Estouro de barragem obriga Joana (Fernanda Vianna) a deixar Minas para morar com o garoto Jaime (Kalleb Oliveira) e a irmã, Tânia (Andrea Marquee), em São Paulo -  (crédito: Vitrine Filmes/divulgação)

Estouro de barragem obriga Joana (Fernanda Vianna) a deixar Minas para morar com o garoto Jaime (Kalleb Oliveira) e a irmã, Tânia (Andrea Marquee), em São Paulo

crédito: Vitrine Filmes/divulgação

 


Em “Cidade; Campo”, Juliana Rojas explora o tema da migração a partir de duas perspectivas: o êxodo rural, por meio de Joana, que perdeu tudo com o rompimento de uma barragem em Minas Gerais; e a decisão de trocar a cidade grande pelo interior, caminho escolhido pelo casal Flávia e Mara.

 

 

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“Era muito importante trazer os dois lados, tanto da cidade quanto do campo. Determinei que cada parte teria seus personagens e eles não se cruzariam. No entanto, as histórias têm elementos de rima e contraposição, quase como se se espalhassem”, afirma Juliana Rojas, diretora e roteirista do longa.

 

 

 


O filme tem dimensão quase episódica. Cidade e campo não se misturam, mas, apesar dos núcleos distintos de tramas e personagens, há temas comuns tanto à história de Joana, interpretada pela mineira Fernanda Vianna, quanto à de Flávia (Mirella Façanha).

 

 Atrizes Bruna Linzmeyer) e Mirella Façanha estão sentadas à mesa em cena do filme Cidade, campo

O casal Mara (Bruna Linzmeyer) e Flávia (Mirella Façanha), ao migrar da cidade para o Mato Grosso do Sul, tem contato com dimensões do fantástico que marcam o Brasil profundo

Vitrine Filmes/divulgação

 


A casa e todos os bens de Joana desaparecem após o rompimento de uma barragem em Minas. Sem perspectiva, ela vai para São Paulo viver com a irmã, Tânia (Andrea Marquee), e o sobrinho-neto Jaime (Kalleb Oliveira).

 


Longe da natureza, a agricultora Joana passa a fazer faxina na cidade, por meio do aplicativo Diarex, enfrentando a precariedade das formas de trabalho contemporâneas. Juliana já havia abordado esse tema no longa de terror “Trabalhar cansa” (2011), em que dividiu a direção com Marco Dutra.

 


“Joana foi construída com base nos relatos de vítimas e de parentes de vítimas dos rompimentos das barragens de Minas. É tudo muito doloroso. A personagem é construída a partir da perda”, afirma a atriz Fernanda Vianna.

 


“Ela vai para um lugar totalmente inóspito e precisa lidar com as consequências do que aconteceu. Também me inspirei nas mulheres mineiras da minha infância. Extremamente fortes, por vezes até secas, mas de uma generosidade gigante. São mulheres que choram para dentro”, comenta.

 


Kikitos

 

Integrante do Grupo Galpão, Fernanda coleciona trabalhos na TV, cinema e palcos. Em agosto, o júri do Festival de Gramado deu a ela o prêmio de melhor atriz. “Cidade; Campo” também levou o Troféu Kikito na categoria melhor filme/escolha do júri.

 

 

Juliana Rojas conta que há muito tempo desejava falar do drama das barragens.

 

“Os crimes ambientais de Mariana e Brumadinho me marcaram muito. Tenho família mineira, embora não dessas regiões, mas construí uma relação com o estado. Acompanhei histórias de pessoas que perderam parentes, animais de criação e o território em que viviam. Os relatos dos sobreviventes, para além do trauma gerado pelas mortes e desaparecimentos, falam bastante sobre a dificuldade de adaptação a um novo lugar”, explica a cineasta.

 

 

 

Em fevereiro, o filme estreou no Festival Internacional de Cinema de Berlim, na Alemanha. Juliana conquistou o Urso de Ouro de direção na mostra Berlinale Encounters. Lá, Joana foi classificada como “refugiada climática”, mas a protagonista Fernanda Vianna não concorda com o termo.

 

“Ela é refugiada de um capitalismo desumano e ganancioso. Todo refugiado climático vem a ser um refugiado do capitalismo e do neoliberalismo. Joana é vítima da falta de escrúpulos com que as mineradoras operam”, ressalta a atriz mineira.

 

Herança

 

Na segunda parte, o filme se passa no Mato Grosso do Sul, onde o casal Flávia e Mara (Bruna Linzmeyer) decide recomeçar a vida após Flávia herdar uma propriedade com a morte do pai. Neste mergulho no passado, aparições e barulhos misteriosos rondam a fazenda.

 


“Gosto de usar elementos do fantástico, porque permitem acessar o nosso inconsciente, um lugar mais lúdico. A ideia é que fosse construída uma progressão desses traços. O filme começa mais concreto, na cidade, e aos poucos se torna mais onírico e fantasmagórico”, diz Juliana Rojas.

 


O objeto vermelho que se aproxima da Lua, presente nas duas partes do longa, confere à história clima pré-apocalíptico que se intensifica a partir das experiências de Mara e Flávia. O luto é outro tema, seja proveniente da cidade submersa na lama, de animais perdidos ou de um parente morto.

 


“Apesar de personagens viverem um momento de transformação e da sensação de apocalipse iminente, queria que a história trouxesse esperança. Mesmo que as pessoas estejam vulneráveis e oprimidas por uma estrutura que está destruindo o planeta, elas ainda podem encontrar possibilidades para sobreviver e amar”, conclui Juliana Rojas.

 

 


“CIDADE; CAMPO”


(Brasil, 2024, 120min.) Direção: Juliana Rojas. Com Fernanda Vianna, Andrea Marquee, Bruna Linzmeyer e Mirella Façanha. Filme em cartaz às 16h10, na sala 3 do UNA Cine Belas Artes. Também haverá exibições nesta quinta (29/8) e na próxima quarta-feira (4/9), às 20h30, na sala 2 do Centro Cultural Unimed-BH Minas.


* Estagiária sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria