"Mineral", criado por Máximo Soalheiro, reúne 103 peças em cerâmica, com repertório que passeia pelo erudito e popular, incluindo temas de Steve Reich, Björk e Ary Barroso

crédito: Anna Lara / divulgação

 

Fruto de uma pesquisa iniciada há mais de 20 anos pelo artista plástico Máximo Soalheiro, reconhecido como um dos mais importantes ceramistas do país, o espetáculo "Mineral" volta à baila a partir deste domingo (30/6), quando será apresentado no Instituto Inhotim, às 15h. A obra, entendida como uma "instalação-concerto", estreou em 2018, com duas apresentações na Sala Minas Gerais, ocupou o palco do Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes no ano seguinte e teve seu percurso interrompido a partir da chegada da pandemia.

 


Agora, depois de Inhotim, onde será realizado próximo à obra "Elevazione (2000-2001)", de Giuseppe Penone, o espetáculo segue para São Paulo. Na capital paulista, será apresentado no emblemático Teatro Oficina, nos dias 16 e 17 de julho, e retorna a Belo Horizonte, com mais duas datas – 2 e 3 de agosto – na Sala Minas Gerais. Em "Mineral", Soalheiro aprofunda a relação da cerâmica com a música, que diz ser outra grande paixão em sua vida.


A instalação-concerto consiste em um conjunto de 103 peças em cerâmica, afinadas com alta precisão, que se presta à execução de um repertório que passeia pelo erudito e pelo popular, incluindo temas de Steve Reich, Bobby McFerrin, Claude Debussy, Björk e Ary Barroso, entre outros. O ceramista diz que sua criação pode ser entendida como um grande instrumento musical, disposto em duas séries de peças microfonadas, com sonoridade única e grande riqueza de timbres.


Instrumentistas virtuosos

 

Para dar vida ao projeto, ele se associou ao músico e designer de som Pedro Durães, que assina a direção musical do espetáculo, e a um grupo de instrumentistas virtuosos e abertos à experimentação de linguagens. Além das peças de cerâmica, tocadas com as mãos, baquetas e arco, a performance conta com baixo acústico, percussão, sopros, piano e voz. O concerto reúne os músicos Camila Rocha, Davi Fonseca, João Paulo Drummond, Kristoff Silva, Leandro César, Pedro Durães, Juliana Perdigão e Yuri Vellasco.

 

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Soalheiro remonta ao final da década de 1990 para falar do embrião de "Mineral". Ele conta que estava trabalhando com o músico Flávio Henrique na feitura do primeiro álbum solo de Marina Machado, "Baile das pulgas", lançado em 1999. "A gente fez uma experimentação com um conjunto pequeno dessas peças de cerâmica sonoras", diz. O disco foi gravado e ele seguiu de forma pontual com a pesquisa. Em 2010, o artista plástico se juntou a Pedro Durães, Kristoff Silva, Juliana Perdigão e Yuri Vellasco para ampliar o trabalho.


A partir daquele encontro, Soalheiro desenvolveu de forma mais aplicada a produção que, oito anos depois, resultou em "Mineral". O artista diz que seu interesse por música – ele chegou a fazer faculdade, mas não levou adiante – foi o que guiou esse trabalho. "Essa instalação-concerto é um reencontro com a música. É, também, uma ideia de misturar vários fazeres. 'Mineral' envolve uma estrutura, um projeto de iluminação, uma concepção cênica, enfim, tudo é trabalhado em todos os níveis", destaca.


Pesquisa de materiais

 

O artista plástico explica que, das 103 peças de cerâmica que compõem a obra, 96 são harmônicas e as outras sete, percussivas. Para realizar "Mineral", Soalheiro se dedicou à pesquisa de materiais, processos de queima e vitrificação, chegando a uma rocha muito antiga, o agalmatolito – especificamente a pirofilita –, que tem ocorrências maiores em Minas Gerais e na China. "É uma cerâmica de alta temperatura e, no processo, tem uma fase que você bate e sai som. Os parâmetros para se chegar na nota são vários: peso, altura, dimensão", diz.


Ao abrir o forno onde as peças são feitas, é possível ter certeza de que a cerâmica produzida emitirá a nota esperada ou bem próxima do ideal, conforme aponta. Ele observa que, para garantir mais precisão na emissão do som, os vasos cilíndricos de diferentes espessuras e diâmetros são micro-afinados com água adicionada no interior de cada um. Soalheiro explica que a seleção de repertório foi feita coletivamente.


"Nós todos gostamos de muitas coisas, bem diversas, mas a gente converge nessas músicas que estão no roteiro. A gente começa com uma peça do Steve Reich que é quase irritante, um som meio matemático, com repetição, iniciada com uma programação eletrônica, e que já de cara deixa todo mundo hipnotizado. Com as 96 peças de cerâmica harmônicas afinadas, você confunde o som delas com o do piano", pontua.


Nota na peça

 

Soalheiro lembra que existe um histórico grande do uso da cerâmica em música, sobretudo com um propósito percussivo, por exemplo na África e em países andinos. "O que tem de diferente aqui é que a nota está na parede da cerâmica, não depende do ar. Isso eu não sei existe em algum outro lugar do mundo", diz.


Ele chama a atenção para o fato de que o lugar onde a instalação-concerto é apresentada influencia no resultado, o que demanda estudo para adequação. "Em Inhotim vamos fazer uma sonorização que nunca fizemos, em um lugar aberto.”

 

“MINERAL”


Instalação-concerto de Máximo Soalheiro, neste domingo (30/6), às 15h, em Inhotim (Rua B, nº 20 – Brumadinho). No último domingo de cada mês, entrada franca, com retirada antecipada de ingressos pelo Sympla. Informações: https://www.inhotim.org.br/. Nos dias 2 e 3 de agosto, sexta e sábado, na Sala Minas Gerais (Rua Tenente Brito Melo, 1.090 – Barro Preto). Ingressos a R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia), à venda na bilheteria local e pelo Sympla


Repertório


"ELECTRIC COUNTERPOINT”, (1º movimento – Fast)", de Steve Reich

"EL AMOR", de Santiago Vazquez

"LAGUNA DE ÁGUA", de Carlos Aguirre

"STARS", de Bobby McFerrin

"ESTAMPES, POUR PIANO, (1º movimento – Pagodes)", de Claude Debussy

"THE ANCHOR SONG" , de Björk – Participação especial:
Juliana Perdigão

"MÚSICA DAS NUVENS E DO CHÃO", de Hermeto Pascoal

"NA BAIXA DO SAPATEIRO", de Ary Barroso

"A RÃ", de João Donato e Caetano Veloso

"SONO", de Rafael Martini