Cantor e compositor Chico  Buarque criou trilhas para filmes como

Cantor e compositor Chico Buarque criou trilhas para filmes como "Bye bye Brasil" (1980), de Cacá Diegues

crédito: Urca Filmes/Reprodução

 

Em 1949, o paulistano Cine Rex exibia “Sansão e Dalila”, de Cecil B. DeMille (1881-1959). Em uma sessão, Victor Mature (1913-1999), ator que deu vida ao personagem bíblico, impressionou um garotinho de 8 anos que estava no cinema ao derrubar, com as mãos, as colunas do templo, matando dezenas de filisteus. O garotinho que assistia ao filme era Chico Buarque. E a cena do longa de DeMille é uma das primeiras lembranças que o cantor e compositor carioca tem da própria infância.

 

 


Tal recordação evidencia a presença do cinema na vida de Chico bem antes de ele ter se dedicado às trilhas de “O anjo assassino” (1966), longa de Dionisio Azevedo; “Quando o carnaval chegar” (1972), de Cacá Diegues; “Joana, a francesa” (1973), “Bye Bye Brasil” (1980) e o “O Grande Circo Místico” (1983), todos também de Diegues.


“Eu fui fazer música para cinema porque me convidaram. Aliás,  conta Chico, no primeiro episódio da série “Na trilha do som”, que chega ao canal Curta! e ao CurtaOn nesta segunda-feira (17/6), dois dias antes de o cantor e compositor completar 80 anos, na quarta (19/6).


Concebida, dirigida e roteirizada pelo crítico de cinema e DJ Marcelo Janot – é o début dele como diretor –, a série se divide em oito episódios com cerca de 20 minutos de duração que documentam a trajetória de importantes criadores de trilhas sonoras brasileiras. Em cada episódio, um compositor conta sua própria história. Além de Chico Buarque, também foram entrevistados Antonio Pinto, André Abujamra, Plínio Profeta, David Tygel, DJ Dolores, Remo Usai (1928-2022) e Gilberto Gil.

 

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“Na pré-estreia que nós fizemos no Rio de Janeiro, exibimos no cinema os episódios do Chico, do André Abujamra e do Plínio Profeta. Na saída da sessão, o comentário que eu mais ouvi das pessoas foi sobre o quanto esses músicos têm perfis totalmente diferentes e modos distintos de encarar o trabalho com a trilha”, lembra Janot em entrevista ao Estado de Minas, por telefone.

Compositor carioca durante a entrevista para a série "Na trilha do som", na qual Chico se lembra de sua antiga relação com o cinema

Compositor carioca durante a entrevista para a série "Na trilha do som", na qual Chico se lembra de sua antiga relação com o cinema

Urca Filmes/Reprodução

 

Singularidades

 

Não são só Chico, Abujamra e Profeta que têm perfis diferentes. Todos os oito entrevistados na série têm suas singularidades e particularidades, tanto nas composições quanto na maneira de contar como trabalham.


Chico se lembra de sua antiga relação com o cinema e de correr contra o tempo para fazer canções com versos que passavam a mensagem que o diretor lhe recomendava. Antonio Pinto, por sua vez, revela que sua primeira referência artística não foi o cinema, mas os livros – ele é filho de Ziraldo –, e que só depois de adulto começou a aliar música e cinema, tendo assinado as trilhas de “Central do Brasil” (1998), de Walter Salles; e “Cidade de Deus” (2002), de Fernando Meirelles e Kátia Lund.


Abujamra, que fez as músicas de, entre outros, "Querô" (2007), de Carlos Cortes; "Carandiru (2003)", de Hector Babenco; e "Bicho de sete cabeças" (2000), de Laís Bodanzky, mostra que consegue compor uma trilha em poucos minutos e revela que, com medo de reprimenda dos diretores por fazer uma trilha muito rápida (para ele, os diretores podem achar que “a pressa é inimiga da perfeição”), costuma passar uma semana inteira dizendo que está trabalhando na composição, quando, na verdade, a melodia já está pronta há dias.


Plínio Profeta e David Tygel, no entanto, são mais didáticos. Explicam como se dá o processo criativo e discorrem sobre termos técnicos, como o que é um “leitmotiv” (o tema do personagem) e de que maneira ele se desenvolve.


“A gente tinha muito material com cada um dos entrevistados”, conta Janot. “Mas, como eu queria dar um panorama abrangente, procurei fazer com que cada episódio pegasse, claro, os aspectos diversos de cada músico, e que também trouxesse coisas que não couberam nos outros, formando um mosaico que se conecta quando visto por inteiro. Tanto é que agora a ideia é montar todo esse material no formato de longa-metragem para ser lançado futuramente”, acrescenta.

 

Protagonismo feminino


Também estão nos planos de Janot uma segunda temporada da série. Dessa vez com maior protagonismo de mulheres compositoras. Ele conta que elas não estiveram na primeira rodada de “Na trilha do som” porque, quando a série foi concebida, entre 2018 e 2019, os homens eram quase unanimidade no mundo dos trilheiros.

 
“Existia uma espécie de ‘Clube do Bolinha’ no universo dos trilheiros no Brasil e também no mundo. O que a gente percebe agora, cinco anos depois, é que já há mulheres se destacando mais. Um exemplo disso é a Flávia Tygel, que só nesta semana está produzindo trilhas para quatro filmes diferentes”, destaca Janot.


Paralelamente ao trabalho de crítico de cinema e, agora, diretor, Janot mantém carreira de DJ. Já lançou três discos, promoveu a festa Brazooka por 11 anos e abriu o show dos Rolling Stones em Copacabana, em 2006. Inclusive, no sábado (15/6), véspera da entrevista para esta reportagem, Janot estava em São Paulo se apresentando em evento.


“NA TRILHA DO SOM”
• Série de Marcelo Janot
• Estreia: hoje (17/6), às 20h30
• 8 episódios
• Canal Curta! e na plataforma CurtaOn

 
ENTREVISTADOS

Episódio 1: Chico Buarque
Episódio 2: Antonio Pinto
Episódio 3: André Abujamra
Episódio 4: Plínio Profeta
Episódio 5: David Tygel
Episódio 6: DJ Dolores
Episódio 7: Remo Usai (1928-2022 / gravou entre 2018 e 2019)
Episódio 8: Gilberto Gil