Em um ano marcado por forte presença brasileira, o Festival de Veneza, em sua 81ª edição, abre alas para a primeira exibição, neste domingo (1/9), do novo filme de Walter Salles, “Ainda estou aqui”, que disputa o Leão de Ouro com outros 20 títulos – entre eles, pesos-pesados como “Coringa: delírio a dois”, de Todd Phillips, “Queer”, de Luca Guadagnino, “Maria”, de Pablo Larraín, estrelado por Angelina Jolie, e o novo longa de Pedro Almodóvar, “The room next door”.
Estrelado por Fernanda Torres e Selton Mello, com participação especial de Fernanda Montenegro, “Ainda estou aqui” é adaptado do livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva. O filme conta a história verídica de Eunice Paiva, esposa do ex-deputado Rubens Paiva, perseguido, sequestrado e morto pela ditadura militar. A atriz mineira Bárbara Luz, de 22 anos, filha caçula de Eduardo Moreira e Inês Peixoto, do Grupo Galpão, também integra o elenco.
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Ela vive a filha do meio (de cinco) do casal Eunice (Fernanda Torres) e Rubens Paiva (Selton Mello). Até então uma dona de casa, Eunice estudou direito, formou-se já próxima dos 50 anos e virou símbolo da resistência. Durante décadas, denunciou o desaparecimento de Rubens Paiva. O atestado de óbito só foi emitido em 1996, e o esclarecimento de sua morte veio apenas em 2014, por meio da Comissão Nacional da Verdade. Na época, Eunice já convivia com o Alzheimer havia mais de uma década.
Filmes nacionais
A estreia de “Ainda estou aqui” em Veneza sucede em 12 anos o último longa de ficção de Walter Salles, “Na estrada” (2012). O diretor, que já havia trabalhado com Fernanda Torres no premiado “Terra estrangeira” (1995), esteve em competição no festival italiano em 2001, com “Abril despedaçado”. A presença brasileira no prestigioso evento de cinema se completa com outras quatro produções, apresentadas fora de competição.
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São elas o curta-metragem “Minha mãe é uma vaca”, de Moara Passoni, ambientado no Pantanal, na seção Horizontes Curtas; “Apocalipse nos trópicos”, documentário de Petra Costa sobre o elo entre bolsonarismo e fundamentalismo religioso, na seleção Fora de Concurso; “A hora e a vez de Augusto Matraga”, adaptação que Roberto Santos fez para a novela de Guimarães Rosa em 1965, na mostra Veneza Clássicos; e a animação em realidade virtual “40 dias sem o sol”, de João Carlos Furia, na seção Veneza Imersiva.
À véspera da votação do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, a cineasta Petra Costa foi ao Congresso Nacional para filmar cenas do documentário “Democracia em vertigem”, sobre a turbulência política pela qual o Brasil passava naquele período. Mas, logo que chegou, foi surpreendida por um deputado e pastor neopentecostal, que lhe entregou uma Bíblia, pedindo que ela aceitasse Jesus. “Deus vai governar”, ele dizia, ressaltando para a cineasta que os fiéis iriam tirar os “ímpios” dos Três Poderes.
Onda neopentecostal
“Foi perturbador. Não era aquilo que eu esperava encontrar no Congresso brasileiro”, disse a diretora, que percebeu que havia ali material para outro filme. É justamente a relação entre a onda neopentecostal e a política nacional que Petra escolheu esmiuçar em “Apocalipse nos trópicos”, que teve estreia mundial em Veneza na última quinta-feira (29/8), um dia após o início do festival. Para realizar o documentário, a cineasta frequentou cultos e colheu depoimentos de evangélicos.
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Também na quinta-feira estrearam, na mostra competitiva, “El jockey”, do diretor argentino Luis Ortega, e “Maria”, de Pablo Larraín, sobre a diva da ópera Maria Callas. O primeiro, estrelado por Nahuel Pérez Biscayart, narra, em tom onírico, a transformação de um jóquei a serviço de mafiosos em Buenos Aires. Recebido com aplausos, “Maria” traz Angelina Jolie apresentando uma sugestão do tipo de mulher que a cantora era no fim da vida: cansada, deprimida e sem forças para seguir em frente.
Sadomasoquismo e poder
Na sexta-feira (30/8), “Babygirl”, da atriz e diretora holandesa Halina Reijn, estrelado por Nicole Kidman, dividiu opiniões na primeira sessão matinal para a imprensa. O longa, que disputa o Leão de Ouro, fala sem comedimento de sadomasoquismo, prazer feminino, infidelidade conjugal e abuso de poder, em uma trama que traz a protagonista naquele que talvez seja o trabalho mais ousado de sua carreira. Há quem diga que Nicole desbancou o favoritismo de Angelina Jolie ao prêmio de atuação.
Também em disputa pelo Leão de Ouro, “Leurs enfants après eux”, dos gêmeos Ludovic Boukherma e Zoran Boukherma, foi apresentado ontem (31/8). Adaptado do romance homônimo de Nicolas Mathieu, que ganhou o Prêmio Goncourt, o filme narra a entrada na idade adulta de um grupo de jovens e as difíceis relações com os pais, durante grande parte da década de 1990, quando os problemas de integração dos imigrantes, a desindustrialização e o desemprego já corroíam a harmonia social na França.
Brasileiros no júri
Na 81ª edição do Festival de Veneza, o Brasil está representado não apenas nas telas, mas também no júri, presidido pela atriz francesa Isabelle Huppert. Kleber Mendonça Filho compõe o grupo que vai definir o vencedor do Leão de Ouro, junto do americano James Gray, do britânico Andrew Haigh, da polonesa Agnieszka Holland, do mauritano Abderrahmane Sissako, do italiano Giuseppe Tornatore, da alemã Julia von Heinz e da chinesa Zhang Ziyi. Já a atriz e diretora Bárbara Paz faz parte do júri do Prêmio Luigi De Laurentiis, que selecionará o melhor longa-metragem de estreia. (Com agências)
FILMES EM COMPETIÇÃO NO 81º FESTIVAL DE VENEZA
“The room next door”, de Pedro Almodóvar
“Campo di battaglia”, de Gianni Amelio
“Leurs enfants après eux”, de Ludovic Boukherma e Zoran Boukherma
“The brutalist”, de Brady Corbet
“Jouer avec le Feu”, de Delphine Coulin e Muriel Coulin
“Vermiglio”, de Maura Delpero
“Iddu (sicilian letters)”, de Fabio Grassadonia e Antonio Piazza
“Queer”, de Luca Guadagnino
“Love”, de Dag Johan Haugerud
“April”, de Dea Kulumbegashvili
“The order”, de Justin Kurzel
“Maria”, de Pablo Larraín
“Trois amies”, de Emmanuel Mouret
“El jockey”, de Luis Ortega
“Coringa: Delírio a Dois”, de Todd Phillips
“Babygirl”, de Halina Reijn
“Ainda estou aqui”, de Walter Salles
“Diva futura”, de Giulia Louise Steigerwalt
“Harvest”, de Athina Rachel Tsangari
“Youth (homecoming)”, de Wang Bing
“Stranger eyes”, de Yeo Siew Hua