme “Guerra civil”, coprodução entre Estados Unidos e Reino Unido dirigida por Alex Garland, em que contracena com Kirsten Dunst, Cailee Spaeny e Stephen McKinley Henderson.
A superprodução liderou as bilheterias norte-americanas em seu fim de semana de estreia, conquistou a atenção da crítica e tem ampla estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta (18/4).
Em entrevista ao Estado de Minas, o ator, nascido em Salvador, fala sobre o que despertou seu interesse em participar do projeto, sobre a temática áspera em que a trama se baseia e sobre as dificuldades enfrentadas durante as filmagens. Com a vida dividida entre Estados Unidos e Brasil, mas “morando mais lá do que cá”, Moura também chama a atenção para o que considera a grande virtude de “Guerra civil”: ocupar um lugar de equilíbrio entre o “cinema pensante” e o entretenimento de qualidade.
Quando o projeto de “Guerra civil” foi apresentado a você, o que mais te cativou?
Eu tinha encontrado o Alex (Garland, diretor do filme) antes, quando ele estava fazendo a série “Devs”, e foi um ótimo almoço. Não rolou de participar da série por várias razões, mas fiquei muito feliz quando ele me procurou de novo.
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Acho Alex incrível, das pessoas mais brilhantes com quem já trabalhei, adoro todos os filmes dele. O que mais me chamou a atenção em “Guerra civil” foi o roteiro que ele escreveu. Nunca tinha lido uma coisa que captasse tão bem a ansiedade coletiva do mundo polarizado como estamos vivendo hoje.
Em que medida você acha que essa ficção reverbera a realidade atual, não só dos EUA, mas ao redor do planeta?
Absolutamente, totalmente. O mundo está todo polarizado, os EUA, o Brasil, as principais democracias estão. A eleição dos EUA se repete, Biden contra Trump mais uma vez. Esse filme tem uma coisa que adoro: ele é político, mas não tem uma agenda ideológica, é sobre os perigos dessa polarização, que, no meu entendimento, é a maior ameaça às democracias modernas, sem tomar partido.
Ele é conduzido pelo ponto de vista dos jornalistas, portanto supostamente neutro, imparcial. Me preocupa muito o estado do jornalismo no mundo hoje, o descrédito pelo qual está passando, o fato de as pessoas estarem se informando em suas bolhas, sejam conservadoras ou progressistas. O jornalismo, mesmo como negócio, está ameaçado. Me preocupa muito isso, porque é um pilar fundamental da democracia.
Qual foi, para você, o maior desafio na realização desse projeto?
Acho que era um filme muito demandante emocionalmente, todo dia tinha uma cena horrorosa, a gente via e lidava com coisas pesadas todo dia. A gente se envolve profundamente com aquilo. Para fazer com que pareça verdadeiro, você tem que estar inteiro no seu personagem, tem que conjurar uma energia ali que, às vezes, fica pesada no corpo.
Emocionalmente e fisicamente, principalmente no último terço do filme, foi um trabalho muito desgastante; é muito físico e imersivo. O Alex queria que o filme fosse muito realista, então os festins eram de alta potência, 30 caras atirando; aquele barulho todo que você ouve na sala de cinema a gente estava ouvindo durante as filmagens. Tudo isso era muito perturbador, muito forte.
O que “Guerra civil” representa na sua trajetória como artista?
Eu gosto de política, gosto de arte e política, e gosto quando cinema e política se misturam; gosto de Costa-Gavras, gosto do neorrealismo italiano, gosto do cinema político argentino, tudo isso me interessa. Fiz muitos filmes políticos, “Marighella” (2019), “Sergio” (2020), o próprio “Tropa de elite” (2007, com uma sequência em 2010), porque gosto.
Quando li o roteiro de “Guerra civil”, achei que estava no meu elemento, que era uma coisa que eu ia ter prazer de fazer e de agora poder falar a respeito, discutindo, debatendo. Achei que era um filme que tinha a ver comigo.
Como reagiu à notícia de que o filme liderou as bilheterias nos EUA no fim de semana de estreia?
Achei maravilhoso, porque tudo o que a gente quer, o que eu quero, aquilo em que acredito, é você poder fazer um cinema com ideia, um cinema pensante, que instiga a reflexão e que seja, ao mesmo tempo, popular, que seja um bom entretenimento, que as pessoas queiram ver.
Eu dizia para o Alex Garland que o que ele estava fazendo ali era o Santo Graal, o que todo mundo quer – fazer um trabalho que tenha alguma coisa para dizer e que consiga ao mesmo tempo entreter. Se você quiser ir ver “Guerra civil” pela ação, pela adrenalina, vai ter isso com muita qualidade. O filme é bom entretenimento também. É um equilíbrio muito delicado e difícil de conquistar.
Qual sua expectativa com relação à recepção do longa no Brasil?
Minha expectativa é de que seja um sucesso também, que seja visto por muita gente. O Brasil está tão polarizado quanto os EUA. A gente vive uma tensão social e uma ansiedade política equiparáveis ao que está acontecendo lá, a despeito de por lá ser ano de eleições. Mas é isso que esse filme está dizendo, que a polarização é uma coisa perigosa, e o brasileiro entende bem o que é isso. E é um filmaço.