A poeta mineira Adélia Prado foi anunciada nesta quarta-feira (26/6) como a vencedora do prêmio Camões, o mais importante reconhecimento da literatura em língua portuguesa. A distinção vem uma semana depois de ela ganhar o prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, que também seleciona autores pelo conjunto da obra.
“Estava ainda comemorando o recebimento do Prêmio Machado de Assis, da ABL, e agora estou duplamente em festa”, escreveu Adélia em texto divulgado à imprensa. “Descobri ainda que a experiência poética é sempre religiosa, quer nasça do impacto da leitura de um texto sagrado, de um olhar amoroso sobre você, ou de olhar formigas trabalhando. O transe poético é o experimento de uma realidade anterior a você. Ela te observa e te ama”, acrescentou ela, repetindo depoimento dado à revista Poesia Sempre, em 1997.
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A religião, aliás, está muito ligada à vida e à poesia da autora. De acordo com estudo realizado pelo ex-presidente da Academia Mineira de Letras (AML), Rogério Tavares, e publicado em revista da instituição, Adélia é irmã do primeiro frade franciscano de Divinópolis (frei Antônio do Prado), integrou a Ordem Terceira de São Francisco de Assis na cidade e chegou a assinar publicações com o pseudônimo “Franciscana”.
A escolha rompe uma tradição do Camões: o prêmio costuma alternar entre escritores brasileiros, portugueses e de países africanos lusófonos. Dessa vez, a escolha da mineira vem apenas dois anos depois da seleção de outro mineiro, o crítico literário Silviano Santiago.
Descrita por Carlos Drummond de Andrade como “lírica, bíblica e existencial”, Adélia é dona de uma obra potente, que cativou diferentes gerações de leitores. Foi, inclusive, o itabirano que impulsionou a carreira dela ao lançar luz sobre os poemas da mineira no Jornal do Brasil e ao recomendar à Imago Editora que publicasse o primeiro livro de Adélia, o que foi feito em 1976, com o lançamento de “Bagagem”.
A relação próxima que os dois poetas mantinham fica patente logo no primeiro poema do livro de estreia de Adélia. Em diálogo com o “Poema de sete faces” (“Quando nasci, um anjo torto / Desses que vivem na sombra / Disse: Vai, Carlos, ser gauche na vida”), ela escreveu: “Quando nasci um anjo esbelto, / desses que tocam trombeta, anunciou: / vai carregar bandeira. / Cargo muito pesado pra mulher, / esta espécie ainda envergonhada”, em “Com licença poética”.
Depois de “Bagagem”, Adélia ainda lançou os livros de poema “O coração disparado”, “Terra de Santa Cruz”, “O pelicano”, “A faca no peito”, “Oráculos de maio”, “A duração do dia” e “Miserere”. Sua literatura em prosa está em “Solte os cachorros”, “Cacos para um vitral”, “Os componentes da banda”, “O homem da mão seca”, “Manuscritos de Felipa”, “Filandras”, “Quero minha mãe” e os infantis “Quando eu era pequena” e “Carmela vai à escola”.
Aos 88 anos, a escritora anunciou recentemente sua volta à literatura depois de mais de uma década do que classificou como um "deserto criativo", com uma nova coletânea, "Jardim das Oliveiras", pela Record.
(Com informações de Walter Porto, da Folhapress)