Nos bastidores do Teatro II do CCBB-BH, o mineiro Leonardo Fernandes se desdobra em seis: é diretor, ator, coreógrafo, cenógrafo, cofigurinista e produtor. Observa tudo e todos, atendo-se aos mínimos detalhes. Afinal, tudo deve estar em ordem para a estreia de “Três peças que atravessam o mar” nesta quarta-feira (26/6).

 


Idealizado pelo próprio Fernandes, o projeto seguirá em cartaz até 22 de julho com três espetáculos inéditos, encenados de quarta a segunda-feira. Em alguns dias, serão apresentadas duas peças em horários diferentes.

 

 



 


As montagens já estavam no radar de Leonardo Fernandes há tempos. Ele desejava dirigir ou interpretar os textos, desde que fosse dirigido por um novo nome. Isso posto, optou pela performance de dança-teatro “A grande onda de Kanagawa”, a peça “Os que vêm com a maré” e o monólogo “Frankenstein – Fragmentos da guerra”.

 


“Todas as três têm algo em comum: falam do mar. Mais do que isso, atravessam o mar de alguma forma e o mar também atravessa os personagens de maneira muito poderosa”, destaca Fernandes.

 


“Ele (mar) assume o lugar de esperança e de fuga. É lugar obscuro, que a gente não conhece e deve atravessar para conhecer o novo.”

 

Eliatrice Gischewski e Samuel Samways em "A grande onda de Kanagawa"

Tati Motta/divulgação

 


Metáfora

 

Em “A grande onda de Kanagawa”, que abre a programação, o oceano surge de maneira literal e cristalina. Inspirado na tela homônima do artista japonês Katsushika Hokusai (1760-1849), o espetáculo escrito por Lucas Vasconcellos e dirigido por Fernandes propõe reflexões a respeito do comportamento humano.

 


A pintura de Hokusai já serviu de inspiração para murais de variados artistas, selos, marcas de roupa e até emojis, ganhando diferentes significados ao longo dos anos.

 


Na performance dirigida por Fernandes, a onda de Hokusai é metáfora da resposta da natureza diante das ações humanas que a impactam diretamente.

 

Quadro do japonês Katsushika Hokusai inspirou a peça "A grande onda de Kanagawa", que estreia na quarta-feira (26/6)

Metropolitan Museum of Art/reprodução

 


Fúria, desalento e indignação se misturam a sentimentos otimistas como esperança, confiança e amor, expressos pelos corpos de Eliatrice Gischewski e Samuel Samways. A trilha sonora será executada ao vivo por Thiago Miotto.

 


Em “Os que vêm com a maré”, o vazio beckettiano é o ponto central da dramaturgia. Um casal está à espera do filho único que saiu de casa há um mês. O garoto informou aos pais que chegará no próximo domingo, e o casal faz diferentes planos enquanto o espera.

 


À medida que o tempo passa, pai e mãe percebem que tais planos não tinham fundamento e, muito menos, relevância. Era apenas a maneira que encontraram para suprimir a solidão enquanto aguardavam o filho.

 

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Fechando a trilogia – termo que Leonardo Fernandes evita, para que o espectador não pense que uma peça é a continuação da outra –, vem “Frankenstein – Fragmentos da guerra”. Com texto de Sérgio Roveri e direção de Eliatrice Gischewski, trata-se de adaptação do clássico da escritora inglesa Mary Shelley.

 


Órfãos e mutilados

 

Interpretado por Fernandes, Frankenstein é feito de partes dos corpos mutilados de vítimas da guerra na Síria.

 


“É uma temática muito densa e pesada. Para montar o monstro, assisti a vários vídeos de crianças chorando porque perderam o pai na guerra e de pessoas com braços e pernas arrancados em bombardeios”, revela o ator.

 


Nos últimos meses, ele começava a ensaiar no início da manhã e só terminava tarde da noite. Porém, de todos os desgastes, o pior foi lidar com a dificuldade de obter patrocínio para montar os espetáculos. Fernandes afirma que não se trata de reclamação específica, mas de sua percepção após várias montagens independentes que produziu com recursos próprios.

 


“É curioso isso, porque quando falamos de economia criativa, o retorno é três, quatro vezes maior. Mesmo assim, continuamos com dificuldade para conseguir financiamento”, ressalta o ator e diretor. “Às vezes, penso que há uma distribuição não muito boa de recursos. Vemos alguns eventos recebendo milhões e milhões de reais, dinheiro que daria para montar umas 10 peças.”

 


Para levantar fundos, Fernandes é professor em diferentes cursos de atuação e faz trabalhos como ilustrador. “Dou aulas para poder investir nos espetáculos. Quanto mais perto vai chegando da estreia, mais apertado (financeiramente) a gente vai ficando. Até pensei em parar, mas não dá. O teatro tem uma força própria que puxa a gente para dentro dele”, conclui.

 


“TRÊS PEÇAS QUE ATRAVESSAM O MAR”


“A grande onda de Kanagawa”

Estreia nesta quarta-feira (26/6). Até 8 de julho, com sessões de quarta a segunda-feira, às 20h

 

“Os que vêm com a maré”

Estreia na próxima quinta-feira (27/6). Até 8 de julho, com sessões de quarta a segunda-feira, às 21h

 

“Frankenstein – Fragmentos da guerra”

De 10 a 22 de julho. Sessões de quarta a segunda-feira, às 20h

 

• Teatro II do CCBB-BH (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia), à venda na bilheteria e no site ccbb.com.br/belo-horizonte
Informações: (31) 3431-9400.

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