Memorável “Casanova” de Fellini, Donald Sutherland teve carreira tão prolífica quanto eclética por seis décadas, com cerca de 200 papéis em filmes e séries, nos quais costumava interpretar personagens conflituosos e engraçados.

 


A morte do artista canadense, de 88 anos, tirou de cena “um dos atores de cinema e televisão mais versáteis do século”, de acordo com a revista americana Variety. Donald morreu nesta quinta (20/6) em Miami, nos Estados Unidos, após enfrentar longa doença, não divulgada pela família.

 

 



 


Ator camaleônico, esse gigante de 1,93m recebeu o Oscar honorário em 2017. A silhueta elegante, o ar ausente e o sorriso enigmático lhe conferiam carisma singular. Fez papéis de vilão (um fascista em “1900”; o diretor sádico de prisão em “Condenação brutal”), passando pela comédia (“M.A.S.H”), drama histórico (“Os pilares da Terra”) e epopeias sangrentas (“Jogos vorazes”).

 

O ator como Jesus Cristo em "Johnny vai à guerra"

World Entertainment/reprodução

 


Donald Sutherland quase nunca atuou duas vezes sob o comando do mesmo diretor. Fez quase um filme por ano – trabalhou com Federico Fellini, Bernardo Bertolucci, Robert Redford, Clint Eastwood e Oliver Stone, entre outros cineastas. Fez praticamente um filme por ano.


Menino doente



Nascido em 17 de julho de 1935 em Saint John, no Leste do Canadá, Donald teve a infância marcada por graves problemas de saúde – hepatite, poliomielite e febre reumática.

 


Adolescente, tornou-se DJ de uma emissora de rádio da Nova Escócia. Formado em teatro e engenharia pela Universidade de Toronto, aos 22 anos se mudou para Londres, onde estudou na Royal Academy of Dramatic Arts. Atuou em séries cult britânicas (“O Santo” e “Bowler hat and leather boots”.

 


Estreou no cinema em “O castelo dos mortos vivos” (1964), filme de terror italiano. Em 1967, interpretou seu primeiro papel de destaque em “Os doze condenados”, longa dirigido por Robert Aldrich.

 

Donald Sutherland com o filho, o ator Kiefer Sutherland

Mario Anzuoni/AFP/19/12/2008

 


A carreira só decolou em 1971, com “Klute, o passado condena”, thriller do diretor Alan Pakula. Sutherland interpretou o detetive particular em busca do assassino perverso que ameaça a prostituta vivida por Jane Fonda.

 


O ator canadense nunca exibiu físico nos moldes de Hollywood. Gostava de mudar de aparência para seus papéis, seja com o “corte bob” e óculos escuros no antimilitarista “M.A.S.H” (1970), o grande bigode no terror “Invasores de corpos” (1979) ou os cabelos longos como Jesus Cristo em “Johnny vai à guerra” (1971).

 


“Meu nariz me deixa cético, odeio minhas orelhas, tenho mandíbula proeminente, olhos esbugalhados, um sorriso de cavalo”, disse ele à imprensa.


“Cachorro” de Fellini



O canadense protagonizou o clássico “Casanova”, de Federico Fellini, que detectou em Donald uma inquietante sensualidade.

 


“Todos os dias eu raspava a coroa da cabeça e as sobrancelhas, colocava um nariz falso. Era como seu cachorro na coleira, ele (Fellini) me levava para passear e eu adorava”, contou o ator ao jornal francês Libération. “Poderia ter terminado minha carreira ali”, resumiu.

 

Sutherland fez do ditador Coriolanus Snow, do blockbuster "Jogos vorazes", memorável vilão deste século 21

Lionsgate/reprodução

 


Em 2011, ganhou sua estrela na Calçada da Fama de Hollywood. “É melhor que uma lápide”, afirmou. “Envelhecer é como ter um novo trabalho, mas que você não teria escolhido”, confidenciou à revista americana Esquire.




CINCO MOMENTOS DE DONALD SUTHERLAND



“M.A.S.H.” (1970)


Na comédia antimilitarista de Robert Altman, três jovens cirurgiões, incluindo Sutherland, causam estragos em uma base do Exército americano na Coreia.

 

 



“Klute, o passado condena” (1971)


No thriller de Alan Pakula, Sutherland interpreta John Klute, enigmático detetive particular que busca um homem desaparecido em circunstâncias misteriosas. Durante a investigação, conhece uma profissional do sexo exótica (Jane Fonda).



“Casanova” (1977)


Não foi a primeira opção, mas Federico Fellini elegeu Sutherland para encenar sua visão do sedutor “sem alma e sem sentido”. O ator afirmou ao jornal Libération que as gravações foram “como um longo ato sexual”.

 

 



“JFK – A pergunta que não quer calar” (1991)


O filme de Oliver Stone aborda a investigação do assassinato do presidente americano John Kennedy. Sutherland interpreta Mr. X, misteriosa fonte anônima que fornece informações cruciais sobre a comitiva de Kennedy.

 

 



“Jogos vorazes” (2012-2015)


Sutherland viveu Coriolanus Snow, cruel ditador de Panem, nação surgida das cinzas nos Estados Unidos pós-apocalíptico. É o vilão que atormenta a heroína interpretada por Jennifer Lawrence.


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