Milhões de pessoas, no Brasil e fora, conhecem as histórias de Aguinaldo Silva. Mas poucas, muito menos do que ele gostaria (e merece), leram suas histórias. Com chegada nesta quarta (10/7) às livrarias, “Meu passado me perdoa” (Todavia) pode (e merece) reverter esta situação.

 


Nessas memórias, seu 18º livro publicado, o jornalista, dramaturgo e escritor, de 81 anos, conta a história de sua própria vida. Que não daria um filme, mas uma baita novela. Tem drama, comédia, suspense, fantasia, aventura, romance.

 



 


Tudo começa com o menino “pobre, feio, esquisito e efeminado” de Carpina, cidade de Zona da Mata pernambucana de onde Aguinaldo saiu no início da adolescência.

 


O primeiro lance dramático, aquele que lhe levou a entender que deveria ser “cínico e dissimulado” para sobreviver, aconteceu no colégio. Tinha 13 anos quando foi “eleito” Rainha da Primavera, “título” seguido de uma sequência absurda de agressões.

 


“Meu passado me perdoa” é dividido em três grandes seções. A inicial, que segue a vida em Pernambuco durante infância e adolescência, tem pegada quase de realismo fantástico. Acompanha o garoto Aguinaldo nas ruas do Recife do final dos anos 1950 encontrando seus pares.

 

Querubina



Ali, entre garotos gays, as “arlequetes”, todos rebatizados com nomes femininos (ele se tornou a Querubina), descobriu a amizade e conheceu figuras que, mais tarde, o inspirariam nas novelas.

 


Os grandes autores foram sua formação, tanto que aos 16 “a imodestíssima pessoa” já tinha escrito três romances. O primeiro a ser publicado foi “Redenção para Job” (1961), lançado por Fernando Sabino na Editora do Autor. Os originais chegaram ao mineiro no Rio de Janeiro junto à carta em que Aguinaldo, então com 17, se apresentava como “um caso raro de precocidade e intuição”.

 


Em junho de 1964, com emprego garantido no jornal Última Hora, em São Paulo, decide desembarcar no Rio, onde o voo do Recife fazia escala, ao se lembrar das palavras que Clarice Lispector lhe disse ao pé do ouvido na primeira vez que a viu: “Tem certeza de que você não é uma menina?”.

 


Começa a segunda parte do livro, em que Aguinaldo, em plena ditadura militar (1964-1985), atua na imprensa carioca. Deixa marcas na crônica policial, mas também edita o primeiro jornal gay do país, Lampião da Esquina; vive seu maior amor (relação que hoje chamariam de tóxica, na Lapa da época de Madame Satã); é preso por 70 dias na Ilha das Flores, entre o final de 1969 e o início de 1970, por ter escrito o prefácio de “Diário”, de Che Guevara.

 


Na terceira e última parte, ele se debruça sobre suas quatro décadas de teledramaturgia – primeiramente em séries e depois em 16 novelas, todas do horário nobre da Globo. Há algumas revelações, elogios aos que lhe são próximos e comentários sobre aqueles com quem teve problemas.

 

Fora da Globo


A tão propalada saída da Globo, no início de 2020, daria um curta-metragem. Tudo começa com um telefonema, na manhã de 1º de janeiro no Estoril, arredores de Lisboa (Aguinaldo viveu na capital portuguesa e mantém apartamento em São Paulo), com ele ainda sob efeito do álcool da virada do ano. O leitor não fica sabendo quem estava do outro lado da linha lhe comunicando, em pleno feriado internacional, que seu contrato não seria renovado.

 

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O desencadeamento da história é narrado com riqueza de detalhes. O leitor também percebe o sabor com que Aguinaldo arremata esta história – graças às reprises de suas novelas durante a pandemia, mesmo “demitido” da Globo, continuou por quase dois anos recebendo salário da emissora.

 

Em paz com o passado, Aguinaldo tem um novo romance para ser publicado em breve. Com fôlego para mais, afirma que ainda daria conta de duas novelas. Histórias não lhe faltam.




“MEU PASSADO ME PERDOA”


De Aguinaldo Silva

Todavia

400 páginas

R$ 89,90 (livro)

R$ 69,90 (e-book).




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