Em 2016, a poucos dias de se tornar octogenário, Luis Fernando Verissimo repetia para jornalistas e quem mais se reunia para assistir a sua participação em mesas-redondas nos eventos literários Brasil afora: “A gente se distrai e, quando vê, está com 80 anos”.

 




Nessa época, cada movimento do escritor gaúcho, cada evento de que ele participava e cada reunião em família foram registrados pelo cineasta niteroiense Angelo Defanti, a fim de juntar tudo em um documentário. Defanti, no entanto, “se distraiu” e não lançou o filme nas comemorações dos 80 anos de Verissimo. Quando viu, o escritor gaúcho já estava perto de fazer 90.

 

Assim, passados oito anos desde as gravações, o longa-metragem documental “Verissimo” chega ao circuito comercial nesta quinta-feira (2/5), com sessões no UNA Cine Belas Artes e no Centro Cultural Unimed-BH Minas, em Belo Horizonte.

 


Ainda que a razão de ser do filme sejam os 80 anos de Verissimo, a produção não se limita a retratar a vida do escritor de modo convencional. O diretor optou por abrir o foco para toda a família.
“Daí o filme se chamar apenas ‘Verissimo’”, explica Defanti. A ideia, segundo ele, era fazer um filme para que o espectador se visse na posição de observador, “assim como o Luis Fernando é um observador da vida cotidiana”.

 

Marido, pai e avô

 

Pelas lentes de Defanti, podemos ver uma faceta pouco conhecida de Luis Fernando Verissimo. Não é o escritor consagrado, introspectivo, vencedor de inúmeros prêmios literários e filho do prestigiado Érico Verissimo que o filme mostra, mas sim o Luis Fernando marido de Lucia Helena, pai de Pedro, Fernanda e Maria, e avô da Lucinda e do Davi.

 


É o cotidiano dos Verissimo que está em cena: Luis Fernando indo ao médico com a esposa e levando bronca dela por algum remédio que deixou de tomar, ou a visita que ele faz à escola da neta para prestigiar a participação da garotinha numa feira de ciências.

 

Há ainda cenas em que ele e Lucia assistem ao jogo do Internacional (time do coração de Verissimo) e momentos de brincadeira com os netos, onde é possível perceber o quanto o escritor entra no universo infantil para compartilhar com os meninos a mesma fantasia.

 

“Essa realidade que o Luis Fernando vive, querendo ou não, é a principal fonte de inspiração dele ao escrever. Se ele fala de matrimônio e relações familiares, é claro que ele pega como referência aquilo que está na frente dele”, afirma o cineasta.

 


Defanti tem propriedade para fazer tal afirmação. Ele conheceu o escritor no final dos anos 2000, quando ainda era estudante de cinema e foi pedir autorização de Verissimo para adaptar alguns contos no curta “Maridos, amantes e pisantes” (2008). O escritor autorizou e, depois de assistir ao filme pronto, elogiou o trabalho de Defanti.

 

A partir daí, a relação do cineasta com os Verissimo foi se estreitando. Além de se tornar amigo da família, ele também adaptou outras obras do escritor no curta “Feijoada completa” (2012) e no longa “O clube dos anjos” (2022).

 

Inclusive, foi por causa desse último filme que “Verissimo” demorou oito anos para estrear. “Quando terminei de gravar, voltei para casa com 100 horas de material. Ou seja, eu teria um trabalho enorme para montar o filme, transformando essas 100 horas em algo próximo de 100 minutos. Nesse mesmo período, ganhei um edital para financiar ‘O clube dos anjos’. Acabei me dedicando totalmente a esse filme e só depois voltei para fazer a montagem do documentário”, explica o cineasta.

 

A espera, contudo, possibilitou um resultado final muito melhor do que Defanti havia imaginado inicialmente. A experiência que ele adquiriu dirigindo um longa-metragem de ficção e os oito anos em que amadureceu pessoal e profissionalmente deram a ele a coragem para se arriscar e fazer um filme “silencioso”.

 


“O Luis Fernando sempre foi conhecido por ser mais reservado, conversar pouco e não se socializar muito. No filme, ele não se mostra diferente. Continua reservado, calado e socializando pouco para além do círculo familiar. Mas isso não quer dizer que ele não tenha algo a falar. Ele fala pelo silêncio. E, como ele é esse silêncio ambulante, a ideia – e grande dificuldade – do filme era justamente filmar esse silêncio”, diz o cineasta.

 

Precisamente por essa questão sonora, “Verissimo” é um filme para ser visto no cinema, conforme sugere o diretor. “É um filme de cinema no aspecto em que é uma imersão no som e na imagem. E isso a gente consegue observar melhor na ‘caixa escura’ do cinema. Sem contar que, no cinema, uma reação contagia a outra, que contagia outra e assim vai. Vai virando uma afetividade naquele coletivo de pessoas dentro de um mesmo lugar”, comenta.

 

“VERISSIMO”
(Brasil, 2024, 90min.). Direção: Angelo Defanti. Documentário sobre Luis Fernando Verissimo. Estreia nesta quinta (2/5), no UNA Cine Belas Artes (Sala 3, 17h10) e no Centro Cultural Unimed-BH Minas (Sala 1, 16h10).

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