Duzentas e trinta atrações, alcançando a marca de mil artistas, passaram por 15 espaços de Belo Horizonte na Virada Cultural. Foram mais de 24 horas de apresentações, das 18h de sábado (24/8) às 19h de domingo (25/8), com direito às tradicionais gaymada, corrida de rolimã e festas. Tais números são superlativos em qualquer situação. Mas esta edição comprovou um movimento iniciado nos últimos anos. A Virada está ficando menor, tanto em número de atrações quanto de público.
Menor não quer dizer pior, diga-se. Apenas outro formato, com palcos menores e artistas com menos apelo popular. No entanto, o conceito da edição de estreia (2013) continua o mesmo: ocupação da área central de BH com acesso gratuito e a maior diversidade possível de atrações.
“Revisitar esse repertório é motivo de muito orgulho para nós. Trinta anos depois, a criança continua jovem”, afirmou Lenine no Parque Municipal, lotado, durante o show de encerramento da Virada, no início da noite de domingo (25/8).
A “criança”, no caso, é “Olho de peixe” (1993), disco do cantor e compositor pernambucano com o percussionista carioca Marcos Suzano. Este segundo trabalho da carreira de Lenine o projetou nacionalmente.
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No palco, a dupla foi acompanhada do flautista Carlos Malta (que participou das gravações do álbum) e de quatro percussionistas, Gabriel Policarpo, Nega Deza, Raquuel Coutinho e Jovi Joviniano.
O show começou com “Acredite ou não” (Lenine e Bráulio Tavares), primeira faixa do disco. “Olho de peixe” foi executado na íntegra e na ordem, com suas 11 faixas. BH foi o segundo local em que ele e Suzano revisitam o disco (a estreia ocorreu em janeiro, no Rio).
Encerrado o repertório do álbum, a apresentação seguiu com canções de “O dia em que faremos contato” (1997), disco mais conhecido do compositor. “Esta maratona merece vida longa”, acrescentou Lenine, que deixou o palco Fecomércio às 18h55, depois do sucesso “A ponte”.
Filas pra ver Lagum
Com a reforma da Praça da Estação, até então o palco principal da Virada, a vizinha Rui Barbosa foi convocada. A área da Estação é muito maior, assim como o campo de visão. No show do Lagum, o mais cheio da noite de sábado (24/8), houve filas e dificuldade para atingir o local, com apenas um acesso.
Foi também o show mais longo da noite (100 minutos), com grande interação com o público. Em “Eu não valho nada”, a surpresa: MC Vitin da Igrejinha subiu ao palco com “Baile do morro”, sucesso no TikTok.
Os antecessores do Lagum, Mangaia, Douglas Din e Laura Sette, todos na praia do hip-hop, se apresentaram para público pequeno. A popularidade da banda pop mineira é inconteste. Mas a impressão que se teve, no caminhar pela região, era de que as pessoas esperaram a noite cair para ir à Virada.
Em um passado nada distante, o início do evento já levava muita gente para as ruas. Porém, o movimento cresceu com o decorrer da noite de sábado, não só na Rui Barbosa, como nas praças Sete (com forró de um lado e música eletrônica do outro, em festas que vararam a madrugada), Raul Soares e Parque Municipal.
Indígenas no palco
O parque recebeu atrações em diferentes locais. Não só shows, mas oficinas, piqueniques, aulas de dança – no domingo, o público da Virada se misturou aos frequentadores do parque e da Feira Hippie. O principal espaço foi o Fecomércio, que encheu no sábado com o show “Pindorama vive”, da cantora sergipana Héloa ao lado do grupo indígena Sabuká Kariri-Xocó.
No domingo (25/8), um bom número de cantores e compositores de BH passou pelo local, como a banda Graveola. Foi uma apresentação intimista, de trio – Joana Bentes, José Luis Braga e Thiago Correa, só voz, violões e baixo. Em dado momento, Júlia Branco se juntou a eles para cantar “Horizonte”.
Com a temperatura na casa dos 30°C à tarde, quem conseguiu assistiu aos shows nas áreas de sombra do Parque Municipal. Com Belo Horizonte enfrentando longo período de estiagem e baixa umidade do ar, só mesmo com muita água e cerveja para aguentar a maratona diurna da Virada.
Praça do Samba
Novidade nesta edição, Praça do Samba “rebatizou” a Raul Soares. Foi um dos acertos não só pelo tom dos shows, mas por resgatar um espaço essencial da capital mineira, escanteado durante muitos anos. A revitalização não é só da praça da década de 1930, mas de todo o seu entorno (Edifício JK, bares e restaurantes, com destaque para a Galeria São Vicente, reocupada nos dois últimos anos).
Funcionou para os shows, com o palco baixo que recebeu dezenas de cantores e instrumentistas de samba, pagode e choro. Na noite de sábado (24/8), o movimento foi tranquilo – o espaço se dividiu entre o palco e performances em outras áreas da praça. Uma das melhores foi a da fanfarra Belina Orkestar, coletivo que toca música dos Bálcãs.
Só que a Raul Soares tem vegetação baixa, com raras árvores de porte. No domingo (25/8), as poucas áreas de sombra foram tomadas pelo público nos intervalos. Na hora das apresentações mais disputadas, a temperatura subiu. Mas diante do criador de hits Toninho Geraes e da musa Adriana Araújo, os fãs nem se importaram.
É como diz o sucesso de Toninho: “Quem tem a alma boêmia/ Não consegue segurar.”
*Colaboraram Cecília Amaral e Túlio Santos