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Livro "Encontro de práticas" reúne diálogos entre diferentes vozes com o objetivo de construir um lugar possível

crédito: Everton Jubini/Divulgação

Destacar a troca de experiências entre diferentes mundos, como as comunidades quilombolas urbanas e indígenas, e a confluência de conhecimentos universitários, artísticos e de movimentos sociais – esse foi o propósito que guiou a feitura do livro "Encontro de práticas", organizado pelo professor adjunto da Escola de Arquitetura da UFMG Frederico Canuto em colaboração com Amanda Sicca, Daniel Menezes, Everton Jubini e Juliana Marques. O lançamento será neste sábado (8/6), às 14h, na galeria de arte Mama/Cadela.

  

A obra conta com um total de 22 autores, provenientes de diferentes territórios e vivências, incluindo os próprios organizadores e nomes de alcance internacional, como Micheliny Verunschk, vencedora de alguns dos principais prêmios de literatura em língua portuguesa (Jabuti, Biblioteca Nacional e Oceanos), e Glicéria Tupinambá, importante liderança dos Tupinambá e articuladora da equipe curatorial da exposição "Kwá yapé turusú yuriri assojaba tupinambá | Essa é a grande volta do manto tupinambá".



Durante o lançamento do livro, Frederico Canuto participa de debate ao lado de Junia Mortimer, também pesquisadora da UFMG e da Universidade Federal da Bahia, onde leciona, e das lideranças Makota Kidoialê, do Kilombu Manzo Nzungo Kaiango, e Kelly Simone Santos, da Guarda de São Jorge de Nossa Senhora do Rosário. Eles propõem uma conversa sobre como o encontro entre diversos modos de pensar e perceber o mundo a partir de suas práticas sócio-espaciais produzem conhecimentos e territórios singulares.

 

Experiências de existir

 

Canuto explica que "Encontro de práticas" se origina na plataforma Práticas de Encontro, criada em 2022 e vinculada ao grupo de pesquisa Narrativas Topológicas (CNPq), que atua desde 2014. Na plataforma, investigadores de origens diversas, como povos tradicionais, universidades, movimentos sociais e outros coletivos de organização e produção de conhecimento, intercambiam formas e experiências de existir no mundo contemporâneo, partindo do território como fonte de conhecimento.


"Entre mestrados e doutorados, estava fazendo uma pesquisa que relacionava cinema, arte, imagem e modos de produção que a mídia normalmente chama de alternativos. Fui percebendo que muitos orientandos que me procuravam discutiam em seus trabalhos essas mesmas questões", diz Canuto. Ele explica que isso foi o estopim para a o lançamento da plataforma e a realização do livro, nem tanto pelos pontos de convergência, mas pelo que ficava à margem.


O pesquisador observa que a discussão estava posta, mas as conversas com lideranças quilombolas, indígenas, artistas, escritores, representantes de grupos específicos ficavam todas meio que pela metade. "Não dá para colocar numa pesquisa acadêmica uma conversa inteira de duas horas com uma fonte. Ainda que essas conversas estivessem fora do âmbito do trabalho de cada orientando ou orientador, elas traziam questões importantes de serem discutidas, o que passa pela diversidade de modos de ver e pensar o mundo", pontua.


Diferentes mundos

 

Ele ponderou que, em vez de sempre usar essas conversas marginalmente como fonte para as pesquisas, elas poderiam ganhar centralidade. "Em vez de simplesmente gravar o que a pessoa fala, por que não chamá-la para trocar experiências com outras que trabalham em universos próximos ou mesmo muito distantes? A gente queria construir encontros de diferentes mundos, uma liderança quilombola, um cineasta, um artista plástico, um professor", ressalta.


Na apresentação de "Encontro de práticas", os organizadores escrevem que "num contexto em que está claro o indesviável fim do mundo proclamado há tempos por cientistas e que, agora, parece começar a ser ouvido, o mundo que chega ao fim não é um, mas vários, e o que termina não são todos, mas principalmente aquele(s) vivido(s) e produzido(s) pela hegemonia branca colonial".


O texto segue dizendo que encontrar e trocar experiências de práticas sócio-espaciais "é um singelo movimento que aponta para uma ideia de que o fim do mundo pode não ser um mantra a ser vivido como negatividade, mas sim como potência para processos de escuta e ajuda mútua criativos e reveladores". Canuto chama a atenção para o que a academia hoje nomeia como "virada cosmopolítica", com diferentes mundos e diferentes formas de ver e de sentir o ambiente.

 

Lugar possível

 

"No grupo criado em 2014, a gente trabalhava muito com narrativas vindas do cinema, da literatura, da fotografia. Entendemos, depois, que essas diferenças que a virada cosmopolítica sublinha colocavam em questão o que a gente chama de cinema, literatura, fotografia, arte em geral. Criamos a plataforma para construir essas confluências, esses encontros", destaca. Cinco capítulos do livro são assinados por cada um dos organizadores, individualmente; os demais promovem os diálogos entre as diferentes vozes.


Um dos capítulos resulta da conversa entre Glicéria Tupinambá, Micheliny Verunschk – que em 2021 lançou o livro "O som do rugido da onça" – e Augustin de Tugny, professor da Universidade Federal do Sul da Bahia, que discute o museu como agente colonizador. "Em outro, temos a Kelly Simone conversando com Karine Carneiro, professora da UFOP que trabalha com o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana. O que elas podem falar uma para a outra? É uma tentativa de construção de um lugar possível", diz Canuto.


Autores

 

Assinam textos em "Encontro de práticas": Frederico Canuto, Amanda Sicca, Daniel Menezes, Everton Jubini e Juliana Marques (organizadores); Aremita Reis, Augustin de Tugny, Clarisse Alvarenga, Eduardo Neves, Gabriela Leandro, Gláucia Martins, Glicéria Tupinambá, Karine Carneiro, Kelly Simone Santos, Junia Torres, Makota Kidoialê, Maria Fernanda Derntl, Padre Mauro Luiz da Silva, Micheliny Verunschk, Rita Carelli, Rosângela Tugny e Thislandyourland (parceria entre as artistas e pesquisadoras Ines Linke, de Salvador, e Louise Ganz, de Belo Horizonte)


"ENCONTRO DE PRÁTICAS"
Lançamento do livro, com organização geral de Frederico Canuto, seguido de debate com Canuto, Junia Mortimer, Makota Kidoialê e Kelly Simone Santos. Neste sábado (8/6), às 14h, na galeria de arte Mama/Cadela (Rua Pouso Alegre, 2.048 – Santa Tereza). O livro será vendido no local por R$ 60. Link da pré-venda: https://loja.quintaledicoes.com.br. Entrada gratuita.