Chico Buarque abriu a turnê nacional

Chico Buarque abriu a turnê nacional "Caravanas" em Belo Horizonte, em dezembro de 2017. Cantou para o Palácio das Artes sempre lotado

crédito: Marcos Vieira/EM/D.A Press/12/12/2017

 

 

Recentemente, o cantor e compositor Makely Ka foi convidado para dar aula para alunos do primeiro período de comunicação de uma universidade mineira. Em frente a 40 estudantes, perguntou quais deles conheciam Chico Buarque, que completa 80 anos nesta quarta-feira (19/6). Somente dois confirmaram.

 


Assustado, Makely teve de mudar a aula naquele momento. “Comecei a falar da importância de Chico para a cultura brasileira da segunda metade do século 20 para cá. Mostrei trechos de algumas canções, falei das peças de teatro, dos romances, do posicionamento político dele em momentos decisivos da vida brasileira.”

 

 


Inteligentemente, Makely mostrou para a plateia de neófitos não só a produção de outrora de Chico, como também a mais recente, “atualíssima e cada vez mais sofisticada”. A seguir, confira as “preferidas do Chico” eleitas por artistas de Minas Gerais:


 

 

Makely Ka toca violão

Makely Ka apresentou Chico Buarque a jovens universitários que nada sabiam sobre o autor de "Construção" e "Que tal um samba?"

Instagram/Reprodução

 

 

 Makely Ka, cantor e compositor

 

“Tem algumas canções recentes do Chico que faço questão de destacar pelo caráter didático, no sentido de mostrar que a produção buarquiana, apesar dos detratores, continua atualíssima, cada vez mais sofisticada e que merece ser ouvida pelas novas e reouvida pelas velhas gerações: 'Embebedado' (2005, com letra de José Miguel Wisnik), 'Você, você' (1997, com música de Guinga), 'Sinhá' (2010, com música de João Bosco) e 'As caravanas' (2017, letra e música do Chico).

 

 

. Júlia Ribas, cantora

 

“Escolho 'Januária' (1967), porque quando estudava na Fundação de Educação Artística e tive de fazer uma audição, selecionei algumas canções. A primeira foi justamente ela: 'Januária na janela/ Até o mar faz maré cheia/ Pra chegar mais perto dela'. Também acho 'Samba e amor' (1969) muito linda, marcou a minha vida durante um período.”

 

. Rogério Flausino, vocalista do Jota Quest

 

“'Bye bye Brasil' (1979, com música de Roberto Menescal), do filme de mesmo nome (1980, de Cacá Diegues). Gosto muito dessa música, a letra é fantástica, me traz uma onda bacana, é a primeira do Chico Buarque que me vem à cabeça quando penso nele.”

 

 

Rogério Flausino canta e toca violão

Rogério Flausino tem carinho especial por "Bye bye Brasil", tema do filme de Cacá Diegues

Cesar Ovalle/divulgação

 

 

. Flávia Ferraz, cantora do Trio Amaranto

 

“'Pedaço de mim' (1977). Quando crianças, ouvimos (as irmãs Flávia, Lúcia e Marina Ferraz) esta canção na gravação da Zizi Possi e do Chico (com Milton ao piano e Beto Guedes no bandolim). Ela foi gravada em uma fita K7 por nosso tio Fernando para ouvirmos com nossos pais durante o trajeto das viagens de carro. Acho que entendemos precocemente o viés dolorido da saudade por meio da letra desta canção. Nela, a dor da falta e da impossibilidade do reencontro é representada com imagens lindíssimas: 'Uma fisgada num membro que já perdi'; 'Um barco que aos poucos descreve um arco/ e evita atracar no cais'; 'A saudade é o revés de um parto/ A saudade é arrumar o quarto/ do filho que já morreu'. Só mais tarde, nós três, nascidas entre 1976 e 1981, pudemos alcançar outras dimensões da música, como a compreensão dos sofrimentos causados pela ditadura militar e o conhecimento da história de Zuzu Angel e sua busca por notícias do filho, morto brutalmente neste período, dolorosa inspiração de Chico.”

 

 

As irmãs Ferraz, do Trio Amaranto, sorriem para a câmera

As irmãs Ferraz, do Trio Amaranto, ouviam Chico Buarque e Zizi Possi cantarem "Pedaço de mim" quando eram crianças e viajavam de carro com os pais

Élcio Paraíso/divulgação

 

 

. Rafael Martini, pianista, compositor e arranjador

 

“'Paratodos' (1993), do disco de mesmo nome, tem um simbolismo muito grande. Mostra que a história da música popular brasileira foi construída por muitas mãos, de vários lugares e realidades diferentes. Essa construção coletiva da cultura também é mostrada na capa do álbum, com várias fotos 3x4 de pessoas anônimas, que compõem o povo brasileiro. Além disso, ela tem um arranjo exuberante do Luiz Cláudio Ramos, que foi o arranjador do Chico durante muitos anos. É um arranjo que tem intertextualidades muito interessantes: logo no início, você tem umas flautas que citam o 'Quebra-pedra', música do Jobim que fala de um passarinho que o Tom inventou.”

 

 

 

 

. Samuel Rosa, cantor, compositor e guitarrista

 

“Adoro 'Construção' (1971), lembro muito do meu pai ouvindo em casa. E adoro o negócio das proparoxítonas na letra, a gente até usou algo semelhante em 'Formato mínimo' (letra de Rodrigo Leão e música de Samuel, lançada pelo Skank em 2000).”

 

 

Samuel Rosa toca guitarra no palco e sorri

Samuel Rosa é fã de "Construção"

Instagram/@Carvalho do Mato

 

 

. Marcelo Veronez, ator e cantor

 

“'Futuros amantes' (1993) traz uma ideia linda e irônica. As pessoas às vezes não percebem que tem um deboche oculto ali, porque ele diz para não se afobar, que nada é pra já, o amor não tem pressa, ele pode esperar. Só que essa espera é imensa, gigante, absurda, porque ele salta no tempo para um momento em que a gente não vai estar mais aqui. Ou seja, esse amor não será vivido. Ele continua, dizendo que quando isso acontecer, quem sabe o Rio será alguma cidade submersa. E que os escafandristas irão buscar informações sobre esse amor. Uma pessoa colocar escafandrista na letra de uma música já zerou o game total, né?”

 

 

 

 

. Chico Lobo, violeiro e compositor

 

“O lado mais regional, do Brasil profundo, o Brasil das violas, que abraço há tanto tempo, sempre me encantou no Chico Buarque. Ele revela um olhar muito apurado para o trabalhador brasileiro, pela busca das melhores condições. Ele acaba sendo contaminado por criações da cultura popular e oral, fazendo um diálogo com a formação mais erudita. As canções que, para mim, lembram a luta diária do trabalhador são 'Brejo da Cruz' (1984) e 'Assentamento' (1997). Esta tem até uma
citação de Guimarães Rosa, no verso 'Ó Manuel, Miguilim/ Vamos embora'.”