Se Milton Nascimento, Fernando Brant, Toninho Horta, Wagner Tiso, Beto Guedes, Flávio Venturini, Márcio e Lô Borges tivessem se encontrado em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador ou no interior de Minas, é improvável que a sonoridade das canções criadas por eles existisse. É o que defende o historiador e professor Bruno Viveiros Martins no livro “Clube da Esquina: Trajetória musical” (Oca/Azougue Editorial), que será lançado nesta terça-feira (13/8), na sede da Sociedade Mineira de Engenheiros, em BH.
Martins traça o paralelo entre a capital mineira e a sonoridade do Clube da Esquina. No longo ensaio, o historiador desenha o mapa musical da cidade e sugere que criações do grupo são responsáveis por reverter desencontros promovidos por BH.
“Cidades determinadas criam vazios”, afirma Bruno Martins. “Quando a gente pensa que Belo Horizonte é uma cidade planejada, determinada, que tem o tabuleiro de xadrez dentro da Avenida do Contorno – o projeto delimitou, de maneira extremamente autoritária e excludente, o espaço de cada habitante ali dentro, dos burocratas aos comerciantes e militares –, vemos que tudo é feito para desencontrar. Porém, a música do Clube da Esquina vem preencher vazios, numa espécie de reencontro com a cidade”, acrescenta.
"Som imaginário"
Não é a primeira vez que Bruno Viveiros Martins se debruça sobre o tema. Em 2009, lançou “Som imaginário: A reinvenção da cidade nas canções do Clube da Esquina” (Editora UFMG) e, nos últimos anos, realizou palestras sobre a influência do movimento musical na cena cultural do país.
“Hoje, a gente fala que o Clube da Esquina é um movimento cultural. Mas entre as décadas de 1970 e 1980, ele não era considerado como tal. Era visto como um grupo de amigos que se encontraram e começaram a tocar juntos coisas diferentes”, diz Martins.
Veja Milton Nascimento e Lô Borges cantando "Clube da Esquina 2":
O tratamento era outro, por exemplo, no caso da Tropicália, a partir do lançamento de “Tropicalia ou Panis et Circencis” (1968), disco-manifesto de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa, Os Mutantes, Tom Zé, Nara Leão, Capinam e Torquato Neto. Ou mesmo do Manguebeat, quando os pernambucanos Chico Science e Fred Zero Quatro assinaram manifesto e o divulgaram aos meios de comunicação, na década de 1990.
Da seresta ao jazz e rock progressivo
Músicos do Clube da Esquina, ainda que compusessem canções com sonoridades semelhantes, não tinham as mesmas referências.
Beto Guedes cresceu ao som da seresta e do choro de seu pai, Godofredo, mas acabou influenciado pelos Beatles. Lô Borges gostava mais de rock progressivo, Toninho Horta preferia jazz e bossa nova. Milton Nascimento trazia as trilhas de cinema, a cultura negra e cantos litúrgicos. O pianista Wagner Tiso tinha formação erudita.
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“Não é movimento com princípio, meio e fim. É mais um movimento imaginário, que a gente não sabe nem quando começou e nem quando terminou. Tem quem considere o início do Clube da Esquina com ‘Travessia’, em 1967; outros acham que ele surgiu com o álbum ‘Clube da Esquina’, em 1970; e há quem acredite que o movimento só se fez presente em 1972 e 1978, com os discos 'Clube da Esquina’ e ‘Clube da Esquina 2’”, afirma Bruno Viveiros Martins.
É curioso o afinco dos fãs para determinar o que, de fato, significa o Clube da Esquina, pois nem sequer os músicos que participaram dele se preocupam com isso.
“O Clube da Esquina era um pedaço de calçada onde eu ia encontrar com os amigos em Santa Tereza, porque não tinha grana para comprar ingresso no clube social”, disse o cantor e compositor Lô Borges, certa vez, referindo-se ao “proibitivo” local frequentado pela elite no bairro da Região Leste de BH.
“CLUBE DA ESQUINA: TRAJETÓRIA MUSICAL”
• De Bruno Viveiros Martins
• Editora Oca/Azougue Editorial
• 213 páginas
• R$ 58
• Lançamento nesta terça-feira (13/8), às 14h30, na sede da Sociedade Mineira de Engenheiros (Rua Timbiras, 1.514, 2º andar, Centro), com palestra do autor.