As enchentes que assolam o Rio Grande do Sul desde o fim de abril têm provocado danos incalculáveis em todo o estado. As fortes chuvas afetaram cerca de 450 cidades – o correspondente a 90% do total de municípios – e mais de 2 milhões de pessoas foram diretamente impactadas pela tragédia que já deixou ao menos 157 mortos e 88 desaparecidos. Os estragos ainda são imensuráveis e diversos setores produtivos foram gravemente abalados, inclusive o editorial.

 




Em 10 de maio, a editora L&PM, conhecida por suas edições de bolso de clássicos da literatura, publicou um comunicado nas redes sociais informando que estava inoperante, uma vez que sua sede e depósito estavam alagados e completamente sem acesso.

 


Em nota enviada ao Estado de Minas no último sábado (18/5), a coordenadora de Marketing da empresa, Vanessa Flores, afirmou que o nível da água ainda não havia abaixado o suficiente para o acesso ao estoque, localizado no Bairro Farrapos, na Zona Norte de Porto Alegre, uma das áreas mais afetadas pela catástrofe na capital gaúcha.

 

 


“O estoque tem 900 mil livros, que estão distribuídos por prateleiras altas”, escreveu Flores. A editora também divulgou que assim que o Guaíba começou a subir, as prateleiras foram levantadas a cerca de 1 metro do chão, no entanto, a água no depósito chegou a atingir os 2 metros de altura.

 


Ainda durante a semana passada, o acesso só era possível através de barco, mas, mesmo assim, os portões não podiam ser abertos para avaliar a situação. A equipe ainda não conseguiu entrar no local e segue sem saber o tamanho do prejuízo provocado tanto pelo contato direto com a água, quanto pelo estrago que o tempo exposto a umidade pode causar nas páginas de papel.

 


A estimativa inicial é de que pelo menos 10 mil exemplares foram perdidos. Para o diretor da empresa, Ivan Pinheiro Machado, a expectativa é de conseguir entrar pela primeira vez no depósito no início desta semana. Antes mesmo da interdição total das operações, a L&PM já sofria com desafios logísticos nas vendas causados pelas interrupções nas rodovias gaúchas, que afetaram o transporte de mercadorias e geraram atraso considerável nas entregas.

 


Situação parecida está sendo vivida pelo Clube de Literatura Clássica, serviço por assinatura que envia mensalmente um box contendo um livro de edição própria para seus membros. O sócio e diretor de Marketing, Lorenzo Fioreze, conta que por estar localizado na cidade de Dois Irmãos, uma das poucas não afetadas pelas chuvas, o estoque do clube segue intacto.

 


Porém, com vias bloqueadas, o acesso à cidade ficou comprometido. Além disso, uma de suas fornecedoras, a gráfica Pallotti, fica em Santa Maria, primeiro epicentro da tragédia. Com isso, a editora ficou vários dias sem conseguir buscar os livros.

 


“É uma situação de longo prazo. Vamos ter que continuar exercendo o nosso papel como empresa que nasceu no Rio Grande do Sul, de apoiar as pessoas daqui”, afirma Fioreze.

 

 

O dano maior, no entanto, foi no coworking do Clube de Literatura Clássica, localizado no Instituto Caldeira, em Porto Alegre, onde a água chegou a atingir os dois metros e ainda não foi totalmente escoada. Por lá também funciona a sede administrativa de outro clube de literatura, a Tag. Gustavo Lembert, CEO do negócio, estima que o prejuízo para recuperar o escritório, que foi completamente destruído, vai ser de mais de R$ 200 mil.

 


“Internamente a gente tem falado que em menos de dois meses não devemos conseguir acessar a sede. Mesmo depois que a água baixar, vai ter lama e cheiro muito forte. Teremos um trabalho grande de reconstrução”, afirma Lembert.

 


Na Tag, as entregas para o Rio Grande do Sul também estão comprometidas, mas seguem normalmente para outras regiões do país, já que o estoque fica na cidade de São Paulo. Assim também está sendo feito na Dublinense, editora independente que atua no mercado desde 2009.

 

Feiras e Flip

 

No caso da Dublinense, o estoque foi remanejado para a capital paulista em 2015, após alagamento de menores proporções que fez com que a editora perdesse cerca de 3 a 4 mil exemplares. O editor Rodrigo Rosp acredita que se o acervo ainda estivesse no mesmo local, desta vez todos os livros teriam sido perdidos. “É isso que está acontecendo com quem tem estoque aqui distribuidoras, livrarias, editoras, todo mundo que trabalha com a coi física aqui teve perdas absurdas”, avalia. A editora teve que adiar uma sessão de autógrafos do escritor Robertson Frizero, que aconteceria no último dia 4.

 


“Temos notícia de que o aeroporto só abre em setembro, então isso gera uma série de incertezas. Qual vai ser o impacto disso em toda a cidade? Vamos poder estar na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty)? Como vai ser a Feira do Livro de Porto Alegre? E os próximos lançamentos? Quando os autores de fora vão poder voltar a vir para cá?”, questiona Rodrigo Rosp.

 

 


Ações solidárias

 

Como meio de enfrentar o momento delicado, o setor editorial tem se unido para a promoção de ações solidárias. O Clube de Literatura Clássica e a Tag contam com a ajuda da base de assinantes de outros estados para contribuir com doações. As duas já receberam mais de R$ 100 mil cada, que foram destinados para ONG’s e instituições de apoio à causa. Porém, é certo que o mercado ainda vai precisar de tempo e solidariedade para se recuperar. Uma forma de ajudar é procurar saber quem são e comprar das editoras, livrarias e autores gaúchos para reerguer o setor no estado.

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