Imagine sentar-se em uma poltrona, em meio à plateia de um espetáculo, sem saber que, dali a alguns instantes, você será sequestrado. Ou se coloque no lugar de uma atriz que não quer abandonar um teatro prestes a ser demolido. Há ainda a possibilidade de se projetar como integrante da companhia de atores que tem sua temporada interrompida por um golpe de Estado.

 




Três pessoas presas em espaços-tempo distintos, mas de alguma forma conectadas pelo lugar do edifício teatral. Esse é o mote do texto “O mundo está em chamas, o teatro também tem de estar”, da Cia. Teatro da Fumaça, que será apresentado nesta quinta (18/7), às 19h30, no Memorial Vale.

 

Arquitetura perfeita


Em desenvolvimento, a pesquisa caminha para se tornar um espetáculo, com previsão de estreia em dezembro, no Teatro de Bolso do Sesc. “Há muito tempo sentia o interesse de falar do espaço do teatro enquanto personagem”, diz o diretor e dramaturgo Jean Gorziza.

 


“A arquitetura do teatro se molda à história do lugar, se ele está num espaço central da cidade, de como é um teatro no Brasil ou um teatro em outro país. O texto é uma investigação a partir da relação do teatro enquanto protagonista”, explica.


O enredo é inspirado em três eventos reais ocorridos nos últimos 70 anos: o fechamento, abandono e destruição da estrutura do Teatro de Câmara Túlio Piva, em Porto Alegre, a partir de 2014; o sequestro de toda uma plateia, elenco e profissionais no Teatro de Dubrovka, em Moscou, em 2002, por terroristas; e a interrupção da temporada da brasileira Companhia de Teatro de Revista Walter Pinto, em Buenos Aires, pelo golpe militar de 1955.


“Buscamos compreender como o espaço do teatro não é alheio ao contexto político, social e histórico em que ele está inserido. A partir disso, vem o desejo de ir atrás de outros espaços que se relacionam com a visão da dramaturgia que fala do teatro como ele mesmo, que se coloca em pé, defende e sobrevive a qualquer ameaça em diferentes contextos”, afirma o diretor.


Na perspectiva da leitura de um texto que diz sobre situações semelhantes, a Cia. Teatro da Fumaça estará diante da plateia no Memorial Vale pela última vez, pelo menos por um tempo. O espaço, no fim de julho, suspenderá as atividades presenciais. O memorial será reestruturado e ganhará nova expografia.

 

 

Leitura dinâmica


A leitura da peça será dinâmica, de maneira a preencher os espaços do palco. Gorziza afirma que apresentá-la antes da conclusão é uma maneira de torná-la mais próxima e palpável para o público. Ao inserir a realidade belo-horizontina no universo da peça, “cria-se outra temporalidade”, diz ele.


“A apresentação tem acompanhamento musical ao vivo. É, de fato, leitura dramática, mas com caminhos performativos e de ação de movimento definidos”, acrescenta.

 

Gorziza revela como ocorre a criação do espetáculo. “Está sendo muito único, pois o processo de construção serve para podermos fugir de um certo discurso hermético do que é o teatro. Já existe o ponto de vista de quem está atuando, escrevendo e dirigindo, mas , de algum modo, o próprio público, enquanto recepção, tem outra percepção. Para nós, é importante falar do espaço do teatro e ouvir a plateia com todas as suas indagações, ainda mais se trazemos o teatro como espaço de resistência e disputa de territórios”, conclui.

 

 

“O MUNDO ESTÁ EM CHAMAS, O TEATRO TAMBÉM TEM DE ESTAR”
Leitura de texto. Com Cia. Teatro da Fumaça. Nesta quinta (18/7), às 19h30, no Memorial Vale (Praça da Liberdade, 640 – Funcionários). Entrada gratuita, mediante retirada de ingressos uma hora antes da sessão. Informações: (31) 3308-4000.

 

* Estagiária sob supervisão da subeditora Tetê Monteiro

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