“A vida me fez somente do meu tamanho”. Samuel Rosa pega emprestado o verso de Erasmo Carlos (de “A banda dos contentes”, 1975) para falar de sua estreia solo. Com chegada nesta quinta-feira (27/6) às plataformas digitais, o álbum “Rosa” é um recomeço. O tom, no entanto, é de continuidade da carreira da figura de frente do Skank. Não há nenhuma grande mudança estética, mas algumas sutilezas nas 10 faixas podem apontar o novo caminho.

 


“Tenho a pretensão de fazer uma coisa totalmente diferente. Espero até que consiga, mas não vou procurar isso compulsivamente, pois posso trocar os pés pelas mãos. Resolvi começar fazendo aquilo que sei”, afirma. Agora sem gravadora – assinou com a Altafonte, distribuidora digital que promove o trabalho de artistas independentes –, Samuel compôs, produziu (com o engenheiro de som Renato Cipriano) e bancou todo o álbum. “É um mundo novo para mim”.

 





Samuel fez tudo com a banda que montou: Doca Rolim (violão e guitarra, por duas décadas guitarrista de apoio do Skank); Alexandre Mourão (que formou nos anos 1980 o grupo Pouso Alto com Samuel, em BH, e se tornou baixista por insistência do amigo, que seria o guitarrista); Pedro Kremer (teclados, ex-Cachorro Grande); e Marcelo Dai (bateria e percussão, foi lhe apresentado pelo filho Juliano). Os quatro assinam o disco como coprodutores.

 

 
“Pode parecer até incoerência. Você sai de uma banda para ir para outra? Só que agora é diferente, a palavra final é só minha. Fiquei 30 anos em outro regime, agora quero ter as rédeas”, afirma Samuel, que, para encerrar a questão sobre o fim do Skank, completa: “Já vivi três quartos da minha vida. Eu vou fazer 58 este ano (em 15 de julho), daqui a pouco tenho 60. Não quero ficar em dívida comigo se chegar até lá, com 80, 90. Olhar para trás e...‘Samuel? Começou a tocar com 16, fez psicologia na Fafich, entrou para o Skank com 25 e está lá até hoje.’ Não queria isso.”


Diz ainda que o Skank sempre foi uma democracia em que “todo o mundo colocou a sua marca”. Por outro lado, é incontornável a posição de Samuel como compositor da banda. Bom melodista, com a pena de Chico Amaral e de Nando Reis criou os grandes hits do grupo.

 

 

Em “Rosa”, coloca a cara para bater como letrista. São dele quatro das 10 faixas. Três trazem arranjo de cordas do canadense Owen Pallett, colaborador de primeira hora da banda Arcade Fire. “Rio dentro do mar” é a mais antiga do repertório, foi composta na pandemia.

 

“Não tenha dó” traz sotaque bossa-novista; “Palma da mão” é a que tem mais parentesco com o cancioneiro para multidões do Skank de “Resposta” e “Sutilmente”. A quarta canção é o single “Segue o jogo”, lançado há três semanas.

 

“Este disco é muito pessoal. Não tenho a maestria das letras, mas acho minha performance satisfatória. Poderia falar do momento atual do nosso país, poderia falar do carnaval. Mas na hora em que as letras apareciam, me causavam estranheza. Tenho que falar do ser humano, do filho que vai deixar o pai, do relacionamento que acaba. Este é o meu mote agora. Quando comecei a falar das minhas coisas, ficou mais fácil”, conta.

 

Samuel diz trabalhar “por indução”. “Sempre foi de última hora. O que vale para mim é sentar e fazer, igual a trabalho de escola”. Em janeiro, ele só tinha “Rio dentro do mar”. Queria chegar até março com seis músicas. Pois terminou o período, no estúdio Sonastério, em Nova Lima, com 10 – e mais 10 estão prontas, quem sabe poderão ser gravadas em um segundo disco.

 

Os parceiros

 

“Rosa” traz três parcerias com Rodrigo Leão, antigo colaborador do Skank. É dele a letra de “Ciranda seca” (com Samuel e Pedro Kramer), criada para a personagem Dinorah, da série “Cangaço novo”. Com destaque para guitarra e percussão, a canção explora a marca de Samuel como vocalista que sabe conduzir o ouvinte para o refrão. As outras são “Tudo agora” e “Aquela hora”.

 
O disco também inaugura parcerias com Carlos Rennó, egresso da Vanguarda Paulistana (“Bela amiga” e “Me dê você”) e João Ferreira, vocalista do grupo mineiro Daparte (“Flores da rua”). “Aquela hora” e “Bela amiga”, as duas de sotaque mais roqueiro (das poucas com duas guitarras, com Doca e Samuel), são as mais inspiradas.


Outro canto

 

“Aquela hora” é a faixa de número quatro. Nela, a percepção fica clara: Samuel está cantando em tom mais baixo. “Isso é muito Erasmo Carlos”, comenta, falando sobre a canção que trata da separação de pai e filho. Diz ter adorado abaixar o tom. “Cantei num tom mais de gente velha. Sempre cantei no tom mais alto. ‘Velocia’ (2014, último álbum de inéditas do Skank) é todo gritado.”

 

“Bela amiga” é solar, dançante, cheia de barulhinhos, com um coro que convida a cantar. Ou seja, pop em essência, mas menos festiva do que a produção com o Skank. A comparação é inevitável e Samuel tem consciência disso. “Até porque tenho mais de 30 anos de carreira, e no Skank a gente fez muita coisa, né?”

 

De malas prontas para o agora e “abestalhado” de alegria desde o nascimento da filha Ava, em março, sua primeira com Laura Sarkovas, Samuel fala do hoje. “Em alguns momentos, tenho uns arroubos de juventude. Às vezes me sinto jovem quando estou fazendo uma coisa diferente. Com o passar dos anos, você vai perdendo isso, mas tem que manter por questão de sobrevivência. Talvez seja atrás disso que eu esteja”, conclui.

 

No palco

 

A turnê de “Rosa” começa em 2 de agosto, em São Paulo. Em BH, o show de estreia será em 17 do mesmo mês, no BeFly Hall (antigo Arena Hall). Ingressos de R$ 90 a R$ 300, na bilheteria e na plataforma Sympla.

 

“ROSA”


• Álbum de Samuel Rosa
• 10 faixas, independente
• Lançamento nesta quinta (27/6), nas plataformas digitais

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