Vinte anos atrás, Claude Troisgros já era chef francês consagrado no Brasil quando descobriu uma qualidade própria que não tinha qualquer relação com técnicas de cozinha, temperos ou ingredientes exóticos. Mas que ajudaria bastante. Ouviu de um diretor de televisão que era “camera friendly” (amigo da câmera, em bom português). E isso, escola nenhuma ensina.
Aos 68 anos, ele completa duas décadas de TV à frente de um dos programas mais populares de gastronomia – “Que marravilha!”, que comanda há 27 temporadas ao lado do fiel escudeiro Batista. Além disso, é um dos chefs mentores do reality “The taste Brasil” e estreou, há pouco, outra atração de competição. Tudo no canal GNT.
“Geladeiras em ação!” é um reality inspirado no dia a dia de qualquer ser humano: cozinhar com o que se tem em casa. Cada episódio é temático, abrangendo um estilo de cozinha. O da próxima quinta-feira (30/5) será a culinária italiana. Também estão previstos episódios sobre comida de boteco, americana, fitness, churrasco e por aí vai. A primeira temporada vai até 11 de julho.
Cada um dos competidores, pessoas que cozinham em casa, deve preparar café da manhã, almoço e jantar usando apenas o que há na geladeira abastecida pelo próprio Claude. Os participantes serão julgados por Batista, Douglas Silva e um terceiro convidado, que muda a cada episódio.
Depois de tantos anos comandando programas de TV com diferentes formatos, Claude diz que a intenção do novo reality é se aproximar mais do telespectador, “com uma cozinha mais popular”. De resto, não há muito segredo, já que ele desbravou a TV aprendendo na prática. “Na realidade, sou cozinheiro. Faço o que sei fazer, só que na frente da câmera.”
A história do chef na televisão começa em 2004, também no GNT, quando o segmento era pouquíssimo explorado no Brasil. E Claude começou pequeno, com um quadro de três a quatro minutos, “Adivinha o que tem para jantar?”, no extinto programa “Armazém 41”.
Um ano depois, o desafio cresceu. Ele passou a dividir com o jornalista Renato Machado, expert em vinhos, o comando do “Menu confiança”.
“Fiquei tenso, nervoso, porque era um programa e era com o Renato, não só jornalista muito competente, mas um cara que conhecia vinho, escrevia sobre culinária”, ele conta. O nervosismo diminuiu quando ouviu do diretor que sua personalidade se dava com a câmera. “Tenho muitos amigos que tentaram entrar na televisão, mas toda vez que a câmera ligava, a pessoa ficava travada.”
Batista, o paraibano braço direito de Claude, entrou na TV a partir deste momento. “Menu confiança” era gravado no Olympe, marco na integração entre as culinárias francesa e brasileira (funcionou por quase quatro décadas no Jardim Botânico, no Rio). Batista já trabalhava com Claude desde os anos 1980.
“No dia da gravação do ‘Menu confiança’, a gente montava uma cozinha onde era o bar do Olympe. Atrás tinha um vidro, através dele se via a cozinha. Quem preparava tudo era o Batista, o que a gente chama de mise en place. Ligava a câmera e eu tinha de colocar a cebola. Cadê a cebola? Não tinha. Ficava puto e gritava: ‘Batista, cadê a cebola?’ Aí ele chegava totalmente apavorado: ‘Chefe, esqueci’. E cortavam (a cena). Só que isso, no início, aconteceu umas 40 vezes. Certo dia, falei para o diretor: ‘Não corta mais, filma os momentos do Batista em que ele chega e não consegue falar nada.’ Não era por timidez, era porque estava nervoso. Aí ele começou a aparecer no programa.” Foi ali que nasceu o bordão “Batiiiista”, que até hoje marca a interação entre os dois amigos.
O programa “Que marravilha!” também nasceu pela expressão que Claude repete desde sempre com o carregado sotaque francês. Foram muitas maravilhas, por sinal, que este francês de renomada família de chefs descobriu no Brasil, quando aqui desembarcou em 1979. Chegou com base sólida, pois é filho e sobrinho de Pierre e Jean Troisgros, respectivamente, chefs que entre as décadas de 1960 e 1970 fizeram parte da chamada Nova Cozinha Francesa ao lado de estrelas como Paul Bocuse e Roger Vergé.
Jabá com jerimum
Maxixe, jabuticaba, açaí, batata-baroa, tucupi. “Fiquei louco, que produtos maravilhosos”, lembra Claude, cujo prato típico brasileiro preferido é jabá com jerimum, ou seja, carne seca com abóbora, que come no almoço em casa pelo menos uma vez por semana. Ele foi um dos pioneiros no uso de produtos desprezados por cozinheiros dos grandes restaurantes do país naquela época. Mas não se vê como criador de nada.
Perguntado sobre sua autoria no purê de batata-doce, Claude dá de ombros. “Não gosto muito dessa palavra criação. É um purê de batata, que existe há milhões de anos na França. Só que a batata-doce existe no Brasil. E tinha muito chef, como o Laurent (Suaudeau), meu amigo que chegou aqui na mesma época que eu, fazendo purê de batata-baroa. Chefs trocam muita técnica, informação. Mas ninguém cria nada. Quem cria são os gênios, como o (espanhol) Ferran Adrià. E estes são poucos.”
Menu olímpico
Atualmente, Claude Troisgros está à frente de seis empreendimentos. No Rio, onde vive, do Chez Claude, Mesa do Lado e Cantina do Claude. Já em São Paulo, para onde vai toda semana, comanda o Chez Claude SP, Bistro du Quartier e Bar du Quartier.
O chef prepara, neste momento, o cardápio que será servido entre junho e julho no Chez Claude em homenagem aos Jogos Olímpicos de Paris. No Festival de Bistrô, vai oferecer campeões da casa, como o risoto de camarão e o peixe com banana, como também os patê de campagne e boeuf bourguignon, entre outros clássicos franceses.
“GELADEIRAS EM AÇÃO!”
Novos episódios do reality com Claude Troisgros. Às quintas-feiras, às 21h45, no GNT e Globoplay