Natural de Belo Horizonte, Lélia Gonzalez (1935-1994) foi importante professora, intelectual e ativista do movimento negro. Formou-se em história e geografia e, posteriormente, filosofia, estudou psicanálise, conduziu pesquisas sobre cultura negra e fundou o Movimento Negro Unificado (MNU). Para a escritora, era caro entender o racismo e o sexismo na cultura brasileira. Seu ativismo político e produção de saberes contribuíram para a formação do feminismo negro.
O projeto Memória, criado pela Fundação Banco do Brasil, desembarca em Belo Horizonte dedicado a celebrar vida e obra da pensadora mineira. Nesta quarta (10/7) e quinta (11/7), das 18h30 às 22h, no CCBB BH, um documentário e seminários conduzidos por estudiosas da obra de Lélia Gonzalez serão apresentados. Um livro fotobiográfico gratuito em formato de e-book, “Caminhos e reflexões antirracistas” e o “Almanaque pedagógico” também integram o projeto.
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“A homenageada, Lélia González, é um nome importantíssimo ao se pensar na intelectualidade negra brasileira”, afirma a arte-educadora Carlandréia Ribeiro, que atuará como mediadora no segundo dia de seminários. “Embora o machismo e o sexismo atinjam todas as mulheres de diferentes classes sociais, Lélia trouxe a discussão de que precisávamos fazer um recorte de raça, colocando em pauta o feminismo negro e a interseccionalidade.”
Descolonização de BH
Durante visita ao Brasil em 2019, Angela Davis, feminista estadunidense e referência na luta contra o racismo e o machismo, destacou a relevância de Lélia Gonzalez nas discussões acerca do feminismo negro.
“Por que vocês precisam buscar uma referência nos Estados Unidos? Eu aprendo mais com Lélia Gonzalez do que vocês comigo”, disse a ativista em palestra realizada em São Paulo. Davis citou nomes como Marielle Franco, Luiza Bairros e Carolina Maria de Jesus como representantes do feminismo dedicado aos recortes de raça.
Carolina Maria de Jesus e Lélia Gonzalez, inclusive, são as primeiras mulheres negras a ganhar estátuas em Belo Horizonte em uma tentativa de reparar desigualdades raciais e de gênero na cidade. Instaladas no Parque Municipal, as obras de bronze em tamanho real foram inauguradas no último mês e retratam a escritora e a filósofa lado a lado.
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“Etiene Martins, que também atua como mediadora do primeiro seminário do Memória, foi uma das idealizadoras das esculturas”, diz Carlandréia Ribeiro. “A conquista faz parte de um processo de descolonização de Belo Horizonte. Agora temos duas mulheres estudiosas negras representadas em um lugar público muito importante. É uma forma de visibilizar nossas existências dentro da cidade.”
Olhar africano
Jornalista e colunista de Diversidade do Estado de Minas, Etiene Martins mediará o debate com o tema “A influência de Lélia Gonzalez na luta antirracista e antissexista”. A Carlandréia Ribeiro cabe a mediação do dia seguinte, na mesa com Ieda Leal, Luana Tolentino e Angelica Luiza de Castro para discutir o pensamento decolonial e a contribuição de Lélia Gonzalez para a educação.
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“As três convidadas são intelectuais de grande importância na atualidade no que diz respeito à discussão da educação antirracista no Brasil. Quando falamos em educação descolonial, nos referimos a uma educação que parte da desconstrução do olhar eurocêntrico sobre o nosso ensino. É preciso considerar os saberes e as tecnologias sob olhar africano e ‘amefricano’, como traz Lélia González. Descolonizar os currículos significa considerar questões, conceitos e modos de pensar a vida que descendem dos povos africanos no Brasil”, conclui Carlandréia Ribeiro.
* Estagiária sob supervisão da subeditora Tetê Monteiro