A cidade fluminense de Paraty e a mineira Diamantina estão a 866 quilômetros de distância uma da outra. No século 18, o trajeto era percorrido por escravizados para levar ouro e diamantes até o porto. Quatro séculos depois, ainda restam construções e muitas histórias naqueles velhos caminhos para as Minas Gerais.

 


Paraty, Diamantina, São Thomé das Letras e Itabira são o cenário onde as irmãs Penélope (Luciana Paes) e Joana Caldas (Thati Lopes) procuram um tesouro, a bordo de seu carro velho, na comédia “Saideira”, que estreia nesta quinta-feira (8/8) nos cinemas do país.

 

 



 


Neste filme dirigido por Júlio Taubkin e Pedro Arantes, a preciosidade perdida é a cachaça Saideira, herdada de Honório (Tonico Pereira), avô da dupla. Quase personagem central da comédia, a bebida pauta a relação das irmãs.

 


“Acho engraçado, porque tem uma dinâmica que se repete em muitas famílias, a das pessoas que ficam e das pessoas que vão. A Penélope parte, a Jô fica. Elas têm uma complementaridade muito grande, diria que são meio ying e yang. Penélope vai para o mundo, assume o lugar mais masculino, é bem-sucedida e workaholic, mas falta a ela o lugar de pertencimento, de afeto, que a Jô tem de sobra”, afirma Luciana Paes.


Química

 

Há humor nas personalidades opostas das irmãs e na química entre as duas atrizes, que trilharam os caminhos da comédia no coletivo Porta dos Fundos. Penélope, que saiu de casa na adolescência, é renomada sommelier de cachaça. Importa-se muito com o trabalho e pouco com a família. Hippie que vende artesanato para turistas, Joana é afável diante das adversidades da vida.

 


“A Saideira acaba sendo uma armadilha para ela (Penélope) voltar a ter contato com o afeto. Um plot interessante do filme é você pensar: caramba, como elas vão reconstruir essa relação? Tudo faz parte de uma rede que leva as duas a descobrirem novas coisas e pessoas. Tem a cachaça e tudo, mas a grande coisa é a reconexão das duas irmãs”, afirma Thati Lopes.

 

 

 

 

Guiada por velhos documentos e fotos guardadas na caixa deixada pelo avô, a dupla percorre o caminho que liga o litoral fluminense a cidades mineiras. Penélope e Jô descobrem segredos de Honório sobre o abandono da esposa e a verdadeira identidade da esquecida avó.

 

Os diretores Júlio Taubkin e Pedro Arantes explicam por que decidiram filmar em Minas. “Estávamos muito inseridos no universo da cachaça e queríamos fazer algo na paisagem mineira, nas cidades históricas, que achávamos pouco aproveitadas no cinema nacional. O tema da cachaça e da tradição se prestava muito à tentativa de pensar um conflito em que pudéssemos ressignificar opiniões complicadas sobre uma mesma memória”, afirma Taubkin.

 

“Usamos um pouco do espaço como metáfora para falar também da questão ambiental e da mineração, além do riso, do choro, da bebedeira e dessa história toda que envolve família”, completa.

 

Homenagem para vovós

 

Ao lidar com o apagamento de mulheres antepassadas devido à história forjada por homens, o filme presta homenagem às avós e bisavós brasileiras.

 


“Nossa sociedade aprendeu a valorizar apenas os marcos do sucesso masculino. As mulheres que estavam lá criando os elos, os afetos e os seres humanos são sempre esquecidas. Quando se lembram da avó, é sempre para falar: ‘Ah, ela teve nove filhos’. Ou seja, ela não existe além disso. É o mecanismo do patriarcado de não valorizar a força do feminino”, afirma Luciana.

 


“O enredo parte um pouco das histórias de família porque família é complicado. Quando a gente fala 'você está aqui por causa da sua família’, temos de reconhecer que tudo o que a gente faz hoje em dia é por causa de quem veio antes”, observa o diretor Pedro Arantes.

 


“Por outro lado, não queremos muitas coisas que carregamos deles, porque fazem mal ou não são boas. No filme, a gente consegue abordar essas relações sem ter, necessariamente, que passar pano para tudo, mas também sem raiva ou rancor dos erros do passado”, diz o cineasta.

 

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Além de Tonico Pereira, o elenco reúne os experientes Jackson Antunes, Suely Franco, Rogério Fróes, Teca Pereira e Ary França. Os veteranos deixam sua marca no filme, diz Pedro Arantes.

 


“As atuações têm diferentes estilos. Para a gente, é muito legal trabalhar com atores que tenham legado, são muito mais experientes e trazem muita coisa boa para nós. Eles dominam as cenas, só damos o espaço para brilharem e ensinarem como se faz. Foi muito divertido”, revela Arantes.

 


“SAIDEIRA”


(Brasil, 2024, 112min., de Júlio Taubkin e Pedro Arantes, com Thati Lopes, Luciana Paes, Jackson Antunes, Matheus Abreu, Rogério Fróes, Suely Franco, Ary França, Teca Pereira, Bruna Viola e Tonico Pereira) Em cartaz no UNA Cine Belas Artes e nas salas dos shoppings BH, Cidade, Contagem, Diamond, Partage e Pátio Savassi.


* Estagiária sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria

 

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