O Cine Humberto Mauro oferece, a partir desta quarta-feira (5/6), a chance de imersão na obra de um dos maiores realizadores da sétima arte com a "Retrospectiva Fellini". A programação, que se estende até 3 de julho, inclui todos os 20 longas que ele dirigiu, três curtas de antologias e um média-metragem para a TV.


A sessão de abertura será com uma cópia restaurada de "8 ½" (1963) – um dos quatro longas do italiano a ganhar o Oscar de melhor filme em língua estrangeira. Outro dos filmes de Fellini a levar a estatueta, “Noites de Cabíria” (1957) servirá de inspiração para a criação de um espetáculo a ser apresentado no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes, no encerramento da mostra.

 




Estrelada pela atriz Rejane Faria, a montagem conjuga as linguagens do cinema, do teatro e de outras expressões artísticas, com dramaturgia de Ricardo Alves Júnior e participação do grupo de teatro Quatroloscinco. A "Retrospectiva Fellini" transborda para outros espaços do complexo cultural, com intervenções artísticas especialmente criadas por artistas da Cia. de Dança Palácio das Artes e do Centro de Formação Artística e Tecnológica (Cefart), antes e depois das sessões de cinema, nos finais de semana.

 

 


Como parte das ações formativas, a programação inclui um curso ministrado pela professora Ana Lúcia Andrade, da Escola de Belas-Artes da UFMG, nos próximos dias 13 e 14. Um dossiê de críticas e ensaios inéditos assinados por especialistas brasileiros será publicado na plataforma CineHumbertoMauroMAIS, onde, no período de realização da mostra, três obras ficam à disposição: "Os boas vidas" (1953), "A doce vida" (1960) e "Julieta dos espíritos" (1965).

 

Marcello Mastroianni em "8½", longa que abre a mostra. Programação inclui documentário em que o ator aborda sua relação com Fellini

Cineriz/Divulgação


 

Gerente do Cine Humberto Mauro e curador da "Retrospectiva Fellini", Vítor Miranda diz: "Fellini é um desejo antigo nosso, porque é um dos maiores nomes da história do cinema. Nunca tínhamos feito uma retrospectiva integral dele. Estávamos planejando fazer no centenário, em 2020, mas aí veio a pandemia. Esse desejo ficou sendo fermentado". Os filmes restaurados vêm de acervos da Itália, França e Estados Unidos.


Miranda observa que os filmes de Fellini, por vezes megalomaníacos e caóticos, trabalham com o senso de espetáculo. Ele compara as obras do cineasta a apresentações circenses, muitas vezes sem uma narrativa convencional com princípio, meio e fim. O curador destaca as diferentes fases da carreira do realizador, primeiramente mais ligado ao neorrealismo italiano, com forte viés humanista e muito apegado a questões sociais, e posteriormente derivando para o onírico e o surreal, mas sem perder a agudeza crítica.


Ana Lúcia Andrade, que vai ministrar o curso "Um olhar sobre Fellini", pontua que as obras do diretor são marcadas pela dicotomia. "A visão é que a vida é maravilhosa e terrível ao mesmo tempo, com a dor e a alegria, o doce e o salgado. Ele se afasta do neorrealismo, que está muito preocupado com o cotidiano, por achar que o sonho e a imaginação também fazem parte da realidade. Fellini começa a misturar isso nas narrativas, por considerar que não é possível a um cineasta olhar a realidade sem olhar para si mesmo", afirma.

 


Segundo a professora, a partir desse momento o diretor constrói um cinema com forte carga autoral, com uma "cara" própria, a ponto de seu nome virar um adjetivo: "felliniano". Ana Lúcia diz que essa é uma qualidade aplicável a personagens não só de seus filmes, mas presentes também na obra de outros realizadores. "Ele dizia que fazer cinema é uma maneira de brincar de Deus, porque você pode colocar na tela imagens que passam na sua cabeça; elas não necessariamente precisam brotar da realidade pura."

 
Com relação aos filmes de outros cineastas incluídos na mostra, Vítor Miranda diz que alguns estabelecem diálogos diretos com a obra de Fellini, em termos estéticos ou de propostas, como "Roma, cidade aberta", de Roberto Rossellini, e outros prestam homenagem, caso de "Marcello Mastroianni: mi ricordo, sì, io mi ricordo" (1997), produção de 3h30 em que o ator, que foi uma espécie de alter ego de Fellini, aborda sua relação com o diretor.


Ele também destaca o inédito "Fellini, confidências revisitadas" (2023), com imagens de arquivo raras e o próprio diretor falando de sua vida e obra. "Os filmes de Fellini estão muito contaminados na história do cinema, então seria muito difícil pegar todos com que estabelecem diálogos. Pensei em fazer um recorte mineiro, para entender como sua obra reverbera aqui", diz, justificando a inclusão de "O palhaço", de Selton Mello, de "A família Dionti", de Alan Minas, e de dois curtas de Rafael Conde.


"RETROSPECTIVA FELLINI"
A partir desta quarta-feira (5/6) até 3/7, no Cine Humberto Mauro, no Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537, Centro). A programação completa está disponível no site da Fundação Clóvis Salgado. Entrada franca. Os ingressos podem ser retirados a partir de 1 hora antes de cada sessão, na bilheteria do cinema.

compartilhe