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Vida e morte de Raul Seixas, o "Maluco Beleza", renderam casos bizarros e 1.001 lendas

crédito: Paramount Brasil/divulgação

 

 

Raul Seixas é um dos maiores roqueiros brasileiros. Seu comportamento era tão rock’n’roll que ultrapassou a música e virou até caso de polícia. Além de ficar sob a mira da ditadura militar (1964-1985), o eterno Raulzito participou de uma gangue e foi preso em show após ser confundido com um sósia.

 


Fã de Elvis Presley, o adolescente Raul Seixas se juntou ao amigo Waldir Serrão e fundou o Elvis Rock Club em 13 de julho de 1959, em Salvador. O clube, na verdade, era uma espécie de gangue que procurava brigas nas ruas da capital baiana, fazia arruaças, roubava bugigangas, quebrava vidraças e vandalizava prédios.

 

Posteriormente, Raul confessou que não gostava muito daquelas atividades, mas participava dos rolês para ter uma maneira “rock and roll” de ser.

 

 

 


Nos anos 1970, o cantor e compositor foi perseguido pelo governo militar, especialmente após o lançamento da canção “Sociedade alternativa”, tida como crítica à ditadura. Em 1974, ele foi abordado por policiais depois de um show, preso e torturado por duas semanas.

 

Tortura e exílio

 

Em entrevista para o jornal Folha de São Paulo, o roqueiro contou que, na sede carioca do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), foi mantido em um local subterrâneo, apanhou e levou choques. Após o episódio, passou um ano nos Estados Unidos, exilado.

 

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Em 1982, Raul Seixas já não estava nos melhores dias da carreira, lidando com críticas e vendas em baixa. Quando fez um show na cidade de Caieiras (SP), durante festa organizada pela prefeitura para pouco mais de 300 pessoas, a animação logo virou confusão.

 


“Quando começou o show, vi aquele povo lindo ficar agitado, jogar garrafas, latas de cerveja. Comecei a ficar nervoso. Acho que foi um boato de que não era eu quem estava cantando”, afirmou Raul à TV Globo.

 


Porém, houve relatos de que ele estava bêbado no começo da apresentação. Com as vaias e ameaças de linchamento, teria desistido do show e se dirigido ao camarim. Um policial foi chamado pelos fãs, que exigiram a prisão do “falso Raul”.

 

 

 


Na entrevista, o cantor contou que foi levado para a delegacia. O próprio delegado disse que não se tratava do verdadeiro roqueiro. “Chegou logo me batendo”, denunciou.


Garantindo que conhecia o legítimo Raul Seixas, o delegado puxou a barba do cantor para saber se era verdadeira, tirou os óculos dele. As agressões deixaram marcas nos braços e olhos.

 


“Vou exigir do secretário de Segurança que o delegado que me bateu, que espancou a mim, seja punido. Vou exigir que se processem na Justiça, bravamente, os patrocinadores do show e quem quer que deturpe os fatos que aconteceram”, afirmou Raul.

 

Cheque sem fundos

 

A confusão só foi desfeita após o músico conseguir falar com a esposa. Angela levou até Caieiras documentos que comprovavam que não se tratava de um farsante. Porém, antes disso, Raul passou mais de duas horas em meio a “testes” para provar sua verdadeira identidade.


Dias depois, durante entrevista coletiva, o músico afirmou que os próprios promotores do show levaram o público a acreditar que ele era um sósia. Motivo: a falta de dinheiro para o pagamento do cachê, de 700 mil cruzeiros. Os produtores lhe deram um cheque de 500 mil, que não tinha fundos.

 


“Sou um artista, uma pessoa pública. Isso me deixa muito nervoso”, lamentou. Os organizadores e o prefeito da cidade foram processados.

 

Pra não dizer adeus

 

Aos 44 anos, Raul Seixas foi encontrado morto em casa no dia 21 de agosto de 1989, vítima de parada cardíaca decorrente de pancreatite aguda.

 

Músico e amigo pessoal de Raul, Marcelo Nova contou a seu biógrafo, André Barcinski, que os fãs tentaram sair com o caixão e levar o corpo do “Maluco Beleza” para “curtir” pela última vez. O corpo foi velado em São Paulo e enterrado em Salvador.

 

 

Com Marcelo, baiano como ele, Raulzito gravou o último álbum em vida, “A panela do diabo”, lançado poucos dias antes de sua morte.

 

“Aquilo foi tão surreal que fez a obra de Salvador Dalí parecer um desenho de Walt Disney! (...) Começamos a ouvir um barulhão do lado de fora, e de repente uns 80 ou 100 malucos invadem a igreja cantando 'Viva/ Viva/ Viva a sociedade alternativa!', correm pra cima do caixão e saem de lá levando o caixão!”, narrou Marcelo.

 

O próprio Marcelo Nova conseguiu acalmar a multidão. “Eles queriam levar o corpo de Raul para passear, fumar maconha, enfiar baseado na boca dele! Eles gritavam: ‘Raul não morreu! Ele tá vivo! Vamos levar ele para tomar uma!’”, contou o parceiro.

 

Incrédulos, familiares e amigos de Raul assistiam à cena bizarra. “Ao mesmo tempo, a mãe dele (Maria Eugênia Pereira dos Santos) me dizia: ‘Marcelo, se Raul pudesse ver isso, ele ia adorar!’.” Dona Maria Eugênia morreu bem depois do filho, em 2002.

 


“Tinha gente que se jogava no meio do caminho: ‘Não enterrem Raulzito!’, um negócio completamente louco, fora de controle'”, lembrou Marcelo Nova.


 

ENTRE ACORDES


A série do Estado de Minas, com oito reportagens, conta histórias e curiosidades do mundo da música envolvendo grandes nomes do rock mundial e seu impacto na cultura pop.